Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

A dívida do sector empresarial do Estado

O aumento da despesa e da dívida do sector empresarial do Estado

Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Assunção Cristas,
A sua intervenção motiva-me, em réplica e em comentário, uma série de contra-perguntas, para as quais solicito adequada resposta.
Quando fala de dívida das empresas públicas, creio que estamos a fugir a duas outras questões, uma delas o endividamento externo do País. E, imediatamente, surge-me uma pergunta: este é o problema estrutural de Portugal. O que é que Portugal tem de fazer?
A Sr.ª Deputada concorda, ou não, com a posição que o PCP tem veiculado, e que tem transmitido reiteradamente nesta Câmara, de que só se combate o endividamento externo através de um reforço, de uma defesa da capacidade produtiva instalada, por todos os processos, que seja capaz de substituir importações por capacidade produtiva instalada? Esta é uma primeira questão, sobre a resposta estrutural ao endividamento externo.
A segunda questão que vou colocar já aqui foi colocada: diz respeito aos juros da dívida pública e às dificuldades que isso traz para o crédito à economia. O que pensa a Sr.ª Deputada? Acha aceitável a banca privada financiar-se a 1% no Banco Central Europeu e o Estado pagar 6,5% pela tomada da sua dívida soberana?
Está ou não de acordo com o PCP quando dizemos que isto demonstra a paralisia do Governo, a paralisia das instituições europeias, da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu, que em vez de financiar directamente os Estados, a dívida soberana, a taxas de juro baixas impede esse financiamento e só financia a banca privada, fazendo, por exemplo — esta é uma questão que levantou —, com que estes recursos também cheguem à economia, portanto, não apenas aos Estados mas à economia, a taxas de juro absolutamente incomportáveis, com spreads absolutamente inaceitáveis através de uma usura e de uma agiotagem absolutamente inaceitáveis?
Finalmente, falando também das empresas e da dívida das empresas públicas, receio que a Sr.ª Deputada tenha corrido o risco de meter tudo no mesmo saco. E se é verdade que é necessário combater desperdício, combater, por exemplo, a compra de frotas automóveis na Águas de
Portugal, a verdade é que as dívidas das empresas públicas, no fundamental, não são da responsabilidade das empresas públicas, são da responsabilidade e têm crescido por irresponsabilidade do Governo. Dou-lhe dois exemplos: um deles é o das indemnizações compensatórias.
O Estado não contratualiza o serviço público, não paga as indemnizações compensatórias; ao longo de anos, sonega o financiamento das indemnizações compensatórias às empresas, designadamente às empresas de transporte. Pior do que isso: o Estado mantém um modelo de financiamento ao investimento destas empresas públicas absolutamente escandaloso, indigente, fazendo com que o fundo perdido em projectos de transporte em Portugal não atinja sequer os 25%, quando sabemos que qualquer projecto de investimento em obras públicas de transportes implica um fundo perdido de cerca de 50%.
E é esta irresponsabilidade do Governo, esta recusa em alterar o modelo de financiamento das empresas públicas que vai, depois, causar um endividamento, não por má gestão, não porque tenhamos de abandonar os investimentos dessas empresas públicas, não por irresponsabilidade das empresas ou por desnecessidade dos investimentos públicos mas, sim, por responsabilidade do Estado, que não altera os modelos de financiamento das empresas públicas.

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