Intervenção de

Debate com o Ministro do Ambiente

 

Debate com o Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional

Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Ambiente,

Deixe-me dizer-lhe que, passados estes 4 anos, há uma tónica que sobressai do seu mandato: de facto, a este Ministério do Ambiente também se poderia chamar «comissão de negócios no ambiente».

Este Governo tem tido a capacidade de ver, em toda a sua intervenção na área do ambiente, um negócio: negócio no ordenamento do território; negócio na conservação da natureza e da biodiversidade; negócio na venda à peça do território português para as actividades privadas, nomeadamente turísticas, agora com grande ênfase para a agricultura de organismos geneticamente modificados, e por aí fora.

Quero deixar-lhe três ou quatro questões sobre negócios que este Governo promove na natureza, com prejuízo para as populações, objectivamente.

O Sr. Ministro vai insistir na linha que tem vindo a demonstrar em torno do plano de ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina? É mais fácil construir um campo de golfe e um hotel de luxo do que alterar a chaminé de uma casa numa povoação ou construir a casa da bomba da água. É mais fácil construir um empreendimento de luxo porque aquele plano de ordenamento, a certa altura, diz - pasme-se! - que o loteamento nas áreas de protecção é proibido desde que não seja para fins turísticos; se for para fins turísticos, já é permitido! Não é o impacto na natureza que está em causa, é a natureza do empreendimento, é a natureza do investimento. São os pequenos PIN a proliferar pelo País, à custa de um Governo que vai legislando no sentido de vender à peça o território português, retirando as populações do seu seio para colocar lá outros interesses.

Sr. Ministro, quanto à taxa de recursos hídricos, pergunto-lhe porque é que um aquicultor paga o volume de água da maré, paga a variação da maré? Porque é que paga a água que entra e a que sai, da maré?

É no mínimo ridículo que um aquicultor tenha de pagar tudo o passa na sua porta de água, incluindo aquelas que são as movimentações naturais das marés - a maré cheia e maré baixa. Sr. Ministro, sobre o negócio nos transgénicos, pergunto-lhe se vai intervir neste processo que está agora em consulta pública da utilização de terrenos públicos, inclusivamente, para a realização de testes com organismos geneticamente modificados, não testados, sem garantias de segurança?

Aquilo que pedimos ao Estado português e a este Governo já não é que seja contra os organismos geneticamente modificados, já não é que se oponha firmemente, mas que tenha uma posição equidistante e que, no mínimo, não ceda o terreno nacional e os terrenos públicos para que as empresas possam danificá-los, introduzindo organismos geneticamente modificados e contaminando a agricultura portuguesa.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Ministro,

Chega de dizer que não avança com a privatização da água e que aquele abaixo-assinado é inócuo, que não terá efeitos tendo em conta a não privatização.

Sr. Ministro, basta olhar à nossa volta para ver que, praticamente, todos os serviços da água estão privatizados.

Nas palavras deste Ministério, estão concessionados! Inclusivamente, até as barragens, à luz da sua nova lei da água, podem ser privatizadas... Não, digamos melhor: «concessionadas» a 90 anos, que é bastante diferente de privatizadas!

Sr. Ministro, está à vista! Além disso, o que aquele abaixo-assinado reivindica - já tive oportunidade de receber aqui os seus signatários - e que, pelos vistos, o Sr. Ministro apelida de ridículo, é a gestão pública da água, algo que hoje está a ser feito por empresas e que este Ministério está a colocar cada vez mais na mão de empresas, como já fez com a Aquapor e como fará com toda a empresa Águas de Portugal, no futuro, como bem sabemos, porque isso já foi assumido, Sr. Ministro - isso já foi assumido e não vale a pena tentar esconder.

Sr. Ministro, quanto aos negócios da natureza, iríamos ter aqui, certamente, uma conversa muito longa. É que não basta criar um plano de ordenamento se o que esse plano diz que é tudo permitido menos viver ali. Desde que seja para jogar golfe, para receber os ricos dos outros países durante um mês do nosso calendário e que as pessoas não estejam lá, tudo é possível.

