Intervenção de João Ferreira no Parlamento Europeu

Fome na África Oriental

A fome e o desespero que grassam na região do Corno de África têm causas próximas, sempre referidas: a grave seca e os conflitos internos. Mas tem, além destas, causas profundas, quase sempre ocultadas.

Tomemos o exemplo da Somália. O colapso das infra-estruturas agrícolas e pastoris nos anos 80 é indissociável da intervenção do FMI e do Banco Mundial no país. Os preços dos combustíveis, adubos e custos de produção agrícola dispararam; a população urbana viu reduzir-se drasticamente o seu poder de compra; os programas sociais foram afectados.

A dívida e o serviço da dívida - esse permanente garrote! - rapidamente atingiram níveis incomportáveis, e o empréstimo do FMI foi cancelado devido ao atraso nos pagamentos.

As reservas estatais de cereais e os mecanismos de fixação dos preços dos produtos agrícolas nos mercados locais foram substituídos por um mercado mundial dominado pelas multinacionais do agronegócio e pelos especuladores. Os preços passaram a ser "fixados" na bolsa de Chicago.

A desgraça económica e social abriu caminho à guerra civil, ao chamado "Estado falhado", à intervenção militar externa. Foi o apoio dos EUA à invasão pela Etiópia, o apoio da Arábia Saudita ao grupo islamita, os ataques aéreos recorrentes. É que a Somália também tem petróleo...

A ajuda humanitária à região impõe-se como uma necessidade premente, sim! Não o intervencionismo externo interesseiro...

Mas o discurso da comiseração e da compaixão não pode ocultar a necessária compreensão destas causas e a justa atribuição de responsabilidades - um passo fundamental para a resolução duradoura do drama humanitário que ali se vive.

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