Pergunta ao Governo N.º 1095/XV/1

Dados preocupantes presentes na "Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate À Pobreza Energética 2021-2050'

Segundo o documento "Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate À Pobreza Energética 2021-2050”, estimava-se, em 2021, que, entre 1,9 e 3 milhões de pessoas em Portugal se encontrariam em situação de “pobreza energética”, ou seja, segundo a definição usada, pertencem a agregados familiares em que a despesa com energia representa mais de 10% dos rendimentos totais do agregado. Destes, 660 mil a 740 mil, estão em situação severa.

Não será especulativo considerar que no presente a situação seja bastante pior, ou seja, haverá muitas pessoas e os agregados familiares a mudarem de escalão no sentido negativo.

O problema dos custos com a fatura energética está diretamente associado à privatização e liberalização deste sector estratégico, colocado ao serviço do interesse do grande capital, aos mecanismos especulativos de formação de preços, às margens apropriadas pelas energéticas às custas dos consumidores e sem intervenção de reguladores e Governo.

Recentemente, a Galp anunciou a distribuição de mais de 900 milhões de euros aos seus acionistas, e a EDP anunciou que, só nos primeiros 9 meses do ano de 2022, obteve 518 milhões de euros de lucros. A margem de refinação da Galp passou, no espaço de um ano, de 2,8 dólares/barril, para 12,4 dólares/barril, sem que Governo ou ERSE utilizem os meios legais de que dispõem para intervir sobre estas margens abusivas.

Para alimentar estes lucros, os preços não param de aumentar, levando a que uma grande parte da população não tenha acesso aos níveis adequados de aquecimento nas suas casas, com particular gravidade nestes meses de Inverno. A chamada “pobreza energética” é resultado da pobreza em geral. A pobreza é um problema estrutural do país, inseparável das consequências da política de direita de sucessivos governos do PSD/CDS e do PS e que assenta nos baixos salários e pensões, e manifesta-se na degradação das condições de vida da população, incluindo no acesso à energia e a outros bens essenciais.

Perante estes problemas, não basta a promoção das chamadas tarifas sociais como tem sido proposto pelo governo, exigem-se respostas de fundo, como aquelas que o PCP tem apresentado, para o aumento dos salários e pensões, o controlo de preços de bens essenciais, assim como para a intervenção nos preços da emergia. É necessária a intervenção sobre as margens especulativas; a criação de um preço de referência que remova as componentes especulativas da formação de preços e o fim da lógica marginalista na produção elétrica; o estabelecimento de tarifas reguladas e o fim da sua transitoriedade; o controlo público sobre o sector energético.

O documento “Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate À Pobreza Energética 2021- 2050” teve um período de consulta pública que terminou em 17 de maio de 2021, tendo havido 30 participações. Desde então até hoje o processo encontra-se “Em Análise”.

No referido documento prevêem-se quatro princípios orientadores:

- Aumentar o desempenho energético das habitações;

- Reforçar as condições de acesso a serviços energéticos;

- Reduzir os encargos com o consumo de energia;

- Robustecer o conhecimento e o acesso à informação em matéria de energia, (…) mais e melhores ferramentas e meios para fomentar e melhorar a literacia energética.

Acontece que, ao mesmo tempo que esta “Estratégia” 2021-2050 continua por implementar e “Em análise”, o Governo prepara-se para lançar um novo documento para o período 2022-2050.

Ou seja, enquanto os portugueses passam frio o governo anuncia uma “nova estratégia”. Um expediente que revela que a propaganda do Governo se está a sobrepor à resolução concreta dos problemas com que o País está confrontado.

Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP vem requerer ao Governo, através do senhor Ministro do Ambiente e da Ação Climática, os seguintes esclarecimentos:

1 – Face aos dados presentes na "Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate À Pobreza Energética 2021-2050”, há hoje mais ou menos famílias em situação de incapacidade de aquecer de forma adequada a sua habitação (“pobreza energética” e “pobreza energética severa”) relativamente a 2021?

2 – Qual o motivo para o Governo manter o documento “em análise”, uma vez que o período de consulta pública terminou em maio de 2021? Por que motivos não avança com medidas concretas no âmbito dos princípios orientadores aí presentes?

3 – O que justifica que, enquanto a Estratégia 2021-2050 continua por implementar, o Governo avance com um novo período de consulta pública para a Estratégia 2022-2050?

4 – Considera o Governo que, perante os dados vindos a público no referido documento são precisas medidas mais robustas para assegurar a redução do preço da energia, designadamente utilizando os instrumentos legais que permitem ao Governo intervir sobre as margens especulativas dos grupos económicos do sector da energia?

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