Intervenção de

Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores - Intervenção de António Filipe na AR

 

Terceira Revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores

 

 

Sr. Presidente,

Sr.as e Srs. Deputados:

Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, começo por saudar o povo da Região Autónoma dos Açores e, em particular, os seus representantes, titulares dos órgãos de governo próprio da Região.

Saúdo, naturalmente, os membros da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, proponente da iniciativa de estatuto hoje em debate (proposta de lei n.º 169/X), aqui presentes, e que são testemunho de uma valiosa cooperação institucional entre este órgão de soberania e o parlamento regional. Saúdo também as forças políticas que, não estando representadas na Assembleia Legislativa da Região, dão, ainda assim, o seu melhor contributo para o progresso e o desenvolvimento da Região Autónoma e para o bem-estar das suas populações.

Permitam-me que inclua nesta saudação o PCP e a CDU Açores, que, apesar de não ter obtido representação na actual legislatura da Assembleia Legislativa, tem um passado e um presente de valiosas provas dadas em prol da autonomia regional e participa, de corpo inteiro, no amplo consenso gerado na Região Autónoma dos Açores em torno da presente proposta de revisão do Estatuto Político-Administrativo.

Sr. Presidente,

Srs. Deputados:

Este é um momento muito significativo para a Região Autónoma dos Açores, para o sistema constitucional de autonomia e para o Estado democrático no seu conjunto.

Na sequência de um enorme trabalho levado a cabo na Assembleia Legislativa da Região Autónoma, que se traduz na iniciativa de estatuto que hoje apreciamos na generalidade, está em curso o processo legislativo que vai adaptar a estrutura institucional dos Açores ao sistema constitucional de autonomia tal como resulta da Revisão Constitucional de 2004 e com cujos traços fundamentais, no que diz respeito às regiões autónomas, o PCP claramente se identifica.

O sistema constitucional de autonomia regional configura um modelo que consideramos equilibrado e capaz de corresponder a objectivos de participação democrática dos cidadãos, de desenvolvimento económico e social, de defesa dos interesses regionais e, simultaneamente, de reforço da unidade nacional e de estreitamento de laços de solidariedade entre todos os portugueses.

O sistema constitucional de autonomia contém, em nosso entender, elevadas potencialidades e configura um modelo institucional adequado à governação específica das regiões insulares.

Ninguém pode ignorar que as regiões autónomas têm gravíssimos problemas ainda não resolvidos e que é justa a insatisfação das populações em relação a muitos aspectos da realidade económica, política e social em que vivem, mas importa afirmar que não é no modelo constitucional de autonomia, em si mesmo considerado, que radicam esses problemas.

A descontinuidade geográfica do território nacional, a distância e o isolamento dos arquipélagos dos Açores e da Madeira tornaram evidentes as acentuadas especificidades destas regiões e as desigualdades derivadas da insularidade. O reconhecimento destas evidências e a convicção de que as suas consequências não são fatalidades impostas pelo destino mas que podem ser alteradas pela vontade humana, esteve na base da consagração, pelo regime democrático, de um processo autonómico capaz de potenciar as capacidades das regiões e de se constituir como um factor de emancipação social das suas populações.

O conceito de autonomia regional é assim, para o PCP, um elemento constitutivo fundamental da democracia portuguesa e um factor de enriquecimento da globalidade do Estado democrático. A autonomia regional não é, não pode ser, um factor de conflitualidade entre a República e as regiões autónomas, entre os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio das regiões.

A autonomia regional é uma opção estruturante do Estado democrático que tem de ser assumida por todos e que exige de todos um elevado sentido de responsabilidade.

Entendemos a autonomia regional como um poder democrático, representativo, apto para fazer face às especificidades das regiões e aos grandes desafios com que estas se confrontam; como um meio para promover o desenvolvimento das regiões, aproveitar as suas potencialidades e diminuir a desvantagem que resulta da sua situação de insularidade; como um meio para a superação de assimetrias e atrasos existentes e para a garantia de uma igualdade de condições de vida no contexto nacional; como um meio para potenciar as especificidades das regiões e contribuir para o fortalecimento da coesão, da unidade e da identidade nacional.

Estamos convictos de que, com políticas adequadas, o sistema constitucional de autonomia regional contém potencialidades de progresso e de desenvolvimento que muito podem contribuir para uma sociedade mais justa.

Sr. Presidente,

Sr.as e Srs. Deputados:

O PCP sempre assumiu na Região Autónoma dos Açores, e assume aqui, na Assembleia da República, que a oportunidade de rever o Estatuto Político-Administrativo da Região aberta pela Revisão Constitucional de 2004, não se deveria limitar a uma adequação formal e exclusiva dos poderes legislativos conferidos à Região, apesar da sua inegável relevância, mas que deveria representar um momento de aprofundamento e desenvolvimento do processo autonómico e contribuir decisivamente para dotar os órgãos de governo próprio da Região com os instrumentos necessários para a adopção de políticas de desenvolvimento conducentes a uma coesão económica e social que está ainda por concretizar.

O processo de revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores não deve restringir-se estritamente à adaptação necessária ao texto constitucional. Deve, obviamente, conformar-se com ele, mas deve assumir a dignidade que a Constituição lhe confere e assumir princípios estruturantes do sistema autonómico. Um sistema eleitoral proporcional; um relacionamento financeiro entre o Estado e a Região assente em princípios de solidariedade nacional, de estabilidade nas receitas e de respeito pela autonomia financeira; o reforço dos direitos de participação política dos cidadãos, através da regulação de mecanismos como o direito de iniciativa legislativa popular ou o direito de petição junto da Assembleia Legislativa da Região Autónoma, são princípios que devem ser claramente assumidos no Estatuto que vamos aprovar.

Sr. Presidente,

Sr.as e Srs. Deputados:

Não é este o momento para abordar os múltiplos aspectos de que esta proposta de revisão estatutária se compõe. Isso será feito ao longo de uma trabalho na especialidade, que se adivinha intenso mas que deve ser feito com a celeridade possível. Haverá oportunidade para apreciar a proposta, ponto por ponto, em diálogo com a Assembleia Legislativa da Região, e para assegurar a sua plena conformidade com a Constituição da República. Parece-nos evidente que, a este respeito, há algumas arestas que têm de ser limadas, mas não temos dúvidas de que o serão sem dificuldades de maior. A revisão do Estatuto decorre da Constituição e tem obviamente o texto constitucional como limite incontornável.

Haverá tempo, porém, para essa apreciação.

Neste momento, mais do que salientar pequenas divergências que serão ultrapassadas, o que importa é enaltecer a forma elevada como este processo está a decorrer, manifestar o total empenho do Grupo Parlamentar do PCP no trabalho que temos pela frente e expressar um voto, que é uma certeza, de que chegaremos ao fim deste processo com a satisfação do dever cumprido, dotando a Região Autónoma dos Açores com um Estatuto Político-Administrativo que honre a democracia portuguesa e que seja capaz de contribuir para a concretização das aspirações de progresso e justiça social do povo da Região Autónoma dos Açores.

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