Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

Governo mente aos portugueses sobre as medidas que toma

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Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Gostaria de situar no tempo e no conteúdo a primeira questão que quero colocar-lhe.

O Governo veio à Assembleia da República, na quarta-feira passada, defender as malfeitorias das alterações ao Código do Trabalho — ainda por cima com grande autoconvencimento e de forma arrogante — com o argumento de que essas alterações eram necessárias para aumentar a competitividade e o crescimento económico e para criar mais emprego. Em síntese, foi isto! Um dia depois, o Banco de Portugal, no seu Relatório de Primavera, vem dizer que, afinal, vamos assistir, em 2013, a uma estagnação da economia e à liquidação, entre este ano e 2013, de 207 000 postos de trabalho.

Alguém está a enganar alguém, Sr. Primeiro-Ministro! Nesse sentido, era importante saber se se trata de um engano inconsciente ou de uma mentira pensada, e é importante que o Sr. Primeiro-Ministro aqui assuma a responsabilidade de uma resposta concreta, que vai ficar registada. Obviamente, enganar, qualquer um se pode enganar, mas uma mentira pensada será razão, com certeza, para que este Governo fique a mais no Governo da República.

(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Não explicou a contradição que está colocada e que mais à frente se verificará de forma irrefutável.

O Sr. Primeiro-Ministro fala como se o pacto de agressão fosse uma bíblia e esse acordo de concertação uma espécie de vaca sagrada. Ora, quando se propõe mais desemprego, através da criação de bolsas de horas, da facilitação dos despedimentos e do seu embaratecimento, quando se propõe a redução das horas extraordinárias, dos dias de férias e de feriados vem dizer aqui, à Assembleia, que isso vai permitir criar mais emprego, Sr. Primeiro-Ministro?! É uma contradição insanável, e a vida vai demonstrar se está enganado com inconsciência ou se está a mentir de forma pensada.

Sr. Primeiro-Ministro, ouvimo-lo estupefactos, em vários registos, afirmar que a austeridade que o Governo tem vindo a impor é para todos. Não vou falar aqui da violência do ataque às condições de vida das pessoas, nomeadamente dos trabalhadores, dos reformados, dos pequenos e médios empresários — toda essa longa e negra lista que vou escusar-me de referir —, mas gostaria de fazer-lhe uma pergunta.

Sr. Primeiro-Ministro, quando fala em equidade de sacrifícios, é capaz de dizer, para quem nos está a ouvir, quais foram os sacrifícios dos grandes grupos económicos, dos grandes acionistas? Diga, Sr. Primeiro-Ministro, quais foram as consequências dessa tal equidade e da imposição de sacrifícios! Nem vou referir casos concretos, mas olhando para os lucros fabulosos das grandes distribuidoras, das «EDPs», das «PTs» e dos grandes acionistas, qual foi o sacrifício que estes fizeram comparativamente a um reformado que ganha 600 € e viu a sua reforma baixar ou a quem viu os salários ou os subsídios cortados? A esses dói! Aos grandes senhores do dinheiro, diga lá quais foram os sacrifícios que o Governo lhes impôs para justificar esta teoria da equidade e da distribuição de sacrifícios por todos! Também aqui o Governo está a faltar à verdade aos portugueses, e por isso o questionamos.

Diga lá, Sr. Primeiro-Ministro, que conceção de equidade tem, afinal, em relação aos sacrifícios.

(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Isso nem sequer é narrativa, é conversa fiada! É, no fundo, um discurso para enganar.

Então, o Sr. Primeiro-Ministro quer convencer os portugueses de que, por exemplo, a banca, hoje, paga tanto como qualquer empresário, em termos de IRC?

Sabendo-se, por exemplo, que nos últimos tempos a banca foi buscar 30 000 milhões de euros ao BCE para continuar os seus negócios, o Sr. Primeiro-Ministro quer convencer os portugueses que uma pequena empresa, em situação difícil, tem a mesma ajuda e as mesmas facilidades da banca?

O Sr. Primeiro-Ministro quer convencer-nos que os grupos económicos pagam, de facto, aquilo que é justo, sabendo nós que, por via dos benefícios e dos privilégios, conseguem depois recuperar essa pequena parcela que, neste momento, está a ser cobrada?

Sr. Primeiro-Ministro, tente convencer quem não está informado, mas fique sabendo que aquilo que o Governo aqui está a fazer, bem como ao País, a Portugal, tem, naturalmente, consequências dramáticas.

Sr. Primeiro-Ministro, em relação ao pacto de agressão, quero dizer-lhe que pode ter os compromissos que quiser mas o primeiro compromisso de um Governo da República deve ser com o seu povo, incluindo com aqueles que não o elegeram, assumindo esses compromissos em nome do País, dos portugueses, e não em nome de uma ingerência, de um pacto de agressão, que veio do estrangeiro com a submissão de algumas forças políticas aqui, em Portugal.

Não venha, portanto, dizer que aquilo é uma bíblia sagrada que tem de ser cumprida. Não! Primeiro respeite os interesses do povo e do País e, depois, essa consideração que fez aqui.

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