Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

De mentira e propaganda está o nosso país farto

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O PCP confrontou o Primeiro-Ministro com a degradação das condições de vida dos trabalhadores e do povo, com os lucros escandalosos que o grande capital continua a realizar. Jerónimo de Sousa classificou como "colapso da mentira e da propaganda" as sucessivas medidas que vão sendo tomadas contrariando tudo o que o governo prometeu.
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Debate com o Primeiro-Ministro que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
O Sr. Deputado Nuno Magalhães fez aqui um registo que também gostaria de sublinhar, um ano depois da assinatura do pacto de agressão. Hoje, temos um País mais desigual, mais injusto, mais pobre, mais dependente, mais endividado. Esta é que é a realidade que não pode ser escondida, como tem acontecido.
Mas, sendo esta a realidade e sem um fim à vista para sairmos desta situação, atualizemos aqui a nossa intervenção.
Lembro-me de um poeta, António Aleixo, que dizia: «Para a mentira ser segura e atingir profundidade, tem de trazer à mistura algum fundo de verdade». Creio que bem poderíamos encontrar neste verso aquilo que o Governo tem andado a fazer e a dizer.
A partir do lapso anunciado pelo Ministro das Finanças sobre o tempo dos cortes, de usurpação dos subsídios de férias e de Natal, a que se seguiu o anúncio de novos cortes nos apoios sociais, na proibição das reformas antecipadas, na escalada insuportável do aumento dos combustíveis, na nova subida do desemprego, no aumento da insolvência das pessoas individuais e coletivas, criou-se um sentimento profundo de indignação. Isso é que levou as bancadas da direita a virem ajudar o Governo, porque conhecem esse sentimento geral de indignação por parte dos portugueses.
Mas os senhores têm consciência que a operação das inevitabilidades, da resignação, essa propaganda sofreu um rude golpe, porque, de facto, os portugueses estão a ver que há muita conversa, há sempre a referência do amanhã que nunca chega, com a sua vida a piorar.
Por isso, considero que não foi um lapso do Sr. Ministro das Finanças; foi, diria, um colapso da mentira e da propaganda.
Os senhores podem referir que não são novas medidas adicionais, mas, então, vamos precisar a coisa: é um tempo adicional à medida adicional de saque dos subsídios. Não acha, Sr. Primeiro-Ministro?
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Por que é que tem sempre uma referência em relação à questão do povo português, e nunca tem uma referência, encarando a possibilidade de, por exemplo, ir buscar aos lucros fabulosos dos acionistas dessas empresas?!
Quero aqui lembrar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que, desde a liberalização do preço dos combustíveis, em que era, então, Primeiro-Ministro Santana Lopes e Ministro de Estado Paulo Portas, a Galp mais do que quintuplicou os seus lucros anuais, ou seja, desde 2004, teve 1168 milhões de euros de lucro.
Então, no momento em que a nossa economia, particularmente as pequenas e médias empresas, nomeadamente no plano do mercado interno, tanto precisam que os custos dos fatores de produção baixem, os senhores não encaram uma medida que seja que vá ao encontro daquilo que, enquanto oposição, afirmavam?! Quer que lhe cite? Diziam: «não vale a pena o Estado dizer que não podemos fazer nada (…), que estamos a pagar os combustíveis mais caros, porque o petróleo está mais caro (…) isto é apenas parte da verdade». Afinal, quando eram oposição, parecia que valia a pena fazer alguma coisa. Aliás, quem não se lembra do ar olímpico com que o, então, Sr. Deputado Paulo Portas acusava e malhava, e bem, no Governo, em relação à questão dos combustíveis, que está a levar ao sufoco das famílias, das empresas, da nossa economia?!
Agora, não têm nenhuma proposta?! A resposta que têm é a de não fazer nada?!
Sr. Primeiro-Ministro, o tal poema do poeta algarvio, António Aleixo, bem se confirma aqui, porque, de facto, para a mentira ser segura, tem de ter alguma dose, algum conteúdo de verdade. Foi isso que o senhor fez e que está a fazer agora, com esta política em relação aos combustíveis.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Queria aqui precisar este facto: em termos de lucros da Galp, a média, entre 2000 e 2003, foi de 139 milhões de euros e, entre 2004 e 2011, o lucro médio foi de 668 milhões de euros.
Ora, explique lá por que é que, no quadro de aflição em que muitas empresas se encontram, porque não são capazes de corresponder ao aumento dos custos dos fatores de produção — e podíamos também falar aqui da eletricidade —, o senhor fica de mãos atadas.
Acabou-se o discurso de que era possível alterar esta situação, não considerando, por exemplo, um sistema de preços máximos que fosse compatível com a viabilidade das empresas e o poder de compra dos portugueses.
Era uma medida de grande alcance económico, se isso acontecesse, mas não, estamos, mais uma vez, perante o «bezerro de ouro»: não tocar nos lucros da Galp!
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, uma última questão, que também tem a ver com aquilo que andou para aí a dizer, no sentido de que era preciso cortar as «gorduras» do Estado.
O País assiste, de boca aberta, mas, tenho a certeza, com uma grande indignação, ao banco do Estado, a Caixa Geral de Depósitos, a apoiar a especulação das OPA dos Melo e dos Queirós Pereira, com centenas de milhões, a vender ao desbarato a sua posição na Cimpor, desarmando o Estado da maior empresa industrial do País, enquanto as pequenas empresas morrem, à míngua do crédito. Vai desmentir-me, Sr. Primeiro-Ministro?! Isto, a que estamos a assistir, de facto, é um escândalo, um escândalo que demonstra que era tudo conversa, quando dizia que queria cortar as «gorduras» do Estado. Usando uma expressão popular, o que o senhor está a fazer é a cortar do «bife do lombo» para o entregar aos grandes interesses, aos grandes grupos económicos.

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