Projecto de Lei N.º 261/XV/1.ª

Definição e execução de procedimentos para situações pós-incêndio

Exposição de motivos

Os grandes incêndios ocorridos em 2017, posteriormente os de 2018 na Serra de Monchique e a situação a que se tem assistido no país após 7 de julho de 2022 e cujo desfecho ainda se desconhece, deixaram e deixam à vista um cenário desolador de destruição que requer intervenção célere e adequada às novas condições que se verificam nestes terrenos, visando a reposição das condições produtivas do território, bem como as condições ambientais para salvaguarda da biodiversidade.

A ocorrência de grandes incêndios dos quais resultam extensas áreas queimadas levanta um conjunto de problemas ambientais e de reposição de potencial produtivo que devem ser tratados de forma cuidada e devidamente enquadrada do ponto de vista técnico.

Nas diversas visitas que o Grupo Parlamentar do PCP realizou às zonas devastadas pelos incêndios de 2017 e 2018 foi possível constatar que muitas ações urgentes de salvaguarda dos terrenos, de estabilidade de vertentes, de proteção das linhas de água e de reposição de condições de produção continuam por executar, acarretando passivos ambientais cuja regeneração é fundamental.

Sem a adoção de medidas de estabilização do solo e de contenção e consolidação de vertentes e de regeneração das galerias ripícolas ao longo das margens dos cursos de água, a exposição dos terrenos nus à ação do vento e da chuva provoca a sua erosão e a ocorrência de desabamentos que, para além de acarretarem perda de recursos e maior degradação das condições ambientais, podem ainda constituir risco para pessoas e bens.

A manutenção nos terrenos do material lenhoso remanescente dos incêndios por falta de recursos ou por desconhecimento das consequências que daí advêm, para além de impedir a recuperação de algum rendimento, constitui ainda combustível disponível para alimentar novos incêndios e facilita a propagação de doenças e pragas na floresta nomeadamente às árvores não ardidas.

A estes aspetos acresce ainda a regeneração natural não desejada de algumas espécies, com particular destaque para o eucalipto, com o crescimento indiscriminado de milhares e milhares de efetivos, não só a partir das árvores queimadas, mas também pela capacidade de projeção de sementes, o que provoca um crescimento descontrolado da espécie, tornando-se a árvore dominante em áreas ardidas.

Neste cenário não fica também de fora a difícil situação da apicultura. Nesta matéria, para além da aniquilação de colmeias inteiras, os grandes incêndios são responsáveis pela supressão do alimento disponível para as abelhas sobreviventes que acabarão por perecer se não forem tomadas as medidas adequadas para responder à situação.

Da constatação no terreno das múltiplas situações preocupantes decorrentes dos incêndios florestais e tendo como objetivo assegurar que, nas situações atuais e futuras, são tomadas, atempadamente, as medidas adequadas para responder às dificuldades impostas por estes episódios de catástrofe, o PCP propõe a promoção do desenvolvimento e aprovação de procedimentos para as situações de pós-incêndio, tipificando as ações a desenvolver em todas as situações de grandes incêndios e assegurando a sua execução no terreno.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aprova o regime de definição e adoção de procedimentos de emergência após a ocorrência de incêndios de grande dimensão.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

As medidas definidas nos termos da presente lei, a desenvolver nas situações de pós-incêndio, são aplicadas em todos os incêndios a que corresponda uma área ardida superior a 100 hectares.

Artigo 3.º

Definição de procedimentos pós-incêndio

  1. As medidas que devem ser tomadas de forma a garantir a recuperação e salvaguarda dos terrenos afetados pelos incêndios e a reposição das respetivas condições de produção, e os respetivos protocolos de execução, são objeto de definição pelo Governo, através de decreto regulamentar que inclui, nomeadamente, os seguintes aspetos:
    1. A estabilização dos solos e a estabilidade de vertentes;
    2. A retirada do material lenhoso ardido e armazenamento da madeira em condições adequadas de segurança e de manutenção do seu estado;
    3. A reposição da cobertura vegetal do solo;
    4. O controlo de infestantes e espécies exóticas e prevenção da regeneração descontrolada de espécies florestais indesejadas;
    5. A proteção e estabilização das margens dos cursos de água promovendo a recuperação de galerias ripícolas;
    6. A intervenção de emergência para a apicultura, nos casos em que a situação se coloque;
    7. A reflorestação das áreas afetadas.
  2. Na elaboração do decreto regulamentar previsto no número anterior o Governo assegura a consulta às organizações representativas dos produtores florestais e dos agricultores.

Artigo 4.º

Entidades envolvidas

O Governo define as entidades responsáveis pela execução das medidas e ações constantes do decreto regulamentar previsto na presente lei e assegura, sempre que necessário, a contratação de serviços para garantir essa execução.

Artigo 5.º

Divulgação de procedimentos pós-incêndios

Após a publicação do decreto regulamentar que previsto na presente lei, o Governo promove a realização de uma campanha a nível nacional, de divulgação dos procedimentos a adoptar em situação pós-incêndios e dos apoios disponíveis para a sua realização no terreno.

Artigo 6.º

Mecanismos próprios de intervenção

O Governo garante a existência de mecanismos próprios para a intervenção de emergência nos territórios afectados por grandes incêndios florestais, sem prejuízo do direito de retorno.

Artigo 7º

Apoios para as áreas ardidas de menor dimensão

O Governo assegura medidas de apoios específicos para a realização de trabalhos de estabilização de emergência nos solos, nas áreas ardidas de menor dimensão.

Artigo 8º

Prazos

  1. No prazo de 90 dias após a entrada em vigor da presente lei, o Governo assegura a aprovação do decreto regulamentar contendo os procedimentos nela previstos e adota as demais medidas regulamentares e administrativas necessárias para a sua aplicação.

Artigo 9.º

Disposições orçamentais

O Governo, até 1 de outubro de cada ano, em face da ocorrência de grandes incêndios, assegura a identificação das ações a desenvolver de acordo com os procedimentos definidos nos termos da presente lei e inscreve na Proposta de Lei do Orçamento do Estado para o ano subsequente as verbas necessárias para a sua execução.

Artigo 10.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato à sua publicação.

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