Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Debate sobre a produção nacional

Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:
O agendamento pelo PCP deste debate sobre a produção nacional tinha, na altura em que foi pedido, toda a relevância e redobrou de importância com a situação política que hoje estamos a viver, porque se este é um debate que permite deixar clara a responsabilidade de vários governos anteriores do PS, do PSD e do CDS em matéria de destruição da capacidade produtiva nacional, de entrega dos nossos interesses na União Europeia subjugados a outros interesses que têm sido dominantes, de destruição das condições de trabalho dos agricultores, dos pescadores, dos micro e pequenos empresários, que são a «seiva» da nossa economia, se é verdade que este debate permitiu fazer esta responsabilização, também permitiu demonstrar que, ao contrário do que diz o Sr. Primeiro-Ministro, há uma política alternativa para este País, há uma política alternativa que nos ajuda a sair da crise.
Ela não é a política que tanto o PS quanto o PSD e o CDS defendem, em que o défice vem antes do crescimento económico e do combate ao desemprego; ela não é a política em que a submissão aos ditames da Sr.ª Merkel vem antes da prioridade à produção nacional e ao aumento da produção nacional; ela não é a política em que os interesses do sector financeiro e dos grandes grupos económicos se sobrepõem sempre àqueles que estão na economia produtiva, àqueles que lutam por o País ser mais produtivo. A política alternativa é aquela que põe à cabeça das necessidades do País a produção nacional, o aumento da produção nacional como mecanismo para criar riqueza, para criar emprego, para diminuir a dependência externa e, no final, também, para combater a dívida externa, o endividamento, e pôr em ordem as contas públicas.
Nós não aceitamos que se continue a degradar a vida dos portugueses, que se continue a degradar a situação da nossa economia para cumprir metas irrealistas que nada têm a ver com a nossa situação. O que dizemos é que as contas públicas e a correcção da dívida têm de ser feitas à base do crescimento económico, da criação de mais riqueza e da sua boa distribuição. O caminho que o PEC, que rejeitámos aqui conscientemente na quarta-feira, nos trazia era o caminho da continuidade desta política.
Naquele PEC não havia qualquer referência à necessidade de produzir mais no nosso País. E é natural que assim fosse, porque em toda a política do Governo do PS não houve, nunca, nenhuma prioridade, nenhuma preocupação com o aumento da produção nacional e a recuperação da nossa capacidade nessa área.
Há, portanto, alternativa. E não venham dizer-nos, com aqueles elogios fingidos que algumas bancadas aqui nos fazem, que até somos coerentes, querendo dizer que somos coerentes mas não temos razão. Não, Srs. Deputados! Nós somos coerentes porque tínhamos razão quando dissemos que esta política europeia e esta política nacional iam destruir a economia do País, e temos razão agora, porque se comprova que foi, de facto, assim e que a única saída é inverter essa política, é romper com esse caminho.
Finalmente, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, quero dizer que é uma vergonha que a falta de política deste Governo para o aumento da produção nacional ainda seja agravada, como bem dizem, e com razão, os pescadores, lá fora, com este Código Contributivo, que vai penalizá-los sem ver qual é a sua real situação. Nós somos a favor da justiça contributiva e de boas reformas, Sr. Secretário de Estado, mas não somos a favor de uma espécie de tributação que vai destruir muitos factores de produção, como acontece com os pescadores, e que tributa erradamente aquilo que não deve ser tributado daquela forma.
Ainda sobre a questão dos serviços públicos, diz o PS que, a partir da crise, vão degradar-se os serviços públicos, vão aumentar os juros da dívida. Não sei onde é que o Sr. Deputado Miguel Freitas tem andado nos últimos meses, não sei se o Sr. Deputado sabe o que aconteceu aos serviços florestais com a política do Governo do PS. Vem agora falar-nos da degradação dos serviços públicos?!
Foi o que os senhores fizeram todos estes anos e que querem continuar a fazer, com o apoio do PSD.
Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que este País não vai para a frente quando temos governantes que aceitam, em Bruxelas, tudo o que lhes impõem ou candidatos a governantes que, num dia, aqui, rejeitam uma coisa e, no dia seguinte, vão a Bruxelas aceitar o mesmo que antes rejeitaram.
Não aceitamos essa hipocrisia e sabemos que os portugueses vão discernir bem quem são aqueles que querem continuar o mesmo caminho, fingindo que querem uma coisa diferente, e quem são aqueles que, como o PCP, querem, de facto, outro caminho, porque essa é a única alternativa para o progresso do nosso País.
(…)
Sr.ª Presidente,
Não vou utilizar aquela palavra que o Governo não gosta para qualificar a intervenção do Sr. Ministro, mas queria dizer que, ao contrário do desejo e do que disse o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a expressão do meu camarada Jerónimo de Sousa foi a de que «com a continuação desta política de direita ficamos num beco sem saída», e não o disse em relação à crise política.
Percebo que o desespero é grande, mas é preciso ter um bocadinho de respeito pela verdade.

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