Declaração sobre questões de Defesa Nacional e Forças ArmadasConferência de Imprensa com Rui F

Com o distanciamento temporal que acontecimentos recentes aconselham, cuja gravidade não se pode esquecer, entende o PCP que a nomeação e a tomada de posse do novo CEME não é a esponja que apaga os problemas com que se debatem as Forças Armadas e de quem nelas presta serviço.

As justificações tornadas publicas pelo Gen. Silva Viegas para a sua demissão têm de merecer a analise e a reflexão dos portugueses e desde logo do Presidente da República que é também Comandante Supremo das Forças Armadas.

A recusa por parte do PSD e do PP em discutir estas questões na Comissão Parlamentar de Defesa, a tentativa do Governo pretender atirar “o caso” para o baú do esquecimento, a afirmação do Primeiro-Ministro, já após os acontecimentos, de que o Exército vai manter o quadro de constrangimentos financeiros existentes sem alteração do quadro de missões definidas, é sintoma de que o Governo não tirou dos acontecimentos qualquer lição, insistindo numa atitude de “posso, quero e mando”.

Como o PCP muito cedo referiu, não há operações de propaganda ou mediáticos anúncios que apaguem a realidade, assim como não há acções de condicionamento e pressão por via do Ministério da Defesa que consigam fazer esconder a real situação das Forças Armadas e dos militares.

Essa realidade é marcada por uma crescente perca da capacidade de resposta das Forças Armadas em valias importantes para o país como agora, por exemplo, no apoio no combate aos incêndios.

Daí que só como mera operação de imagem se pode entender a deslocação do Ministro Portas ao Comando Operacional das Forças Terrestres (COFT), faz hoje oito dias, e as declarações que fez.

O Ministro não disse, entre outras coisas, que, por falta de dinheiro, os meios de combate a incêndios (humanos e materiais) do Campo Militar de Santa Margarida (e não só) estão praticamente inoperacionais conforme se viu no fogo que devorou cerca de 40 hectares da referida zona militar; que, a falta de verba, obrigou o Exército a uma redução de 30% nas duas últimas incorporações deste ano o que significa uma redução dos meios humanos para além da inoperacionalidade dos meios materiais; que, por incúria governamental, a Força Aérea Portuguesa perdeu a possibilidade de intervir com meios próprios nos incêndios florestais.

Mas, o Ministro da Defesa também não disse que em contraponto à falta de verbas para tudo isto há milhões de euros para gastar nas duas esquadras de aviões F 16 ao serviço da Nato, que nem sequer tem pilotos suficientes para os operar.

“O país continua a arder com um Governo cor-de-rosa como ardia com o Governo cor-de-laranja. O Falhanço do Estado é de tal forma grave que estamos perante uma desgraça nacional” (António Pires de Lima 4/8/99). “É preciso um comando único da política florestal, a profissionalização dos serviços, a aposta total na prevenção” (Paulo Portas 4/8/99). E, agora?

Ora, é por estas e por outras que os militares olham o Ministro sem confiança.

É útil também neste momento afirmar que, se é verdade que existem constrangimentos financeiros, é uma pura mistificação situar os problemas meramente no terreno orçamental. Na verdade, mais dinheiro não é sinónimo de mais meios ou de meios mais adequados às prioridades e necessidades nacionais e, muito menos, de melhores Forças Armadas. E importa dizer, também, que se a situação das Forças Armadas é a que se conhece, alguém é responsável.

Recorda-se por isso que o PSD esteve ininterruptamente no Governo de 79 a 95 e que foi responsável pela pasta da Defesa de 1982 até 1995 (de 79 a 82 foi o CDS). Por que razão faria agora este Governo PSD/PP diferente do que fez anteriormente?

É verdade que Paulo Portas, por tudo o que prometeu e não cumpriu e pelo seu próprio estilo, é hoje o principal foco de instabilidade nas Forças Armadas, mas o cerne do problema não está só nos protagonistas, mas na política que protagonizam, na visão que têm das Forças Armadas, no entendimento que têm da Defesa Nacional. A realidade é que a situação se foi agravando, à medida que foi sendo instituído como primado a ideia de que capacidade para enviar militares para missões externas significava capacidade nacional de defesa. A vida prova não só que assim não é como prova que o prestigio de Portugal não se defende com uma política de submissão, mas antes através do potenciamento das capacidades e potencialidades nacionais nas suas diferentes vertentes – política, económica, diplomática, social, cultural e militar. É este conceito integrado e numa óptica nacional que tem vindo a ser trocado por outro que assenta numa lógica de que Portugal quando defende os interesses da NATO, dos EUA ou das potências Europeias, defende os seus próprios interesses.

O condenável apoio do Governo à guerra de ocupação do Iraque; a obsessão no envio de membros da GNR, com espectáculos televisivos para fazer passar a ideia de que tudo está bem, quando não está, desde logo o uso de membros de uma força de segurança numa missão tipicamente militar e depois pelas peripécias pouco dignificantes do aluguer dos blindados de infantaria a Berlusconi; as opções do Governo em matéria de reequipamento, tudo isto, insere-se numa lógica de condenável submissão ao poderoso complexo militar-industrial norte-americano, em confronto aberto com os interesses nacionais.

Como se pode aceitar que haja dinheiro para os blindados com vista ao Iraque e não haja para aquisição de meios para fazer face a calamidades como esta que Portugal está a viver?

O PCP reafirma a sua oposição a esta lógica e à política que a consubstancia.

O PCP alertando para um vasto conjunto de problemas que afectam as Forças Armadas e para os perigos do prosseguimento da actual política, reafirma aquela que tem sido a sua postura de sempre, de partindo da análise própria da situação, intervir visando a resolução dos problemas, a dignificação dos militares e a preservação do prestigio da Instituição.

O PCP reafirma que a reestruturação de que as Forças Armadas necessitam, tem de ser feita com os homens e mulheres que nelas prestam serviço e que desde logo essa reestruturação deve obedecer a uma outra política – uma política que assente numa estratégia de matriz nacional e que privilegie os meios nacionais para a efectivar, inverta a situação em que as Forças Armadas se encontram e potencie as capacidades nacionais de defesa.

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