Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Debate da interpelação centrada nas consequências do pacto de agressão na vida dos portugueses — a grave crise económica em que se traduz a aplicação do «memorando de entendimento

(interpelação n.º 3/XII/1.ª)
Sr.ª Presidente,
Sr. Ministro,
Na primeira das seis perguntas a que o Sr. Ministro vai responder, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que, à parte o habitual abraço ao Partido Socialista e as vacuidades da sua intervenção, o senhor disse, de facto, uma coisa de concreto, ao referir que a avaliação feita da aplicação do programa foi, segundo as suas palavras, «extremamente positiva».
Ora, é precisamente por isso que fazemos esta interpelação, para mostrar aos Srs. Membros do Governo e aos Srs. Deputados da maioria que, quanto mais positiva é a aplicação do pacto de agressão, mais negativa é a vida dos portugueses, mais negativo é o futuro do País.
Esse seu sucesso, Sr. Ministro, está hoje bem à vista na questão da execução orçamental: a receita fiscal diminui, apesar da carga fiscal aumentar, prenunciando o agravamento da recessão; os cortes na despesa (nos salários, nas reformas, no Serviço Nacional de Saúde, nas escolas, nas bolsas de estudo) não chegam para cobrir o aumento dos juros pagos à banca e ao setor financeiro. Este é que é o sucesso da aplicação do vosso pacto de agressão.
Mas esta interpelação é para mostrar factos, Sr. Ministro.
Quero falar-lhe de um facto de que tive conhecimento há alguns meses: uma junta de freguesia do distrito de Setúbal fez um concurso junto das suas escolas primárias para que as crianças escolhessem a frase que deveria constar dos cartões de boas-festas, desejando um bom ano para 2012. Sabe qual foi a frase escolhida? Uma frase em que as crianças diziam: «Comida para todos em 2012». Este era o desejo das crianças dessa freguesia.
Ao mesmo tempo, porque a estatística vem sempre depois da realidade, o INE já divulgou que, pela primeira vez desde que existe esta estatística, diminuiu o consumo de bens alimentares pelas famílias portuguesas.
Esta é que é a aplicação do pacto de agressão que os senhores consideram extremamente positivo. O mesmo pacto que mantém 400 000 trabalhadores com o salário mínimo, sem o aumento que lhes é devido, estando esses trabalhadores a ganhar abaixo do limiar de pobreza definido estatisticamente — trabalham e empobrecem, ao mesmo tempo.
O mesmo sucesso, para os senhores, para o seu Governo, que leva a que 100 000 trabalhadores tenham os seus salários penhorados e 150 000 famílias não consigam pagar a prestação da sua casa.
Este é o sucesso da sua política, da política do seu Governo. É o sucesso daquela universidade que, para ajudar os estudantes a poderem comer, resolveu diminuir em 50 cêntimos o preço da refeição na cantina; só que, para isso, retirou a sopa, o pão, a sobremesa e a bebida, restringindo a refeição ao prato principal.
Este é que é o sucesso da vossa política e do vosso pacto de agressão!
É o sucesso das pessoas que não têm transporte para ir às consultas e aos tratamentos, é o sucesso das pessoas que não vão à urgência porque não podem pagar a taxa moderadora e que estão na lista de espera para as cirurgias e para as consultas.
Sr. Ministro, os senhores não querem a mudança, os senhores querem é que fique tudo na mesma: sempre para o lado dos mesmos a riqueza e sempre para o lado dos mesmos os sacrifícios.
A mudança, Sr. Ministro, não está do lado do Governo e do vosso pacto de agressão, está do lado de quem o quer derrotar, como esta bancada quer e vai conseguir!

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