(proposta de lei n.º 147/XII/2.ª)
Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
A resposta a este Governo de desgraça nacional, a resposta a este caminho de exploração de quem trabalha, a resposta a esta lei e muitas outras medidas gravosas deste Governo PSD/CDS-PP, foi dada ontem com a grandiosa greve geral, uma jornada de luta de tremendo sucesso em que trabalhadores de norte a sul do País disseram «não» a esta política, «não» a este caminho, «não» a este Governo que afunda e destrói o nosso País.
A presente proposta de lei, que visa criar vários fundos para o pagamento de uma parte das compensações em caso de despedimento de um trabalhador, é um embuste inserido num processo mais vasto de ataque aos direitos dos trabalhadores, facilitação e embaratecimento dos despedimentos, de agravamento da exploração para concentrar cada vez mais riqueza em meia dúzia de grandes grupos económicos à custa da miséria e da exploração de quem trabalha.
Ao contrário do que sistematicamente tentam fazer crer, agravar a exploração, facilitar os despedimentos ou torná-los mais baratos não resolve nenhum dos problemas do nosso País. Antes pelo contrário, agrava e acelera o processo de destruição do tecido produtivo e da nossa economia.
Também não passa de um embuste e de uma descarada mentira dizer que é com este tipo de iniciativa que se está a modernizar o mercado de trabalho.
Com este caminho, o Governo PSD/CDS-PP está a recuar no tempo. Está a recuar ao tempo de trabalho sem direitos, está a recuar ao tempo de uma gritante exploração, está a recuar ao tempo em que os salários não chegavam para matar a forme de quem trabalha.
Com a presente proposta de lei, não passamos a ter crescimento, competitividade e emprego; vamos ter, sim, mais recessão, destruição e desemprego.
Com a presente proposta de lei, são criados dois fundos e um mecanismo equivalente que visam, e passo a citar, «garantir o pagamento parcial das compensações devidas aos trabalhadores por motivo de cessação de contrato de trabalho.»
Contudo, a análise deste diploma não pode deixar de ser feita sem referir que este Governo por via da alteração ao Código do Trabalho facilitou ainda mais despedimentos com a alteração às regras do despedimento por inadaptação e por extinção do posto de trabalho e que, por via de sucessivas alterações à legislação, o Governo reduziu, em muitos casos, em 70 ou 80% o valor pago a título de indemnização e nos casos de despedimento. Hoje mesmo, vamos discutir mais uma redução no valor pago a título de indemnização.
Assim, o Governo, depois de facilitar os despedimentos e reduzir o valor das indemnizações para um valor praticamente residual, vem agora dizer que este mecanismo visa garantir o pagamento de uma parte da indemnização que é devida.
Na verdade, é assumido que os ditos «fundos» visam apenas garantir o pagamento até metade do valor da indemnização. O resultado é este: o Governo facilita os despedimentos, torna o valor das indemnizações praticamente residual e, depois, cria um fundo para garantir apenas o pagamento de metade deste valor.
Mais importa referir que esta proposta de lei permite que o dinheiro destes fundos seja aplicado em valores mobiliários, dívidas de curto prazo ou outros ativos de natureza monetária, isto é, aplicações especulativas.
Por sua vez, o chamado «mecanismo equivalente», alternativo aos fundos, não tem os seus contornos jurídicos bem definidos, deixando nas mãos das companhias de seguros e da banca a sua definição. Tais opções comportam sérios riscos para os interesses dos trabalhadores e visam privilegiar a especulação e os negócios privados da banca e das companhias de seguros, à custa das indemnizações devidas aos trabalhadores despedidos.
Também decorre desta proposta de lei que estes fundos apenas se aplicam aos novos contratos de trabalho, pelo que não há qualquer garantia de que as entidades patronais não façam refletir os custos destes fundos nos salários dos trabalhadores, ficando desta forma os trabalhadores a pagar o seu próprio despedimento.
Por outro lado, as entregas e contribuições que são devidas por parte das entidades patronais são manifestamente insuficientes para os encargos que este fundo se propõe assegurar, o que, aliado a alguma promiscuidade com os fundos próprios da segurança social, suscita sérias preocupações quanto ao uso de dinheiros da segurança social ou de uma outra qualquer fonte ou entidade pública para pagar as indemnizações que os patrões deviam pagar aos trabalhadores despedidos.
