Intervenção de

Debate com o Primeiro-Ministro sobre economia

 

Debate com o Primeiro-Ministro sobre economia

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

O seu plano anti-crise não responde aos problemas do País nem responde à crise.

Há pouco mais de um mês, precisamente num debate idêntico, apontou o dedo acusador a esta bancada quando dissemos claramente que as medidas eram insuficientes.

Vem agora com «mais qualquer coisinha» - usando uma expressão que utilizou, há pouco, em relação ao PSD na questão do crédito para as micro e pequenas empresas.

Sr. Primeiro-Ministro,

Estamos a falar de 12 500 empresas num universo de 1,05 milhões de empresas em termos nacionais.

É verdade! É verdade! No universo das micro, pequenas e médias empresas!

Mas, em relação a esta questão do crédito, estes 600 milhões que atribuiu, até por razões de comparação, fazem-me levantar já uma primeira questão: em relação ao BPN, é verdade aquilo que foi aqui dito que a Caixa Geral de Depósitos já lá «enterrou» 1800 milhões de euros?

Mas temos aqui um problema sobre o qual gostaria de ouvir o Sr. Primeiro-Ministro. É que essas empresas que não podem recorrer ao crédito do Invest III estão a recorrer ao crédito da banca.

E com o que é que se deparam?

Há, de facto, um abaixamento das taxas de juro, mas o problema é que a banca está, num autêntico negócio, a utilizar o spread e as comissões em relação ao capital de risco, aplicando juros de 12%, 13% e 14% para a maioria das empresas.

Ora, assim, não há possibilidade, Sr. Primeiro-Ministro, de essas empresas resolverem os seus problemas!

Nesse sentido, pergunto se tem validade ou não a nossa proposta de a Caixa Geral de Depósitos ser um instrumento fundamental para acesso ao crédito e aos seguros de crédito.

Por outro lado, que medidas administrativas vai tomar para impedir que a banca também transforme isto numa área de negócio, levando ao sufoco milhares e milhares de pequenas empresas?

É que, se não fizer - e por isso tenho este número na cabeça em relação ao BPN -, isto leva-me quase a recorrer a um dos nossos clássicos, ao nosso Almeida Garrett, quando, numa sua obra (e ele também andou aqui por estas bancadas), colocava a questão de saber quantos pobres era preciso haver para criar um rico.

E eu pergunto-lhe: quantos encerramentos, quantos despedimentos colectivos ou individuais nas pequenas e médias empresas é preciso fazer para salvar um banco e um punhado de banqueiros?!

(...)

Sr. Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

Alguém está enganado! Ou é o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro das Finanças ou é o INE, que divulgou os resultados preliminares das estatísticas das empresas, onde refere que o tecido empresarial português é composto por cerca de 1,1 milhões de empresas.

Se o INE está enganado, olhe, peço desculpa ou, então, é o Sr. Primeiro-Ministro que tem de pedir desculpa ao INE.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, continua a manter-se uma questão em relação a esse uso que o Governo deu de pôr a banca a servir de intermediário no acesso ao crédito das micro e pequenas empresas.

Era ou não importante definir um plafond que possibilitasse às pequenas e médias empresas terem acesso a esse crédito?

Por isso é um escândalo, quando se trata de juros de 12%, 13% e 14%, porque quem está com «a

corda na garganta» não pode ter acesso ao crédito, pois endividadas já essas empresas estão! Como é que se pode, assim, garantir o emprego?!

Quanto à questão do BPN, Sr. Primeiro-Ministro, vamos lá falar claro, porque está sempre a falar dos interesses dos depositantes, das famílias... Então, não havia um crédito mínimo de 100 000 € para os depositantes?! Não havia?! Foi confusão minha?!

Ou, se quiser, de 80 000, porque 100 000 era em Espanha?!

Então não havia este número base!?

Não foi nada para salvar o Banco e os seus principais accionistas?

Que valor é este, Sr. Primeiro-Ministro?!

1800 milhões de euros para uma situação onde se trata, de facto, de uma questão de polícia, uma questão de justiça!

É estranho que seja tão aberto e tão liberal em relação a isso e não apresente aqui uma medida concreta que estimule e que anime as micro e as pequenas empresas. Sr. Primeiro-Ministro, o Governo não está, de facto, a tomar medidas para impedir a recessão e a intervir para impedir os despedimentos.

A verdade é que o desemprego está a crescer em cada dia que passa e esta crise, ainda em desenvolvimento, é profundamente inquietante.

A questão que lhe quero colocar, tendo em conta o tempo, é uma questão que considero fundamental: são muitos os despedimentos, mas há empresas que receberam fundos colossais, apoios, benefícios e isenções do Estado português, de instituições e também, designadamente, de autarquias e que hoje «levantam a tenda», encerram e aproveitam para despedir.

Mesmo o homem mais rico de Portugal, só porque existe uma quebra de lucros, encontra como caminho o despedimento!

Ora, eu tenho uma profunda inquietação em relação a esta matéria, em relação a casos como o da Saint-Gobain Glass, que o Estado vai apoiar com 50 milhões de euros para construção de um novo forno de vidro, da Renault, de Cacia, e, agora, da Ecco e de outras. E também tivemos agora a notícia da Continental Mabor.

Sr. Primeiro-Ministro, o que pensa o Governo fazer sobre isto?

É um escândalo que aqueles que encheram os bolsos com benefícios, com privilégios, com fundos comunitários, com fundos do Estado português, à primeira dificuldade, encerrem empresas, fechem, despeçam colectivamente, de uma forma arbitrária, sem que o Governo exija os compromissos assumidos por essas mesmas empresas em relação a Portugal e aos seus próprios trabalhadores.

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