Intervenção de

O estado da Nação - Intervenção de António Filipe na AR

Debate sobre o estado da Nação

 

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Vou corresponder ao seu apelo e centrar-me na realidade das coisas. O senhor não pode fugir a dar explicações a esta Assembleia relativamente a factos como estes que agora acabaram de ser referidos. Vou ater-me também, rigorosamente, a factos, esperando uma resposta clara da sua parte, uma vez que o Sr. Primeiro-Ministro tem passado ao lado dos mesmos.

É conhecido o caso da Direcção Regional de Educação do Norte, onde há um professor que é suspenso de funções e é-lhe instaurado um processo disciplinar com base num desprezível acto de delação sobre uma conversa privada. O Governo não só apoiou essa atitude por omissão como, na sequência de calorosas manifestações de apoio à Directora Regional por parte de dirigentes regionais e nacionais do Partido Socialista, a reconduziu no cargo, pela Sr.ª Ministra da Educação, depois de esses factos serem conhecidos.

No Centro de Saúde de Vieira do Minho, tal como já foi referido, foi demitida uma directora por não ter actuado contra um médico que afixou na parede uma cópia de uma entrevista do Sr. Ministro da Saúde.

Foi afastada sete meses depois com base nesse facto e foi substituída no cargo - imaginem! - por um vereador do Partido Socialista de uma câmara municipal.

A Sr.ª Secretária da Saúde veio dizer que criticar o Governo só se for em casa e eu acrescentaria: pelos vistos com cuidado, não vá o falador ser funcionário público e andar algum «bufo» nas redondezas!

A Coordenadora da Subregião de Saúde de Castelo Branco decidiu mandar abrir a correspondência privada dirigida aos funcionários sob a sua direcção, o que, como sabe, corresponde a um ilícito criminal!

O Ministério da Defesa Nacional mandou alguns sicários não identificados tirarem fotografias a militares que participavam numa acção cívica de protesto com as suas famílias, as quais foram enviadas pelo Ministério da Saúde, ou melhor, da Defesa (o Ministério da Saúde tem tantos casos que eu já o citava por simpatia...) aos ramos das Forças Armadas para que os militares fossem identificados, e alguns deles foram punidos, alguns meses depois, com prisão disciplinar.

Quando o Governo negou aqui estes factos mentiu, porque eles são comprovadamente verdadeiros - há prova documental disso.

Na Metropolitano de Lisboa, na Transtejo e na CP, os trabalhadores que aderiram à greve de dia 30 de Maio foram punidos com faltas injustificadas. Na Transtejo, aliás, os trabalhadores entraram em greve às horas extraordinárias em protesto contra essa prepotência; na Metropolitano foram instaurados 60 processos disciplinares; na função pública foi ordenado às chefias que mandassem fazer listas de grevistas com nome e número de contribuinte e o Governo Civil de Braga mandou instaurar processos-crime aos trabalhadores que protestam junto do Sr. Primeiro-Ministro.

O Governo fez aprovar um Estatuto dos Jornalistas que constitui um ataque à liberdade de exercício da profissão sem precedentes no regime democrático e fez aprovar o novo regime de segredo de justiça que visa claramente intimidar a silenciar o jornalismo de investigação.

Sr. Primeiro-Ministro, não estamos cá para lhe dar lições de coisa alguma, mas não basta responder que ao PS ninguém dá lições de democracia - não é isso que está em causa. O que está em causa é que é nosso dever confrontá-lo com estes factos e exigir de V. Ex.ª respostas concretas para os mesmos. O Sr. Primeiro-Ministro considera que estas atitudes do seu Governo dão alguma saúde à democracia? É esta a questão.

 

 

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