Intervenção de

Declaração política sobre a política de educação<br />Intervenção da Deputada Luísa Mesquita

Senhor Presidente Senhoras Deputadas Senhores DeputadosEste governo não quer a qualificação dos portugueses, nem o desenvolvimento do país.A coligação PSD/CDS tomou posse há quase um ano e após os dramas e as tragédias financeiras postas em cena, a máscara caíu.Ao reino da educação devem chegar os eleitos. Para a grande maioria dos portugueses oferece-se a ignorância e o reino dos infernos.A lei é a do mercado e portanto quem quer educação e formação que a pague.As medidas aí estão.Por um lado a cega visão economicista da redução dos custos.Encerram-se escolas. Extinguem-se cursos. Cativam-se verbas. Reduzem-se orçamentos.Por outro, o agravamento da desigualdade e a sustentação da selectividade.• Produzem-se rankings de escolas sem sustentabilidade científica nem pedagógica. • Semeiam-se exames, impedindo o acesso a outros níveis do sistema • Transformam-se os alunos em produtos “bem comportados” a fornecer ao mercado. • Formulam-se notas de suspeição, relativamente à ética e à qualificação profissional e académica dos professores. • Afirma-se que o exercício democrático vigente na gestão do sistema é um mal de Abril. • Considera-se que as responsabilidades financeiras do estado perante o ensino público e o ensino privado são as mesmas.E o passo seguinte, comunica-se com pompa e circunstância. É preciso combater energicamente o estatismo na educação.Resumindo, a escola não é para este governo, um bem público, mas apenas e tão só um espaço de compra e venda de saberes.A Organização Mundial de Comércio dita as ordens e o governo, quão aluno seguidista e acrítico obedece e não tem voz.Recentemente, no Fórum Mundial da Educação em Porto Alegre, o Ministro da Educação Belga dava notícia que a Organização Mundial do Comércio havia solicitado aos estados membros as suas propostas de privatização da educação até 31 de Março, determinação inaceitável na perspectiva do governo belga.E o governo português, o que pensa? Enviar sigilosamente a silenciosamente a sua proposta. É urgente que o governo informe a Assembleia do que vai fazer. Se vai atropelar o texto constitucional. Se vai continuar a pôr em causa o direito à educação e ao ensino; Se vai ignorar as baixas taxas de sucesso escolar nos diferentes níveis do sistema; Se vai ignorar as baixas taxas de frequência do Ensino Secundário e do Ensino Superior; Se vai ignorar as enormes taxas de abandono precoce; Se vai disfarçar, pela exclusão, o verdadeiro cenário da educação em Portugal.Naturalmente que para o Organização Mundial do Comércio, os apetites vorazes de privatização do sector constituem a única resposta que interessa ao mercado e aos seus mais dilectos profetas.Ou será que o programa de estabilidade e crescimento aprovado recentemente nesta Assembleia, com os votos da maioria parlamentar que sustenta o governo e também do partido socialista, é já o primeiro compromisso a enviar à organização Mundial do Comércio?Valerá a pena recordar o insustentável paradoxo que aqui foi aprovado no que à educação diz respeito.Define-se como objectivo diminuir o nosso afastamento face aos parceiros europeus, apostando numa educação moderna e com qualidade.E depois identifica-se a terapia.No ensino básico e secundário propõem-se sete medidas de poupança que vão desde a diminuição do número de docentes, ao encerramento das escolas, à alienação do património do Estado, à diminuição da oferta do ensino nocturno, ao ranking das escolas e dos professores e à determinação do financiamento em articulação com os resultados e não às necessidades reais do país.No ensino superior as opções são igualmente desastrosas. Impõe-se a dependência do ensino superior do sector privado da economia.Encerram-se cursos, quando a lei da procura não for suficientemente apelativa no mercado.O Estado desresponsabiliza-se do financiamento do ensino superior e da investigação, empurrando estes sectores para a empresarialização e a procura de receitas próprias.As medidas tomadas no que à educação, ensino e investigação dizem respeito, andam de mãos dadas com as decisões relativas à segurança social, à saúde ou ao mundo do trabalho.Não comungamos das reflexões de alguns de que as opções são avulsas, não se articulam e não têm objectivos.Nada menos verdadeiro.São medidas elitistas e limitadoras do desenvolvimento do país e ideologicamente comprometidas como uma visão do mundo dominado pelo poder económico.Temos uma população jovem condenada ao trabalho desqualificado, sujeito às novas e liberalizantes formas de escravatura, sem opção entre educação e trabalho.Somos, neste momento, o único país da União Europeia que proíbe os jovens trabalhadores, com idades compreendidas entre os 16 e os 18 anos de frequentar o sistema em nome de falaciosas vontades de rigor e transparência, que não têm outro objectivo que não aquele que acabei de referir. Fechar as portas da formação aos jovens mais carenciados, independentemente da sua vontade e do seu sucesso escolar.De facto, este governo não quer qualificar os portugueses.Quer sim reproduzir desigualdades, quer sim transformar a escola em local de excelência e de elites.Por isso o governo preferiu injectar no sistema um conjunto de malfeitorias que determinam o nosso progressivo afastamento dos países desenvolvidos.E nada ficou de fora.Na educação pré-escolar, o governo