Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

Estatuto do Aluno dos Ensinos Básico e Secundário

Segunda alteração à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro, que aprova o Estatuto do Aluno dos Ensinos Básico e Secundário, alterada pela Lei n.º 3/2008, de 18 de Janeiro (projecto de lei n.º 183/XI/1.ª:
http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
A história do Estatuto do Aluno, em 2 minutos, podia resumir-se assim:
Em 2002, o Governo PSD/CDS-PP alterou o Estatuto do Aluno para responsabilizar quase exclusivamente o aluno pelas incapacidades da escola e da sociedade: agudizaram o carácter autoritário e sancionatório do Estatuto, agravaram o seu pendor «penal», agilizaram os procedimentos sancionatórios e desresponsabilizaram o Estado perante a intervenção nas escolas.
Em 2007, o Governo do Partido Socialista aproveita todas estas más ideias, com más provas dadas, e apresenta novas regras para a determinação de faltas e efeitos decorrentes, desvaloriza as insuficiências materiais e humanas das escolas e desvaloriza a presença do estudante nas actividades lectivas. Foram necessários três anos para que o Governo reconhecesse a ineficácia de uma prova de recuperação, que apenas serviu para manipular as estatísticas do abandono e do insucesso escolares.
Passados oito anos, este Estatuto já deu provas que não serve!
Quantos mais anos serão necessários para que o Partido Socialista e o Governo percebam que a intervenção exclusivamente disciplinar e autoritária só agudiza estes problemas?
Por que vem agora propor a agilização dos procedimentos disciplinares pela mão dos directores e o reforço do seu poder na suspensão preventiva?
Não deixamos de assinalar como positivo a substituição da prova de recuperação, no sentido da proposta apresentada pelo PCP e desde sempre reivindicada na luta dos estudantes dos ensinos básico e secundário.
A proposta de lei (proposta de lei n.º 14/XI/1.ª:
http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa...) faz referência a equipas multidisciplinares e quase parece que existem em todas as escolas. Mas quantas existem, de facto, a funcionar regularmente com os técnicos necessários?
Sr. Presidente,
Sr. Deputados:
Porque a escola pública de qualidade tem que ser sempre democrática e inclusiva, o PCP hoje apresenta: a criação do gabinete pedagógico de integração escolar, com o objectivo de promover um ambiente escolar saudável e estimulante, que simultaneamente crie as condições para um efectivo acompanhamento da aplicação das medidas correctivas aplicadas no âmbito do Estatuto do Aluno e articule, entre toda a comunidade escolar e o meio envolvente, as intervenções que considerem necessárias para a supressão de hábitos ou comportamentos desadequados ou prejudiciais ao ambiente escolar — a concepção de intervenção democrática, participada e participativa, leva o PCP a propor não apenas a integração de profissionais das áreas da educação, psicologia, animação sociocultural e assistência social, como também a participação dos próprios professores, funcionários e estudantes de cada escola nesses gabinetes; o reforço do papel do conselho de turma e do director de turma na aplicação e acompanhamento das medidas pedagógicas e disciplinares; e a formação de professores e funcionários na prevenção e gestão de conflitos.
Mas o PCP sempre defendeu e continuará a defender: a redução do número de alunos por turma; a concretização da gestão democrática das escolas, envolvendo a participação de todos os parceiros educativos na resolução dos problemas; o investimento público numa política de financiamento dos ensinos básico e secundário que dote as escolas de condições materiais e técnicas para a criação de espaços lúdicos, recreativos, desportivos, de convívio; uma política de valorização do trabalho pedagógico do professor, de estabilidade do corpo docente e não docente, de respeito pelo seu trabalho e reconhecimento dos seus direitos.
Não é possível vivermos numa sociedade cada vez mais violenta, onde grassa o desemprego, a precariedade, os baixos salários, os horários de trabalho desregulamentados, a pobreza, o desespero e a violência e a escola ser imune a tudo isto. Inevitavelmente, só uma intervenção estruturada e integrada, que olhe às condições sociais, económicas e culturais da sociedade e da escola, pode construir uma escola mais democrática e inclusiva.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Foi importante ter oportunidade de ouvir a bancada do Partido Socialista reconhecer que não há um Estatuto perfeito. De facto, não há Estatuto de Aluno que possa ser aplicado sem meios humanos na escola.
Não há Estatuto do Aluno que funcione se não existirem funcionários para, de uma forma muito objectiva, conseguirem concretizar o que o Sr. Secretário de Estado aqui veio hoje apresentar como repreensão, porque, de facto, se nas nossas escolas existe, de forma muito gravosa, falta de funcionários, é difícil actuar na prevenção da violência e da indisciplina. É também difícil agir sobre a indisciplina e o insucesso quando as turmas estão sobrelotadas e os professores não podem dar atenção a todos os alunos e, ainda por cima, muitas dessas turmas têm alunos com necessidades educativas especiais.
Mas ficamos também contentes por perceber que a opinião do Partido Socialista, passada uma legislatura de maioria absoluta, é que o projecto de lei do PCP tinha uma proposta positiva, quando entendia que era predominantemente importante o papel do conselho de turma e do director de turma. Foi preciso perder a maioria absoluta, perder a arrogância da maioria absoluta, para perceber que os outros partidos também têm propostas construtivas, que tendem a caminhar nesse sentido.
É por isso que entendemos que, não havendo estatutos do aluno perfeitos, tem de haver condições nas escolas que permitam uma aplicação efectiva de medidas de combate à indisciplina, ao abandono e ao insucesso. Por isso, entendemos que seria importante haver abertura por parte dos grupos parlamentares para que todos os diplomas apresentados pudessem ser discutidos na especialidade.

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