Aliás — e deixo uma interrogação —, vários parceiros sociais afirmaram na comissão, nas audições prévias, que há um acordo com o Governo relativamente a medidas para mitigar os custos destes fundos por parte das entidades patronais, isto é, o Estado vai indiretamente pagar as contribuições que os patrões vão pagar para estes fundos.
Por fim, é inaceitável que estes fundos possam vir a ser geridos por entidades privadas, o que dada a natureza predatória e especulativa do sistema financeiro ameaça os próprios fundos e o uso destes para fins privados, isto é, o lucro à custa das indemnizações devidas aos trabalhadores.
Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Para o PCP, o objetivo deste conjunto de medidas é claro, o de facilitar e tornar mais barato os despedimentos.
Numa altura em que já temos 1,5 milhões de desempregados, numa altura em que o Governo ataca os rendimentos do trabalho e, consequentemente, a procura interna regista níveis historicamente baixos, numa altura em que a recessão afunda a nossa economia, estas medidas são um descarado e inaceitável convite ao despedimento, ao encerramento de empresas. Isto é tudo o que o nosso País não precisa.
A greve geral de ontem, a resposta dada pelos trabalhadores, as consequências das opções políticas da troica nacional e estrangeira tornam claro que este Governo não pode continuar e impõe-se o mais rapidamente possível a derrota deste Governo e desta política, seja ela conduzida pelo PS, pelo PSD ou pelo CDS-PP.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social,
O senhor tentou «pôr água na fervura», face à evidência do embuste que estes fundos representam.
Há duas ou três questões que merecem ser colocadas.
Em primeiro lugar, é ou não verdade que há o risco de entrega destes fundos ao setor privado, nomeadamente à banca e às companhias de seguros?! Gostava de saber se o Sr. Secretário de Estado assume ou não esse risco e se é ou não verdade que estas entidades podem fazer lucro e gerir a sua atividade privada à custa destes fundos. Bom, não quero estar a lembrar-lhe o que aconteceu a inúmeros fundos, em todo o mundo, relativamente a entidades do tipo banca e companhias de seguros, que fizeram a sua gestão e especulação e, depois, levaram esses fundos à falência. É esse o risco que o Governo assume?
Esta é a primeira questão que lhe queremos colocar, porque isto — não haja qualquer dúvida em relação a esta matéria — resulta, claramente, do diploma.
O segundo embuste que o Sr. Secretário de Estado tentou fazer passar na sua intervenção é o de que isto tem a ver com a proteção dos trabalhadores e não tem nada a ver com indemnizações. Sr. Secretário de Estado, podemos analisar este diploma sem ter em conta o que o Governo anda a fazer no âmbito da matéria cuja discussão se vai realizar imediatamente a seguir?!
O que se vai fazer imediatamente a seguir é uma discussão sobre a redução das indemnizações, em que se verifica uma situação muito concreta, Sr. Secretário de Estado. Por exemplo, uma trabalhadora com 600 € de salário e 14 anos de trabalho, no âmbito da anterior lei, recebia 8400 € de indemnização; com a nova proposta de lei, que vamos discutir imediatamente a seguir, passa a receber 2880 € de indemnização.
Mais: se tivesse 30 anos de casa, essa trabalhadora receberia 18 000 € de indemnização; com esta lei, por iniciativa deste Governo, recebe os mesmos 2880 €.
Portanto, o Governo não pode dizer que este fundo está desligado das indemnizações. É que o Governo está a reduzir para montantes praticamente residuais aquele que é o valor das indemnizações e, agora, propõe-se criar um fundo para pagar até metade deste valor.
Mas a questão central que se coloca é esta: quem é que vai pagar este fundo? A CIP, a entidade-patrão dos patrões, assumiu, claramente, na Comissão de Trabalho, que há um compromisso com o Governo para que os custos, durante o período de crise — foi esta a expressão —, não sejam das empresas. Havendo apoios à contratação, por essa via, indiretamente, o Estado vai estar a financiar o fundo, já que entrega dinheiro aos patrões que, por sua vez, o entregam ao fundo. Por isso mesmo, no fundo, seremos todos nós a pagar os custos com as indemnizações e os custos que estes fundos irão acarretar nos primeiros tempos. É isto que vai acontecer? É esta a natureza do fundo, em que todos vamos pagar os custos que as empresas deviam assumir?!