Intervenção de

Finanças das Regiões Autónomas - Intervenção de António Filipe na AR

Lei de Finanças das Regiões Autónomas, revogando a Lei n.º 13/98, de 24 de Fevereiro

Sr. Presidente
Srs. Deputados:

A questão hoje em debate é unicamente a da conformidade constitucional da proposta de Lei de Finanças das Regiões Autónomas, apresentada pelo Governo.

A esse respeito, importa recordar que a Constituição da República Portuguesa, nos seus princípios fundamentais, concretamente no seu artigo 6.º, sobre o Estado unitário, diz, no n.º 1, que «O Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular (...)» e, no n.º 2, que «Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos políticoadministrativos e de órgãos de governo próprio.»

Ora, como se sabe, os poderes das Regiões Autónomas estão regulados nos seus Estatutos Político- Administrativos, que têm um valor, como se costuma referir, paraconstitucional, estando inclusivamente a elaboração dos estatutos político-administrativos subtraída ao poder normal de iniciativa legislativa da Assembleia da República e pertencendo o exclusivo dessa iniciativa às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas.

Portanto, é inquestionável e absolutamente pacífico que os Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas prevalecem sobre as leis e, inclusivamente, sobre as demais leis de valor reforçado, como é o caso da Lei de Finanças das Regiões Autónomas.

Inclusivamente, a própria lei que está em vigor e a proposta de lei referem que o objectivo da Lei de Finanças das Regiões Autónomas é a «concretização da autonomia financeira consagrada na Constituição e nos estatutos político-administrativos.»

Portanto, não se  compreende que, sendo o objectivo desta lei regular as relações financeiras entre a República e as Regiões Autónomas, nos termos dos Estatutos, ela possa arrogar-se o direito de contrariar o que dizem os Estatutos.

E aqui a questão é a de saber se, de facto, contraria ou não. E quanto a este aspecto, o de saber se contraria ou não, podemos questionar muitas disposições da proposta de lei. Porém, há algumas que, do nosso ponto de vista, inequivocamente contrariam. Se lermos, por exemplo, o artigo 117.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, que diz que «Os empréstimos a emitir pela Região Autónoma da Madeira poderão beneficiar de garantia pessoal do Estado, nos termos da respectiva lei» e, depois, o artigo 35.º da proposta de lei, que diz que «(...) os empréstimos a emitir pelas regiões autónomas não podem beneficiar de garantia pessoal do Estado», concluímos que onde o Estatuto diz que podem a proposta de lei diz que não podem. Ora bem, creio que não pode haver nada mais contraditório com o Estatuto Político-Administrativo da Região.

E importa recordar o seguinte: o Estatuto confere uma faculdade que um qualquer governo pode exercer ou não, enquanto que a proposta de lei pretende proibir peremptoriamente a aplicação de um artigo previsto no estatuto político-administrativo de uma região autónoma.

O mesmo se poderá dizer em relação à questão do princípio do não-retrocesso em matéria de transferências financeiras. Esse princípio está claramente estabelecido no Estatuto e o que vem referido na proposta de Lei de Finanças das Regiões Autónomas é claramente um retrocesso em matéria de transferências financeiras.

Posto isto, Sr. Presidente, não podemos concordar com o parecer, aprovado na 1.ª Comissão, porque consideramos que há uma desconformidade manifesta entre a proposta de Lei de Finanças das Regiões Autónomas e o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira.

 

 

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