Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

Financiamento do ensino superior público

Petição solicitando a alteração do regime de atribuição de bolsas de acção social no ensino superior, o término do sigilo bancário, pondo fim às injustiças na atribuição de bolsas, e a extinção das propinas
(petição n.º 85/XI/1ª)
Financiamento do ensino superior público
(projecto de lei n.º 451/XI/2.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português saúda, naturalmente, todos os peticionários e os estudantes, os milhares de estudantes do ensino superior que, no dia 17 de Novembro, saíram à rua para exigir um ensino superior público gratuito, de qualidade e democrático para todos.
O projecto de lei de financiamento do ensino superior que aqui apresentamos assenta em três objectivos e premissas fundamentais: o primeiro é o de que, num Estado democrático, a
educação é uma alavanca do desenvolvimento económico e, portanto, é uma responsabilidade directa do Estado; o segundo é o de que o financiamento das instituições não pode estar sujeito a vontades pessoais de ministros e secretários de Estado, pelo contrário deve obedecer a critérios objectivos de financiamento, devendo ser considerados critérios fundamentais os critérios objectivos que sejam definidos por lei; o terceiro é o objectivo mais geral da gratuitidade do ensino, contribuindo, de forma muito efectiva, para o aprofundamento da nossa democracia.
A Constituição da República Portuguesa tem, no seu espírito fundamental, uma obrigação e uma responsabilidade directa do Estado sobre a educação. No entanto, a política educativa seguida pelos sucessivos governos do Partido Socialista, do PSD e do CDS tem caminhado num sentido contrário ao da efectivação da Constituição. Temos assistido a um subfinanciamento crónico das instituições do ensino superior e a um aumento dos custos do ensino superior, nomeadamente no que diz respeito ao valor das propinas. Os primeiros ciclos do ensino superior em Portugal custam 1000 €, mais do que dois salários mínimos, e são milhares os estudantes que já nem acedem ao ensino superior, que já nem se submetem ao regime de candidatura, por saberem que não têm condições económicas para o fazer.
Portanto, nós, que entendemos que o ensino superior é um factor determinante para o desenvolvimento do País e não um negócio, apresentamos este projecto de lei de financiamento do ensino superior por considerarmos que se trata de um dever de investimento nacional e colectivo e não de uma responsabilidade individual do estudante.
Entendemos, ainda, que é fundamental caminhar no sentido de incluir e alargar o universo de estudantes no ensino superior e garantir, não apenas através do financiamento mas também através da acção social escolar, a igualdade de oportunidades para todos.
Este projecto de lei é uma proposta alternativa ao financiamento das instituições, que, no entender do PCP, decerto daria resposta à escola pública, gratuita, de qualidade e democrática para todos.
(…)
Sr. Presidente:
Apenas alguns segundos para, no que diz respeito ao Decreto-Lei n.º 70/2010, relembrar que o PCP propôs a revogação do Decreto-Lei por entendermos que é injusto para todas as prestações sociais. Portanto, é por uma questão de coerência que entendemos que a revogação do
Decreto-Lei deve incluir não apenas as bolsas de acção social no ensino superior mas também todas as prestações sociais.
Todos os direitos conquistados pelos estudantes não foram migalha oferecida por nenhum governo; foram resultado directo da sua luta em torno dos seus direitos, muitos deles ainda no
regime fascista. E é disso que se trata: são direitos conquistados com a luta dos estudantes e que os sucessivos governos têm cortado.
Ora, num momento em que se impõe o reforço das verbas para a acção social escolar, este Governo corta a eito.
Quem ouve o Sr. Deputado Manuel Mota falar até parece que os dividendos da PT não foram distribuídos pelos accionistas mas pelos estudantes do ensino superior…!
Porque todos os estudantes do ensino superior têm mais de 100 000 € nas suas contas …
Estamos a falar de limitar o acesso a um direito fundamental, que é a acção social escolar, através de uma forma administrativa e, por isso, nenhum estudante tem direito, porque tem 100
000 € na conta. Isso é faltar à verdade, isso é fugir à verdade.
Num momento em que se agrava o desemprego, em que muitos agregados familiares vão viver situações mais difíceis, o que se impunha era assumir como prioridade o reforço da acção social escolar e nunca cortar as migalhas que o Governo quer poupar com a acção social escolar.
O PCP propõe, ainda, o reforço do financiamento das instituições e a extinção das propinas, porque são as propinas que os estudantes pagam que estão a pagar a luz, a água, os salários dos professores.
É inadmissível que sejam os estudantes, por via da sua carteira, que estejam a garantir o funcionamento mais básico das universidades, porque o Governo insiste em cortar nas despesas de funcionamento. É inadmissível que sejam os estudantes com menores recursos financeiros, sem qualquer acesso ao ensino superior, porque não têm 419 € de rendimento de referência! Apenas os estudantes praticamente miseráveis conseguem ter acesso à acção social escolar.
É disto que estamos a falar, e o Governo orgulha-se de dizer que quer limitar o apoio a milhares de estudantes do ensino superior. É uma vergonha!
Pode, certamente, o Governo continuar a contar com a luta dos estudantes, porque, mais uma vez, será pela luta que os estudantes garantirão este direito!

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