Intervenção

Debate com o Primeiro-Ministro - Intervenção de Jerónimo de Sousa na AR

Debate com o Primeiro-Ministro

 

 

 

Sr. Presidente,

Voltemos ao assunto que nos trouxe aqui hoje.

Sr. Primeiro-Ministro,

Diz-se que podem enganar-se as pessoas por pouco tempo, que podem enganar-se as pessoas por muito tempo, mas que não podem enganar-se as pessoas pelo tempo todo!

Na celebração dos três anos de Governo do PS, descontado o auto-elogio (que não lhe fica bem), foi apresentado um País no bom caminho, um País que vai bem, um País das maravilhas, tendo o Sr. Primeiro-Ministro apontado o dedo a quem não cala as injustiças, a quem considera que Portugal é hoje um país marcado pelas desigualdades, um país menos seguro, mais injusto, menos democrático.

Ao apontar o dedo aos «profetas», o Sr. Ministro teve azar. É que dois dias depois três «profetas» analíticos insuspeitos - o Banco de Portugal, a Comissão Europeia e o INE - vieram demonstrar que esse país que está na cabeça de V. Ex.ª não existe.

Nesse sentido, quando os relatórios provam que há mais pobreza infantil, como é o caso do relatório de 2004 da Comissão Europeia, e mais desemprego, como é o caso INE, apesar da manipulação estatística que a bancada do PS tentou fazer, a verdade é que a taxa real, repito, real, do desemprego atingiu os 10,5% em 2007. São dados do INE, do insuspeito INE!

Por outro lado, Sr. Primeiro-Ministro, chamo a atenção para a situação em que se encontra o País no plano económico. Esses relatórios comparativos do Banco de Portugal demonstram que, no início deste ano, há menos exportações, menos consumo interno e começa a haver dificuldades e arrefecimento da própria economia. Não sou eu que digo! Posso demonstrar-lhe por aquilo que foi escrito e dito.

A questão de fundo que queria colocar é esta: que País real temos?

Aquele que o Sr. Primeiro-Ministro descreve ou aquele que nós acentuamos, particularmente, no plano das injustiças e das desigualdades?

E eu não referi um elemento brutal que demonstra que o Sr. Primeiro-Ministro não tem razão: a análise comparativa dos lucros obscenos, escandalosos, do sector financeiro, dos grupos económicos, que contradizem a sua tese dos sacrifícios para todos.

Isto demonstra que, afinal, este país está mais desigual devido a uma política injusta realizada pelo seu Governo. Diga lá, Sr. Primeiro-Ministro.

(...)

Sr. Presidente,

Estamos perante um Sr. Primeiro-Ministro satisfeitíssimo, porque conseguiu qualquer coisa como 0,1%, em termos estatísticos, de diminuição das desigualdades!

Quero colocar-lhe uma segunda questão: sabe porque é que não vão diminuir as desigualdades? Porque nós temos realidades inevitáveis e incontornáveis, como a subida do desemprego, os baixos salários, a precariedade no trabalho, a elevada taxa de abandono escolar, as baixas prestações sociais. Por muito que o senhor «torture» a estatística, com esta política, quer queira quer não, inevitavelmente, essa situação vai aumentar.

Uma outra questão, Sr. Primeiro-Ministro: este Governo tem particulares responsabilidades na criação de um novo paradigma na sociedade portuguesa. Hoje, são muitos os portugueses, particularmente os trabalhadores, aqueles que vivem dos pequenos rendimentos, que, mais do que morrer, têm medo de envelhecer. E têm medo de envelhecer tendo em conta os baixos salários, as baixas pensões e reformas, a falta de apoio social e de uma rede de serviços sociais que possam garantir uma velhice sossegada. E isto é mais um elemento acusatório desta política.

Por último, Sr. Primeiro-Ministro, porque o tempo é implacável, gostaria de lhe colocar algumas questões de grande actualidade, que têm a ver com a educação.

Primeira questão: praticamente todos os professores estão contra os que vão avaliar e os que vão ser avaliados. Quanto à sua afirmação arrogante de que não muda nem um milímetro, fique a saber uma coisa, Sr. Primeiro-Ministro: não é a autoridade que dá o saber, é o saber que dá a autoridade. E o senhor, nessa posição arrogante, autoritária, com certeza que vai aplicar a concepção, como dizia o poeta, de que, quando o povo não está de acordo com o governo, mude-se o povo, porque o governo não muda. Creio que esta é uma questão que está colocada, tendo em conta a sua arrogância. Mas como é possível manter um modelo que todos rejeitam? Como é possível isto, Sr. Primeiro-Ministro? Acha que vai resultar?

Segunda questão: o problema da gestão nas escolas, feita contra os professores, contra a autonomia das escolas, e com o regresso do velho director. Os senhores são responsáveis por levar à liquidação da gestão democrática das escolas. E não venha com o papão, como quando fez a acusação ao PSD, de que vê comunistas em tudo o que é sítio e em tudo o que é luta. Não procure muito, pois convidamo-lo para amanhã, sábado, vir ver que, de facto, somos muitos.

Muito obrigado pelo que disse, porque estar na luta dos trabalhadores e das populações só nos honra. Que falta faz lá o PS, tendo em conta os seus compromissos eleitorais e a base que o levou a ter uma maioria absoluta!

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