Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Crime de violência escolar

Cria o crime de violência escolar e procede à vigésima sétima alteração ao Código Penal
(proposta de lei n.º 46/XI/2.ª)
Cria os Gabinetes Pedagógicos de Integração Escolar (GPIE)
(projecto de lei n.º 149/XI/1.ª)
Recomenda ao Governo medidas de intervenção no sistema de ensino público no sentido do combate à violência em contexto escolar e do reforço do da escola inclusiva e democrática
(projectos de resolução n.os 93/XI/1.ª)

Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Secretário de Estado,
Os comportamentos que o Governo pretende criminalizar com esta proposta de lei já hoje são punidos pela legislação penal e já hoje, quando estes comportamentos são adoptados por jovens com idades inferiores a 16 anos, é permitida a aplicação de medidas tutelares e educativas. Isso quer dizer que já hoje, do ponto de vista penal, é possível responder a estas situações.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, as questões que lhe coloco são duas: em primeiro lugar, se tudo isto já é possível, porque é que os senhores apresentam à Assembleia da República novamente uma iniciativa legislativa que aponta um caminho que já se comprovou não ser um caminho que permita resolver o problema.
Segunda questão, Sr. Secretário de Estado: por que razão o Governo não faz acompanhar esta proposta de lei de um único dado, de um único estudo que aponte a necessidade de reforçar as medidas de perseguição penal e que não garanta o que deve ser o caminho na resposta pedagógica, na resposta educativa e também na resposta social que é preciso dar a estas situações e que ainda hoje continua por dar nas nossas escolas?
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Secretário de Estado:
As propostas hoje em discussão traduzem, de facto, uma cedência do Governo às concepções repressivas, securitárias e populistas do CDS.
O que o Governo pretende fazer, hoje, com esta proposta de criminalização destes comportamentos — criminalização essa que, aliás, já está prevista na lei e que por fundadas razões não é a resposta que tem sido encontrada para estas situações — é enfrentar, com a perseguição penal, um problema que deve ter outro tipo de respostas.
De facto, o problema da violência escolar deve ter respostas educativas, pedagógicas e também
disciplinares para os agressores, mas também respostas reparadoras e de apoio às vítimas.
O que os senhores pretendem fazer hoje é tratar, do ponto de vista penal, um problema que envolve maioritariamente jovens inimputáveis em razão da idade.
Portanto, de duas, uma: ou estas medidas não têm qualquer efeito do ponto de vista penal; ou, então, o Governo prepara-se mesmo para embarcar na lógica repressiva e securitária do
CDS, prevendo, provavelmente daqui a pouco tempo, a redução da idade da imputabilidade penal.
Ora, para propostas desse tipo, Sr. Secretário de Estado, não conte com o PCP!
Da parte do PCP, pode contar com o reconhecimento de que este é, de facto, um problema com grande impacto na vida das nossas escolas. Mas não embarcamos na escalada sem fim que os senhores querem prosseguir.
É porque, primeiro, atribuíram às escolas a responsabilidade de resolver um problema que tem a sua origem fora dos muros das escolas e, agora, pretendem transferir para as polícias e para os tribunais o mesmo problema, sem dar resposta à sua verdadeira origem.
E a origem deste problema, Sr. Secretário de Estado, está fora dos muros das escolas: está nas situações de desestruturação familiar; tem na sua origem situações de pobreza, de miséria e de exclusão social; tem na sua origem problemas de completa desestruturação, do ponto de vista da educação e da formação dos nossos jovens, que devem ter um envolvimento de estruturas para lá das escolas (de estruturas da segurança social, dos serviços de saúde e dos serviços de inclusão social).
É por isso que, hoje, apresentamos aqui um projecto de lei de criação dos gabinetes pedagógicos de integração escolar, tal como já fizemos anteriormente. Esperamos que, desta vez, essa possa ser uma realidade, esperamos que, desta vez, a nossa iniciativa possa ser aprovada, porque, aí sim, encontram-se as respostas multidimensionais que este problema exige.
(…)
Sr.as e Srs. Deputados,
Queria dar alguma resposta a esta intervenção de alguma hipocrisia política da parte do CDS.
Sr. Deputado Nuno Magalhães, sabe quando é que, pela primeira vez, nesta Assembleia da República, foi apresentada uma proposta para a criação de estruturas pedagógicas que dessem resposta à situação da violência escolar? Foi em 2007, aquando da revisão do Estatuto do Aluno, e foi apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP.
Mais, Sr. Deputado Nuno Magalhães: o CDS, que aprovou em 2010 o Orçamento do Estado, que obrigou ao despedimento de milhares de funcionários nas escolas portuguesas, apresenta, hoje, uma proposta para a contratação de funcionários nas escolas.
O CDS, que ainda há bem pouco tempo negociou e aprovou com o Partido Socialista uma revisão do Estatuto do Aluno, onde se esqueceu dos gabinetes de apoios aos alunos, hoje apresenta uma proposta para a criação desses gabinetes! Isto, Sr. Deputado Nuno Magalhães, é demagogia, é populismo e é hipocrisia política.
Da parte do PCP não contam com isso!
Digo mais, Sr. Deputado Magalhães, repetindo o que já disse: para o PCP, a violência escolar é um problema. É, sim, senhor!
Mas é um problema que não tem a sua origem na escola. Os alunos e as pessoas que entram nas escolas não se tornam lá violentos. É um problema que tem origem fora da escola.
Quem queira seriamente dar combate a este problema tem de o fazer na sua origem, pelo que tem de se identificar, em primeiro lugar, a origem do problema, que, em muitas circunstâncias, é diferente.
A resposta ao problema é dada consoante a sua origem. Se é uma questão de situação familiar, têm de ser encontradas as respostas que permitam àquele agressor encontrar uma situação familiar que lhe garanta resolver o problema da violência. Se é um problema de exclusão social, têm de se encontrar as respostas sociais que garantam a sua inclusão. Ora, é isso que o CDS não quer!
O único interesse que os senhores têm é o de continuar esta escalada nesta concepção repressiva e securitária, que, também dentro das escolas, o CDS pretende impor.
(…)
Sr.ª Presidente, é para fazer uma verdadeira interpelação à Mesa.
Como não disponho da cópia em papel da proposta de alteração ao Estatuto do Aluno que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou em 2007 — em 2007, Sr. Deputado Magalhães! —,
gostaria de solicitar à Mesa, por intermédio da Sr.ª Presidente, que a fizesse chegar ao Sr. Deputado Nuno Magalhães para perceber que, em relação a essa matéria, o CDS chegou atrasado.

  • Educação e Ciência
  • Justiça
  • Assembleia da República
  • Intervenções