Regime jurídico de instalação e de modificação dos estabelecimentos de comércio a retalho e dos conjuntos comerciais em matéria de taxas pela apreciação da instalação e da modificação dos estabelecimentos e conjuntos comerciais, e a adaptar o regime geral das contra-ordenações às infracções decorrentes da violação das regras fixadas para aquelas unidades comerciais
Intervenção de Agostinho Lopes na AR
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
1.O debate da Proposta de Lei 192/X é o fechar de um processo de revisão da Lei 12/2004 de 30 de Março que "Estabelece o regime de autorização a que estão sujeitas a instalação e a modificação de estabelecimentos de comércio a retalho e de comércio por grosso em livre serviço e a instalação de conjuntos comerciais". E é um exemplo paradigmático, mais um, dos procedimentos e comportamentos políticos do Governo PS e da sua maioria PS nesta Assembleia da República.
É um exemplo da mais total falta de respeito pela Assembleia da República.
É um exemplo da mais completa subserviência perante a Comissão Europeia.
É um exemplo da mais total, completa e integral submissão aos interesses dos Grupos das Grandes Cadeias de Distribuição, nacionais e estrangeiros, Belmiro, J. Martins, Auchan, Carrefour, Lidl, Inditex, etc,etc!
2.Total falta de respeito pela Assembleia da República. A Lei 12/2004 determinava no seu artigo 37º, que seria «objecto de revisão no prazo de três anos após a sua entrada em vigor, na sequência da apreciação pela Assembleia da República, de um Relatório apresentado pelo Governo quanto à sua execução». Julgo que tal conteúdo imperativo não deixa dúvidas a ninguém sobre a necessária intervenção da Assembleia da República sobre a Revisão da Lei, quer a iniciativa fosse parlamentar quer fosse do Governo! Julgo e julgará qualquer pessoa que, de boa fé, olhasse para o que ficou escrito, por decisão do legislador, no caso a Assembleia da República! Ilusão! Puro engano!
O prazo dos três anos cumpriu-se a 15 de Abril e o Relatório de Execução da Lei foi entregue pelo Governo em Junho de 2007. Em Setembro, no início das actividades parlamentares, o Grupo Parlamentar do PCP propôs que para a concretização da «apreciação da Assembleia da República» se realizassem uma série de audições: do ministro da Economia e secretário de Estado do Comércio; a «audição conjunta» sobre o mesmo Relatório das principais associações empresariais e sindicais do sector do comércio e distribuição. Em Outubro, a CAEIDR aprovou por unanimidade o requerimento respectivo. Mas rapidamente se percebeu que nem o Governo nem o Grupo Parlamentar do PS estavam interessados no aprofundamento do debate sobre o tema, nem da intervenção da Assembleia da República no processo de Revisão da Lei 12/2004! O Grupo Parlamentar do PS impediu a audição conjunta das principais associações empresariais do sector (limitando-a às confederações) e fez mesmo declarações, em sede da CAEIDR, de que a Revisão da Lei poderia avançar à revelia da apreciação parlamentar!
O Governo avança com o processo de revisão sem dar conhecimento às Associações empresariais do Relatório de Execução da Lei, e sem informar/dar conhecimento à Assembleia da República do anteprojecto de Decreto-Lei que tinha elaborado para substituir a Lei 12/2004. E se hoje a AR conhece e debate em parte o projecto, é porque a aprovação do regime de fixação de taxas e definição do montante das coimas, são matérias de «reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República».
No desenvolvimento deste processo, CAEIDR elaborou um Parecer sobre o Relatório de Execução, que foi aprovado, com o voto contra do PCP a 12 de Dezembro. Mas o Governo, não queria conhecer a opinião da Assembleia da República para a Revisão da Lei 12/2004. Passados muitos meses sobre a aprovação do Parecer, ainda o sr. secretário de Estado, conforme afirmou em sede da CAEIDR, desconhecia o seu conteúdo...
