Intervenção de Agostinho Lopes na Assembleia de República

Debate sobre a situação económica e social

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
A marcação deste debate pelo PSD, e o que se seguirá, a solicitação do CDS-PP, denuncia, mais uma vez, a enorme incomodidade, em período eleitoral, dos dois partidos perante o programa do FMI, do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia, que, com o PS, subscreveram.
É a continuação do esforço para se «afastarem» e desresponsabilizarem das graves consequências para o País, sabendo de ciência certa que o programa da tróica é, de facto, o programa eleitoral hoje e o programa do governo amanhã, se os portugueses lhes derem o seu voto. Esbracejam, multiplicam-se em declarações e pseudoconfrontos com o PS, o outro parceiro e responsável dos actos de ingerência e agressão cometidos contra Portugal.
Estes debates são uma tentativa de exibir, aos olhos dos portugueses, as suas pretensas preocupações com o brutal agravamento da situação, do crescimento do desemprego, da falência de centenas de empresas, do empobrecimento e crescimento de problemas sociais e até da sobranceria com que o sector financeiro e o grande capital se sentem à vontade para continuar a exploração dos trabalhadores e do povo.
Isso está bem patente na divulgação pelo Banco de Portugal do chamado Código de Conduta sobre a utilização de cláusulas que permitem a alteração unilateral da taxa de juro ou de outros encargos, que só pode significar abrir portas a um novo agravamento da situação de endividamento das famílias e empresas, quando o que se justificava era a adopção de medidas de apoio que lhes permitissem respirar; está patente ainda no caso da CIP, que, com a maior desfaçatez, anunciou não só a sua concordância com a repetida ingerência da Sr.ª Merkel, ainda e só Primeira-Ministra da Alemanha, na vida de um País independente e soberano, em matéria de período de férias e idade de reforma, como vem propor, para o próximo governo, a alteração do artigo 53.º da Constituição, onde se estabelece a garantia da «segurança do emprego» e a proibição dos «despedimentos sem justa causa».
É um fartar vilanagem!…
A recente decisão do ECOFIN não é um alívio nem põe fim a um processo que não tem qualquer
legitimidade política ou institucional. De facto, trata-se da aprovação do programa da tróica, que só tem um objectivo: reduzir ao mínimo os possíveis prejuízos dos nossos credores, dos responsáveis pela chantagem e agiotagem sobre a dívida pública portuguesa. Dar-lhes tempo para se libertarem de títulos de dívida do Estado português e fazerem a recuperação dos seus créditos, na base do «empréstimo» agora feito.
Aliás, com enorme cinismo e hipocrisia, a Declaração Política aprovada pelos Ministros das Finanças do euro e da União Europeia, afirma: «As autoridades portuguesas procurarão encorajar os investidores privados a manter a sua exposição à dívida portuguesa e…» — sublinho eu — «… numa base voluntária»! Isto é, o Governo português terá agora de convencer os bancos alemães, franceses, ingleses, holandeses a não se desfazerem dos títulos de dívida do Estado português — notável!
Espera-se que a diplomacia económica, tão defendida pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, entre rapidamente em acção junto dos ditos mercados, convencendo-os a não continuarem a especular…
De facto, trata-se de um programa de salvação dos bancos dos países do directório e, de caminho, de salvação da banca nacional. Se dúvidas houvesse, aí temos a já referida ilegítima intervenção do Banco de Portugal com o chamado Código de Conduta; aí temos as notícias de, para já, três bancos a pedirem o aval da Estado.
É importante lembrar o facto de que, nos últimos quatro anos, os accionistas, na maioria estrangeiros, dos quatro maiores bancos privados receberam mais de 4,5 mil milhões de euros em dividendos, dinheiro que deviam usar na recapitalização dos respectivos bancos, em vez de beneficiarem das verbas que o Estado e os portugueses virão a pagar.
Como o PCP vem afirmando, é necessária uma outra abordagem e solução para os problemas da dívida externa portuguesa, a renegociação da dívida, integrada numa política global de resposta aos problemas do País, onde a valorização do aparelho produtivo, a criação de emprego e a valorização do trabalho são peças nucleares. Afirmamos que só a renegociação da dívida é resposta para a dramática situação a que a política de direita do PS, do PSD e do CDS conduziram o País. Renegociar já e não quando estiver mais degradada a situação económica, financeira e social do Estado — o exemplo da Grécia devia ser um enorme aviso!
Renegociação dos prazos, dos montantes e das taxas de juro são propostas que apresentaremos logo no início dos trabalhos da próxima Assembleia da República.

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