Intervenção de Paulo Sá na Assembleia de República

Debate de urgência sobre o incumprimento da Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro — Remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos públicos

Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Queria começar por saudar o Partido Ecologista «Os Verdes» por trazer este importante assunto novamente a debate na Assembleia da República.
Há várias dezenas de anos que se conhecem os efeitos nocivos da inalação e da exposição ao amianto, que provoca doenças graves, entre as quais o cancro de pulmão. Foram, por isso, adotadas medidas cada vez mais restritivas para o uso de amianto na legislação europeia e na legislação portuguesa nos últimos anos e a investigação científica mostra claramente que todas as fibras de amianto são cancerígenas, qualquer que seja o seu tipo ou origem geológica.
Este próprio facto encontra-se transcrito no Decreto-Lei n.º 266/2007, de 24 de julho.
Como já foi referido, em Março de 2003, ou seja, há nove anos, a Assembleia da República adotou uma resolução — a Resolução n.º 24/2003 — que recomendava ao governo a inventariação de todos os edifícios públicos que contivessem na sua construção amianto, dando um prazo de um ano para se fazer esta inventariação.
Passaram nove anos!
Nestes nove anos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, em todo o mundo, morreram cerca de 1 milhão de pessoas vítimas de doenças provocadas pela exposição ao amianto. Em Portugal, este número, nos últimos nove anos, foi superior a 1000 pessoas, com certeza.
Sucessivos governos, do PS, do PSD e do CDS — com Durão Barroso, Santana Lopes e José Sócrates —, nada fizeram durante estes nove anos para implementar esta recomendação da Assembleia da República.
Todos têm aqui culpas: PS, PSD e CDS.
Mais recentemente, com a Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro, a Assembleia da República determinava que o governo devia proceder ao levantamento, mais uma vez, de todos os edifícios públicos, instalações e equipamentos que contivessem amianto na sua construção. E, mais uma vez, se dava o prazo de um ano para o fazer.
O que é que os governos, o anterior (que esteve em funções durante alguns meses) e o atual, fizeram relativamente a esta questão? O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território começou a sua intervenção dizendo que reconhece a importância indiscutível desta matéria e a sua relevância. Reconhece, mas nada fez durante estes oito meses em que esteve no Governo!
Diz o Sr. Secretário de Estado que a lei é omissa. Mas não é! A lei é muito clara: determina que o Governo proceda ao levantamento. Não diz quem no Governo e, aparentemente, os senhores estiveram durante estes oito, nove meses à espera que alguém lhes dissesse quem no Governo vai fazer este levantamento.
Os senhores não se reúnem de vez em quando? Não trocam impressões, sabendo que tinham uma lei para cumprirem num ano, que é um prazo curto? Não se podiam ter reunido e atribuído estas tarefas?
O Sr. Secretário de Estado veio aqui dizer não o que fez, porque não fez nada, mas o que não fez: disse que não fez o levantamento exaustivo dos edifícios, que não publicou a listagem, que não fez a monitorização, que não estabeleceu o plano de calendarização de remoção. Não fez nada, Sr. Secretário de Estado!
O Governo, nestes meses em que esteve em funções, não fez nada, apenas veio aqui dizer o que irá fazer no futuro. E o PSD, na sua intervenção, congratulou-se e assumiu o compromisso de que o Governo vai cumprir a lei. Obrigadinho, Sr. Deputado, por vir dizer que o Governo vai cumprir a lei! Ficamos satisfeitos.
O que nós exigimos, Sr. Secretário de Estado, é que nos diga concretamente o que vai fazer, e não dessa forma vaga. Diga, concretamente, quais são os prazos, qual é a calendarização, quando vamos ter resultados. Caso contrário, daqui a um, dois, três anos, estaremos aqui novamente, com o Sr. Secretário de Estado a anunciar que os membros do Governo ainda não conseguiram decidir quem tem a competência para fazer este trabalho!
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo:
Estamos perante um problema de saúde pública grave e que já se encontra na nossa legislação.
Em relação ao Decreto-Lei n.º 266/2007, vou ler apenas algumas frases. O amianto constitui «um dos principais desafios para a saúde pública ao nível mundial»; «todas as fibras de amianto são cancerígenas, qualquer que seja o seu tipo ou origem geológica»; «não se conhecem valores limite de exposição abaixo dos quais não haja riscos cancerígenos»; a exposição deve ser «reduzida ao mínimo e, em qualquer caso, não seja superior ao valor limite de exposição»; deve proceder-se «regularmente à medição da concentração das fibras de amianto».
Existem, no País, centenas de milhares de hectares de coberturas de fibrocimento com amianto, bem como um número similar de pessoas expostas à inalação do amianto, e nada do que se encontra na legislação é cumprido.
Sabemos que as doenças provocadas pela inalação e exposição ao amianto não se revelam imediatamente, podendo demorar dezenas de anos. Portanto, temos aqui um perigo potencial de saúde pública.
O que fez o Governo? Já reconheceu aqui, bem como o PSD e PSD/CDS, que estiveram nos governos nos últimos anos, que pouco ou nada se fez. E porquê, Sr. Secretário de Estado? Vou dizer-lhe: porque esta medida não está no pacto de agressão da troica.
Se estivesse, já tinha sido feita. Era logo na primeira ou na segunda semanas. Mas este é um problema de saúde pública e não uma prioridade do pacto de agressão, a que os senhores gostam de chamar «Memorando de Entendimento», de forma carinhosa. Não está no pacto de agressão, logo, não é uma prioridade, pode ser feito depois. É apenas um problema de saúde pública.
A vossa prioridade, neste momento, é continuar esta gigantesca tarefa de transferência de rendimento do trabalho para o capital, reduzir salários e pensões, reduzir as funções do Estado, eliminar direitos laborais, reconfigurar o Estado colocando-o ao serviço de interesses do grande capital. Esta é a vossa prioridade neste momento e não a eliminação do amianto dos edifícios públicos, porque, se estivesse no pacto de agressão, já tinha sido feita há muito tempo.
Sr. Secretário de Estado, dispõe ainda de 15 minutos para intervir, de 10 minutos nesta ronda e de 5 minutos no encerramento do debate e nós gostávamos que não saísse daqui sem concretizar o que vai fazer. Já disse, genericamente, as suas boas intenções. O PSD reafirmou, por duas vezes, que o Governo está empenhado em cumprir a lei, mas queremos mais que isso. Queremos que o Sr. Secretário de Estado, antes de sair daqui, nos diga prazos, prazos concretos, para proceder ao levantamento de todos os edifícios, instalações e equipamentos públicos. Quando estará terminada esta tarefa, Sr. Secretário de Estado?
Elaborar as listagens e torná-las públicas, Sr. Secretário de Estado, quando prevê que isto vai estar concluído?
Identificar todos os edifícios que devem ser submetidos a monitorização permanente e aqueles em que deve haver ações de remoção do amianto, quando, Sr. Secretário de Estado, é que isto estará concluído?
Estabelecer um plano calendarizado de monitorização e remoção, com o estabelecimento de prioridades, quando, Sr. Secretário de Estado?
Não deixemos isto para as calendas gregas.
Que o Sr. Secretário de Estado não saia daqui hoje sem nos dizer quais as datas que o Governo prevê para cumprir a legislação, de forma a sabermos, concretamente, o que vai ser feito e quando. Não chega aos portugueses, perante um problema tão grave de saúde pública, que o Sr. Secretário de Estado apenas diga que tem boas intenções e que vai fazer não se sabe quando.

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