Depois foram todas as dificuldades / impossibilidades e etc. durante 8 meses para a Audição do sr. ministro e do sr. secretário de Estado conforme decisão da CAEIDR! Só a 24 de Junho foi possível ouvir o sr. secretário de Estado! Ou seja, quando tudo estava já definitivamente «cozinhado», à vontade dos Grandes Grupos da Distribuição.
3.Completa subserviência perante a Comissão Europeia. Um dobrar de espinha que arrepia! Como português, envergonha-me! Embora seja também legítima a suspeita de que é a justificação para o que se queria aprovar, mas não se sabia como justificar! Embora seja também legítima a suspeita de é a justificação para o que se queria aprovar, mas não se sabia como justificar!
O mesmo Governo, que não se mostrou interessado em ter em conta a opinião da Assembleia da República (como era obrigatório), pois avançou com anteprojecto e projecto sem qualquer consulta, foi pronto e diligente em ouvir a Comissão Europeia na primeira quinzena de Fevereiro de 2008!
Aliás, a pressa que justificava todos os atropelos eram as imposições / ordens da União Europeia... que afinal até puderam esperar até Junho de 2008! De facto, como nos explicou o Sr. secretário de Estado, as principais alterações efectuadas aconteceram porque a Comissão Europeia ordenava e ameaçava... e o Governo Português obedecia ...sem qualquer oposição ou contestação!!! Um escândalo e uma vergonha!
4.A completa, total e integral submissão aos interesses das grandes cadeias de distribuição. Obtiveram tudo, mas tudo, o que quiseram do Governo PS e da maioria PS na Assembleia da República.
Nos procedimentos da revisão da Lei 12/2004! Quiseram a AR afastada do processo e a AR foi afastada! Nas auscultações das associações empresariais. Foram ouvidas as Confederações do sector (CCP, APED, APCC), mas também a Associação Empresarial de Portugal e a Associação Industrial Portuguesa. Das outras estruturas associativas, concelhias ou pluriconcelhias, nem uma. Nem o Governo, nem a maioria PS deixou que tal acontecesse na AR, apesar de aprovado pela CAEIDR. Resultado: 4 a 1! Percebe-se: todas as estruturas associativas não consultadas estavam contra!
Nos conteúdos das alterações. Nos objectivos da nova legislação. Na Lei 12/2004 o Artº 2º estabelecia-se como objectivo "assegurar a coexistência e equilíbrio dos diversos formatos" comerciais. No anteprojecto do Governo tal desiderato saía do articulado para o preâmbulo. Mas perdeu-se no caminho europeu, e no projecto desapareceu qualquer referência a essa ideia heterodoxa do fundamentalismo do mercado! Espantoso! Qual equilíbrio, qual coexistência, monopólio da grande distribuição!
Alterações nos métodos de decisão do licenciamento. Afastou-se, como queriam a grande distribuição, das comissões de autorização as associações concelhias e regionais! E podia lá haver fases de candidaturas, que permitissem comparar e seleccionar entre várias, as melhores! E é igualmente admirável que o Governo que escreve no Preâmbulo que "Abandona o sistema de fases de candidatura, penalizador do investimento e dos promotores, adoptando um sistema de entrada de processos em contínuo" seja o mesmo que adopta o processo de fases nas candidaturas QREN! Admirável coerência!
Alterações nos critérios de avaliação da valia relativa das candidaturas. Tudo agora é fluído e possível. Até vai ser pontuada a notável descoberta da contribuição das unidades comerciais para "a diminuição das deslocações pendulares". Ridículo! Mas tudo será à vontade do freguês, isto é dos promotores, grande distribuição e imobiliária! Desapareceram em combate, a "Contribuição para o desenvolvimento do emprego, avaliando o balanço global dos efeitos directos e indirectos sobre o mesmo", substituído por um ambíguo critério da "qualidade do emprego" (apesar da tentativa de disfarçar tal com a sua extensa definição em anexo), e os impactos intersectoriais, isto é, as consequências para o tecido económico regional onde se vai implantar a nova unidade. Mas entende-se: o Relatório de Execução da Lei 12/2004 tinha concluído pela impotência da Administração verificar/controlar esses compromissos dos promotores. Pelo que é mais fácil acabar com esses critérios! Aliás os promotores achavam muito assegurar durante 6 anos o cumprimento desses compromissos, pelo que o Governo resolveu reduzir para 5 anos!!!
