Intervenção

Ensino multilingue - Intervenção de Miguel Tiago na AR

O ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e de ensino

 

Senhor Presidente
Senhores Deputados

 

A fixação em Portugal de diversas comunidades imigrantes constitui, sem sombra de dúvida, uma importante mais-valia, quer económica, quer cultural para o nosso país. O acolhimento destas comunidades e a garantia dos seus direitos deve ser constante preocupação do Estado.

Da convivência multicultural e multi-étnica, as populações criam novos ambientes culturais e sociais, mais ricos e capazes de garantir a permeabilidade entre as diferentes comunidades ou etnias. Por isso mesmo, o Estado deve também contribuir para a preservação das culturas, num regime de troca e permuta entre elas, no sentido do mútuo enriquecimento. O Estado deve, sem dúvida, criar os mecanismos de apoio e de estímulo que propiciem este ambiente.

O Projecto de Lei que o Bloco de Esquerda hoje nos apresenta traz-nos a identificação de um problema e de uma insuficiência reais. A dissolução da variedade cultural e a constante tentativa da sua absorção e formatação nos padrões da cultura portuguesa, onde tem tido papel importante o sistema de Ensino, deve ser combatida. De facto, suprimir as Línguas estrangeiras nas escolas portuguesas, não contribui para uma verdadeira integração, mas para uma gradual diluição que, como sabemos, dará origem a graves problemas sociais, entre os quais o insucesso e o abandono escolar e, em última análise, a segregação.

No entanto, a forma como o Projecto de Lei sugere agir sobre o problema correctamente identificado parece pouco fundamentada em experiência factual. Ministrar aulas em Línguas distintas, simultaneamente, apresentando a virtude de proporcionar a todos o contacto com uma Língua que não a sua, não nos parece, no entanto, a mais ajustada à realidade das escolas e do universo estudantil que se pretende atingir.

O essencial do Projecto de Lei constitui uma abordagem positiva e sugere passos para a melhoria de uma situação que carece de acção política. O apoio efectivo a acções escolares que visem a integração e a promoção da tolerância e da convivência multicultural; o apoio ao ensino da Língua Portuguesa a estudantes que não a tenham como Língua materna e a imigrantes; a possibilidade de aprender línguas maternas que não o português como língua estrangeira; a formação de docentes no sentido do enriquecimento das suas capacidades para ensinar em ambiente multicultural são passos importantes que merecem o apoio do PCP. No entanto, experiências mais avançadas como as aulas bilingues e a forma como são ou devem ser feitas, parece-nos carecerem de maior experiência e capacidade de avaliação objectivas. São significativas as dúvidas que surgem em torno dessa medida concreta e da forma como seria feita, nomeadamente, sobre a possibilidade de criar escolas compostas quase exclusivamente por falantes desta ou daquela Língua, numa tendência para a sua concentração e guetização.

Contudo, embora a solução possa não receber o nosso aplauso, convergimos no sentido de adoptar, criativamente, formas de integração real e de valorização das Línguas como expressões culturais de inestimável valor, cuja preservação é fundamental. A integração dos imigrantes ou dos seus descendentes deve ser uma prioridade, particularmente do Sistema Educativo e as próprias orientações do Projecto de Lei podem servir de base para esse trabalho, nomeadamente no que toca à criação de medidas de apoio a iniciativas escolares que visem a promoção da integração cultural ou a valorização de culturas estrangeiras. É um caminho seguro e capaz de fornecer a experiência pedagógica num registo mais gradual e capaz de ser avaliado. Apoiamos a criação de um programa de estímulo à iniciativa escolar no sentido da promoção da tolerância e multiculturalidade e embora não consideremos criadas as condições para uma aplicação plena deste Projecto de Lei, daremos o nosso contributo na discussão na especialidade em sede de comissão.

 

Disse.

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