transformou, por despacho, as educadoras de infância em guardas de armazém de crianças, ao confundir intencionalmente a componente educativa com a componente social.O governo pretendeu vender gato por lebre às famílias.Desvirtuar os objectivos de educação pré-escolar, desresponsabilizando-se, e responsabilizando o poder local.Na escolaridade obrigatória, de uma penada, desqualifica o sistema, reduzindo recursos humanos e materiais.Determinou o encerramento de milhares de escolas, sem medir as nefastas consequências para as crianças e as múltiplas implicações que decorrem duma medida meramente administrativa de formato único.Os custos e a contenção financeira são opções bastardas de todos os problemas.Depois vieram as ordens dadas ao aparelho regional para promover a retenção das crianças que faziam 6 anos entre os meses de Setembro e Dezembro.O pânico reinou nas inúmeras famílias que tinham crianças nascidas nesta data.O governo roubava-lhes as respostas educativas e formativas, sem nenhuma explicação que não fosse, a redução de mais uns euros e a criação de espaço para soluções privadas.Entretanto anunciaram-se os rankings das escolas com dois objectivos claros:• Por um lado garantir às famílias com melhores condições económicas a matrícula dos seus filhos nas escolas melhor classificadas; por outro garantir que as restantes se satisfizessem com “as consideradas piores escolas”, que serão cada vez piores, enquanto as primeiras serão escolas de excelência, porque financiadas exactamente para isso.Ignoram-se as assimetrias sociais, particularmente as económicas e as culturais, e fomenta-se o fosso entre as diferentes oportunidades de acesso e êxito escolares.Uma aberrante classificação das escolas que nem sequer é original.Já surgiu em outros países, ligada às alterações políticas e económicas de meados dos anos 80, quer na Inglaterra (com Tatcher), quer nos Estados Unidos (com Reagan).Afinal nada de mais retrógrado.É cópia e é má.Em seguida, transformaram-se os alunos em bodes expiatórios da violência e da indisciplina nos espaços escolares.Confundiu-se autoridade com autoritarismo. Exige-se que a escola encontre antídotos para todas as disfunções sociais.Afrontam-se os mecanismos democráticos em nome de sábias autoridades individuais.Agora anuncia-se a reforma do ensino secundário.Conhecendo-se o insucesso deste degrau de ensino, ninguém de bom senso dúvida da necessidade de uma reforma.Uma reforma que tenha como objectivo primeiro a universalidade do ensino secundário, dado que dois terços da população activa e adulta se fica pelos 6 anos de escolaridade.Depois avaliar a distorção que ocorre com a procura sistemática dos cursos gerais, vocacionados para o ensino superior, em detrimento de outras vias.E finalmente reflectir acerca do sistema de avaliação vigente que trucida cerca de 50% dos poucos jovens que a ele tem acesso.No entanto a proposta vinda a público é determinada pela contenção financeira e sugere não um ensino secundário para todos mas várias vias de frequência em função da origem social dos alunos.Finalmente o ensino superior, intencionalmente desarticulado em termos materiais e de substância dos restantes níveis de ensino é alvo, com este governo da maior asfixia financeira de que há memória.A qualificação dos portugueses e a competitividade do país não são, de facto, parâmetros que balizem as preocupações governamentais no que ao ensino superior diz respeito.O governo está convencido ou pretende convencer o país que o processo de democratização do ensino superior está concluído e chegou a hora da qualidade.Ou não conhece os números ou não sabe interpretá-los.Temos um sistema pouco eficiente.Temos falta de quadros qualificados.Temos uma baixíssima taxa de população diplomada.Temos uma elevada taxa de licenciados desempregadosTemos muito emprego sub-qualificado entre a população detentora de graus académicos, o que evidencia também a incapacidade do tecido produtivo em absorver quadros de elevada formação e apostar em melhores índices de produtividade e competitividade.A investigação no ensino superior é diminuta.Os centros de investigação sobrevivem à procura de receitas próprias.Não há emprego científico.Não existem quadros de investigadores.E ao ensino superior exige-se cada vez mais, a capacidade de dar resposta a uma multiplicidade de necessidades, para além das suas competências tradicionais de ensino e atribuição de graus académicos e de realização científica.E perante este diagnóstico de todos conhecido, o governo propõe o auto-financiamento do ensino superior público, o aumento das propinas, a penalização dos estudantes com menores níveis de sucesso, ou seja um sistema direccionado para eleitos numa evidente afronta aos princípios constitucionais.Senhor Presidente Senhoras Deputadas Senhores DeputadosEstamos perante a maior ofensiva ao ensino público pós 25 de Abril.Estamos perante um objectivo claro de mercantilização dos saberes, que procura na privatização o economicamente rentável.Este governo não quer qualificar os portugueses e por isso ataca a escola pública, única que garante a universalidade da frequência e níveis elevados de qualidade, vectores indispensáveis a um desenvolvimento social sustentado e justo do país, capaz de nos retirar, a médio prazo, do topo dos países com maior taxa de população em risco de pobreza da União Europeia.Disse.

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