Apreciação Parlamentar N.º 72/XI/2.ª

Estabelece o regime de acesso e de exercício da actividade funerária

Estabelece o regime de acesso e de exercício da actividade funerária

Do Decreto-Lei n.º 109/2010, de 14 de Outubro, que “ Estabelece o regime de acesso e de exercício da actividade funerária, revogando o Decreto-Lei n.º 206/2001, de 27 de Julho”

Publicado em Diário da República n.º 200, Série I, de 14 de Outubro de 2010

O Decreto-Lei n.º 109/2010 de 14 de Outubro revê o regime e enquadramento legislativo de acesso e de exercício da actividade funerária fixado pelo Decreto-Lei n.º 206/2001 de 27 de Julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 41/2005 de 18 de Fevereiro. E a primeira justificação para a revisão normativa é que “Os princípios e os critérios que devem ser observados pelos regimes de acesso e de exercício de actividades de serviços estão estabelecidos no Decreto -Lei n.º 92/2010, de 26 de Julho, que transpôs a Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro” (Preâmbulo do Decreto-Lei). Isto é, a aplicação da Directiva Bolkenstein à actividade funerária.

E é sob o alto patrocínio dessa Directiva, que tem como principal objectivo, intensificar a liberalização e privatização dos serviços, que no Preâmbulo do novo Decreto-Lei se começa por enunciar o credo neoliberal: “Menos burocracia, procedimentos mais rápidos e acesso mais fácil ao exercício de actividades tornam o mercado de serviços mais competitivo, contribuindo para o crescimento económico e para a criação de emprego. Por outro lado, para além da competitividade do mercado dos serviços, garante-se ainda aos consumidores uma maior transparência e informação, proporcionando -lhes uma oferta mais ampla, diversificada e de qualidade superior.”

Não explica o Governo, porque razão, por exemplo, no sector da energia – combustíveis líquidos, electricidade, gás natural – a privatização e a liberalização não produziu preços e tarifas mais ajustados às necessidades dos cidadãos e à competitividade das empresas nacionais, nem mais emprego! Bem pelo contrário.
De facto, a liberalização e privatização da actividade funerária, objectivo central do Decreto-Lei n.º 109/2010, irá produzir uma concentração de operadores, à custa da liquidação de dezenas de empresas familiares, hoje predominantes no sector, e sem que daí advenha qualquer vantagem para os consumidores.

Pode-se mesmo prever, que os objectivos fixados no Decreto-Lei n.º 109/2010, na continuidade da Directiva Bolkenstein, “competitividade do mercado” e garantir “aos consumidores uma maior transparência e informação, proporcionando -lhes uma oferta mais ampla, diversificada e de qualidade superior”, serão também neste caso completamente frustrados.
O Decreto-Lei, pelas principais alterações que faz relativamente à legislação anterior (Decreto-Lei n.º 206/2001, alterado pelo Decreto-Lei n.º 41/2005) produzirá:

1.A desigualdade e deslealdade concorrencial, nomeadamente abrindo a actividade às “associações mutualistas” (n.º 1 do artigo 3.º): (i) sem salvaguardar a exigência de iguais obrigações em matéria fiscal e na disponibilidade “de um serviço básico de funeral social” (artigo 17.º) e (ii) sem questionar as possíveis incompatibilidades das actividades funerárias das associações mutualistas com outras suas actividades como IPSS, tais como propriedade, tutela e/ou gestão de lares de 3.ª idade, clínicas médicas e hospitais, transporte de doentes. Recorda-se que nos termos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 206/2010, estava vedado, e bem, “ao pessoal das agências funerárias, no exercício da sua actividade, a permanência em quaisquer dependências de estabelecimentos hospitalares ou de serviços médico-legais”.

2.O reforço das posições de grandes empresas no sector, com possível agravamento do abuso de posição dominante e de dependência económica, ao legalizar pelo artigo 23.º, o que se refere no Preâmbulo: “a permissão de gestão e de exploração privada de cemitérios mediante concessão pública e a gestão e exploração de capelas e centros funerários”. O que já sucede com as posições da SERVILUSA, em várias capelas mortuárias de Lisboa e nos cemitérios de Elvas, Figueira da Foz, Rio de Mouro e Póvoa de Stª Iria (crematório). Deve ainda recordar-se os seus esforços para a gestão de novo espaço cemiterial em V. N. de Gaia. É uma evidência, que a generalidade das empresas familiares do sector não terá condições económico-financeiras nem técnicas para concorrer a essas concessões, pelo que ficarão sob as imposições (regras e custos) das empresas que vão gerir esses espaços, e que simultaneamente concorrem com elas na organização dos funerais e acções correlativas!

Face às considerações expostas, ao abrigo do artigo 169.º da Constituição da República e do artigo 189.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP requer a Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei n.º 109/2010, de 14 de Outubro, que “ Estabelece o regime de acesso e de exercício da actividade funerária, revogando o Decreto-lei n.º 206/2001, de 27 de Julho” (Publicado em Diário da República n.º 200, Série I, de 14 de Outubro de 2010).

Assembleia da República, em 2 de Novembro de 2010

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