Nas alterações das taxas e coimas do processo de licenciamento. Certamente, com medo das dificuldades financeiras dos grandes grupos da distribuição, o Governo decidiu baixar significativamente, num caso de 2/3, o valor das taxas a cobrar nos processos. Isto é reduz-se, a contribuição que esses grupos davam para compensar os estragos produzidos no comércio tradicional, através do fundo para a sua modernização (modcom) e para o fundo de apoio aos empresários comerciais, que infelizmente por culpa deste e anteriores governos ainda não viu a luz do dia. Um Governo atento às dificuldades dos mais fracos!
Em matéria de coimas também estamos conversados. Por falta de tempo, só um exemplo: a falta de envio de informações à DGAE pelas empresas é penalizada com uma coima entre 250 e 1 250 euros! Só para comparação: esta AR aprovou nesta Legislatura que o pobre do pescador que fizer a captura não autorizada de uma truta ou uma boga paga uma coima mínima de 5 000 euros! E digam lá que não há justiça e equidade!!!
E muito mais se poderia dizer do novo projecto de autorização de licenciamento de unidades comerciais. Infelizmente para reforçar a tese de uma legislação completamente virada para a "modernidade" da grande distribuição. E, não de propósito, mas complementarmente, apontada para a estocada final no comércio tradicional, completando o "serviço" realizado pela Lei 12/2004.
5. Finalmente e a bem do regime democrático, seria bom que os que vão permitir ao Governo aprovar tal legislação, meditassem sobre o que foi dito nesta AR a 19 de Dezembro de 2003, no Debate Parlamentar que enformou a Lei que veio a ser aprovada.
Meditassem sobre as considerações então feitas, as objecções levantadas, as precauções e previsões avançadas, para a elaboração de novo normativo cuidassem de assegurar como objectivos centrais da legislação. «Um desenvolvimento mais harmonioso dos diferentes formatos do comércio», Carlos Tavares, então ministro da Economia. «O correcto Ordenamento do Território», idem. «O claro», do deputado Osvaldo Castro, à necessidade da «protecção do pequeno comércio, porque é a parte mais fraca» do Deputado Lino de Carvalho. E «O equilíbrio entre as várias formas de comércio», «A necessidade crítica da capacidade reguladora do Estado», a «Proposta não atende suficientemente ao pequeno comércio de proximidade local» e "Faltam procedimentos e especificações que garantam soluções justas e eficazes numa área importante da actividade económica e social», do Deputado Maximiano Martins.
Ora a execução da Lei 12/2004 - como o relatório que avaliou o demonstra - não só justifica a posteriori os que criticaram com razão a proposta, como nega as previsões dos seus autores. Mas a sua revisão vai produzir legislação muito, muito pior!
6.Por último, a proposta do GP do PSD de transferir para os municípios a fixação do horário do comércio, que o PS tão prontamente acolheu, apesar de tudo o que andou a dizer... casa-se bem com o projecto de decreto-lei do Governo para o licenciamento comercial, substituindo a Lei 12/2004. A LIBERALIZAÇÃO TOTAL e ABSOLUTA! Ora tal, devia ser assumido claramente, sem máscaras! Pelo que não era necessária qualquer lei. Era politicamente mais transparente e adequado, e pouparia milhões ao Estado!
Mas tudo isto se casa também e muito bem com um PS, que teve um Governo que avalizou empréstimos do BEI à SONAE no valor de 75 milhões de euros, 15 milhões de contos. Dez milhões para modernizar o comércio do Porto com Norte Shopping! Cinco milhões para modernizar o comércio de Lisboa com o Centro Comercial Vasco da Gama!
Disse.