Projecto de Lei N.º 399/XIII/2ª

Cria a unidade de missão para a revisão do regime das custas judiciais

Exposição de motivos

Dispõe o n.º 1 do artigo 20.º da Constituição que “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.

Porém, é unanimemente reconhecido que a realidade está muito longe desse objetivo.

Na verdade, a insuficiência de meios económicos afasta a maioria dos cidadãos do recurso aos tribunais para a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.

A morosidade inerente ao funcionamento dos tribunais, a falta de generalização dos julgados de paz e as competências reduzidas desse meio de composição de litígios, o escassíssimo alcance social dos mecanismos de apoio judiciário, os custos com honorários de advogados, e no que importa à presente iniciativa, o elevado valor das custas a suportar pelo recurso aos tribunais, faz com o direito de acesso aos tribunais esteja reservado às empresas ou cidadãos como elevados recursos económicos, ou aos cidadãos que por serem reconhecidos como indigentes tenham direito a apoio judiciário.

A maioria dos cidadãos, usualmente designada por “classe média”, ou não tem dinheiro para recorrer aos tribunais, ou é obrigada a um esforço económico para o fazer que põe em causa as suas próprias condições de subsistência.

Esta situação é inaceitável e tem de ser alterada. O PCP considera essencial baixar significativamente o valor das custas judiciais e alargar os critérios para a sua isenção.

Não se ignora que a garantia de acesso ao direito e aos tribunais passa por outras vertentes que não apenas as custas judiciais. Importa nomeadamente rever o regime do apoio judiciário de modo a aumentar o seu alcance social. Mas no que se refere às custas judiciais, cujo valor é unanimemente reconhecido como desproporcionadamente elevado para a maioria das bolsas, há que repensar seriamente, mas com urgência, o respetivo regime legal.

Entende o PCP que não basta à Assembleia da República recomendar ao Governo que faça aquilo que também é sua responsabilidade fazer. Porém, a revisão do regime das custas judiciais, pela sua complexidade e implicações, deve contar com a reflexão dos operadores judiciários e com a contribuição de juristas com conhecimentos aprofundados sobre a matéria em causa, tendo nomeadamente em conta a importância social de garantir o acesso aos tribunais e o impacto das medidas a tomar no sistema de Justiça.

Daí que o PCP entenda que a decisão legislativa a tomar pela Assembleia da República deve ser precedida de um estudo aturado a levar a cabo por uma unidade de missão especialmente criada para o efeito.

Assim, o PCP propõe que seja criada uma unidade de missão composta por sete elementos, a funcionar junto da Assembleia da República, tendo por missão promover a necessária reflexão e, se o entender, apresentar propostas legislativas, destinadas a habilitar a Assembleia da República e o Governo a proceder à revisão do regime legal das custas judiciais de modo a dar cumprimento ao direito constitucional de todos os cidadãos de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva.

Esta unidade deve ser integrada por elementos designados pelo Ministério da Justiça, que preside, pelos Conselhos Superiores da magistratura, dos Tribunais Administrativas e Fiscais, e do Ministério Público, pela Ordem dos Advogados, pelo Centro de Estudos Judiciários e por um Professor de Direito cooptado pelos restantes membros.

No prazo de seis meses após a sua entrada em funcionamento pleno, a unidade de missão deve entregar um relatório ao Presidente da Assembleia da República de onde constem as conclusões do trabalho realizado e as alterações ao regime legal das custas judiciais que a unidade de missão considere necessárias para garantir o cumprimento dos princípios constitucionais em matéria de acesso ao direito e aos tribunais.

Esse relatório deve ser disponibilizado aos Deputados e ao Governo e deve ser objeto de debate na Assembleia da República. Naturalmente que compete aos Deputados, aos grupos parlamentares e ao Governo apresentar as iniciativas legislativas que considerem pertinentes. O que se espera da unidade de missão é que possa dar uma contribuição qualificada para eventuais iniciativas que venham a ser apresentadas.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
(Objeto)

Pela presente lei, é criada a unidade de missão para a revisão do regime das custas judiciais, adiante designada por unidade de missão.

Artigo 2.º
(Finalidade)

A unidade de missão tem como finalidade habilitar a Assembleia da República e o Governo a proceder à revisão do regime legal das custas judiciais de modo a dar cumprimento ao direito constitucional de todos os cidadãos de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva.

Artigo 3.º
(Composição)

A unidade de missão é integrada por:
a) Um elemento designado pelo Ministério da Justiça, que preside;
b) Um elemento designado pelo Conselho Superior da Magistratura;
c) Um elemento designado pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais;
d) Um elemento designado pelo Conselho Superior do Ministério Público;
e) Um elemento designado pela Ordem dos Advogados;
f) Um elemento designado pelo Centro de Estudos Judiciários;
g) Um professor de Direito cooptado pelos restantes membros.

Artigo 4.º
(Atribuições)

1. São atribuições da unidade de missão:
a) Promover o estudo e a reflexão sobre o regime legal das custas judiciais através dos meios que considerar adequados;
b) Elaborar um relatório a apresentar à Assembleia da República de onde constem as conclusões do trabalho realizado e as alterações ao regime legal das custas judiciais que a unidade de missão considere necessárias para garantir o cumprimento dos princípios constitucionais em matéria de acesso ao direito e aos tribunais.

2. O relatório referido no número anterior deve ser enviado à Assembleia da República no prazo de seis meses após o início dos trabalhos da unidade de missão e pode conter em anexo as propostas de alteração legislativa que a unidade de missão considere recomendar aos órgãos de soberania.

Artigo 5.º
(Instalação e funcionamento)

1. A unidade de missão funciona junto da Assembleia da República, que garante as instalações e os meios logísticos necessários para o efeito.
2. No prazo de oito dias após a entrada em vigor da presente lei o Presidente da Assembleia da República notifica as entidades referidas no artigo 3.º para que, no prazo de 15 dias, lhe comuniquem os elementos que designem para integrar a unidade de missão.

3. As reuniões da unidade de missão são convocadas e presididas pelo elemento designado pelo Ministério da Justiça.

4. A cooptação do professor de Direito referido na alínea g) do artigo 3.º deve ser efetuada na segunda reunião da unidade de missão.

5. A contagem do prazo para a apresentação do relatório previsto no artigo anterior conta-se a partir da primeira reunião realizada após a designação da totalidade dos membros da unidade de missão.

Artigo 6.º
(Conclusão dos trabalhos)

1. O relatório elaborado pela unidade de missão é entregue ao Presidente da Assembleia da República, que o disponibiliza a todos os Deputados e ao Governo, para que querendo, possam exercer a iniciativa legislativa.

2. Após a disponibilização do relatório, e Independentemente de quaisquer iniciativas legislativas que sejam apresentadas, a Comissão Parlamentar competente em matéria de Direitos, Liberdades e Garantias procede à audição dos membros da unidade de missão.
3. O relatório da unidade de missão deve ser objeto de debate no plenário na Assembleia da República nos termos aplicáveis aos relatórios das entidades administrativas independentes.

Artigo 7.º
(Entrada em vigor)

A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 10 de fevereiro de 2017

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