Se for para ir à pesca numa enseada, para praticar os nossos hábitos tradicionais, é melhor irmos embora, ali não deve viver ninguém para que aquele local seja um resort de elevadíssima qualidade - qualidade para os outros, não é, certamente, para os portugueses que habitam nessas zonas.

Sr. Ministro, quanto à RAN (Reserva Agrícola Nacional) e à Rede Natura 2000, saiu um novo decreto-lei que estabelece o regime jurídico da RAN e que exclui da RAN todos os solos que estejam contidos em perímetros urbanos previstos nos PDM. Sr. Ministro, isto significa que há terrenos de elevado valor, incluindo solos de primeira, que vão ser excluídos da RAN. Portanto, ficarão à mercê da construção, do ordenamento do território baseado exclusivamente na perspectiva urbana.

Sr. Ministro, o que pensa acerca desta situação?

Sr. Ministro, além destas fichas de sítios da Rede Natura, que são bastante interessantes, quando poderemos contar com a identificação dos locais onde se encontram estes valores? É que convinha saber onde é que estão os valores na Rede Natura 2000. Onde está a cartografia, Sr. Ministro?!

Vá ao terreno procurar onde estão estes valores! É muito bonito publicar relatórios como este Relatório e Fichas de Sítios da Lista Nacional desde que não se saiba onde estão os valores e onde temos de os proteger.

É muito curioso! Certamente, serve de propaganda para este Ministério.

(...)

Sr. Presidente,

Gostaria apenas de referir que os documentos que tenho e que mostrei a toda a Câmara contêm a resolução do Conselho de Ministros mas são os relatórios e as fichas de sítios. Ora, a questão que foi colocada é pertinente.

Onde está a cartografia para sabermos onde encontrar estes valores? De facto, é um trabalho meritório e muito importante, mas sem a cartografia tem validade «zero».

Sr. Ministro, relativamente àquilo a que não chama relatório, devia ter mais cuidado com o que escreve na capa, ou seja, Relatório e Fichas de Sítios da Lista Nacional.

(...)

Sr. Presidente,

É para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos, porque julgo que não podem decorrer com normalidade se continuarem estas informações falsas por parte do Ministério. Não vou pedir que seja distribuído um documento porque todos o temos ao dispor com estas novas tecnologias. Assim, aos Srs. Deputados que estiverem interessados peço que verifiquem a representação cartográfica do Plano Sectorial para a Rede Natura 2000, no site do ICNB. Certamente não encontrarão e, em termos de cartografia, o que encontrarão é a referência a uma escala de 1:100 000, que é tal que torna este Plano absolutamente inútil. Portanto, é de facto meritório que se produzam estes «calhamaços», mas são absolutamente inúteis sem essa cartografia.

O Sr. Ministro acabou de dizer que já existe tal cartografia mas não é verdade. A cartografia não está feita, não existe e não está no site do ICNB, como todos podemos comprovar facilmente.

(...)

Sr. Presidente,

Quero apenas referir que, obviamente, fui consultar o site referido...

O Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado sabem perfeitamente do que é que estávamos a falar. E também sabem que as pessoas que estão por dentro da área do ordenamento do território sabem do que estamos a falar. E tentaram iludir, tentaram dizer que, afinal, há uma cartografia...

A questão que foi colocada é muito simples: onde está a nova cartografia do Plano Sectorial da Rede Natura 2000, que é necessária, de acordo com próprio plano? E o Sr. Ministro respondeu: «Já está no site.» Mas não está no site.

Afinal, o que está no site para o qual o Sr. Secretário de Estado nos remeteu é a discussão pública - veja-se bem! -, que cessou a 10 de Março de 2006 - não foi a 10 de Março de 2009! - e são os documentos que serviram de base à discussão pública, de Março de 2006.

Portanto, a nova cartografia, confirma-se, não está na Net por uma questão muito simples: não está feita.

Aliás, era bom que o Governo reconhecesse que não existe a cartografia necessária para fazer cumprir o que está estabelecido no Plano Sectorial da Rede Natura 2000.

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