Projecto de Lei N.º 198/XIV/1.ª

Cria um regime excepcional para o Serviço Nacional de Saúde no âmbito da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atrasos

(Lei n.º 8/2012 de 21 de fevereiro)

Exposição de motivos

O Governo PSD/CDS, ancorado na sua opção de ataque e destruição dos serviços públicos, das funções sociais do Estado e de reconfiguração do Estado, impôs um conjunto muito significativo de constrangimentos burocráticos e administrativos que tiveram o seu apogeu na Lei dos compromissos e dos pagamentos em atraso.

A criação da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, ao invés de resolver os problemas, aliás, como o PCP sempre o afirmou, agudizou o estrangulamento funcional das entidades públicas e levou à degradação da sua capacidade de prestarem os serviços públicos que lhes estão atribuídos.

Na verdade, o problema dos pagamentos em atraso tem a sua origem na política de subfinanciamento crónico dos serviços na Administração Central, levada a cabo por sucessivos governos do PS, PSD e CDS.

A aplicação da Lei nº 8/2011, de 21 de fevereiro, aos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde tem levantado enormes constrangimentos ao seu funcionamento, tendo, desde 2017 tido expressão nas sucessivas recusas de visto prévio por parte do Tribunal de Contas.

Têm sido recusados visto a contratos para aquisição de medicamentos, em particular medicamentos para o tratamento de doenças oncológicas, HIV/SIDA, artrite reumatoide entre outros; de aquisição de bens e serviços, nomeadamente de alimentação e tratamento de roupas, mas também de contratos de manutenção ou para a realização de meios complementares de diagnóstico e terapêutica; e até mesmo para a realização de investimentos nas unidades de saúde.

Recentemente foi tornado público a rejeição pelo Tribunal de Contas da aquisição de medicamentos para o tratamento de doenças oncológicas pelo Centro Hospitalar Lisboa Norte. Medicamentos que são fundamentais para os doentes oncológicos, que deste modo ficam privados do tratamento e dos cuidados que têm direito.

São já cerca de 40 contratos apresentados por entidades hospitalares que foram recusados pelo Tribunal de Contas, desde 2017. O motivo é idêntico, a ausência de comprovação de fundos disponíveis, de acordo com o estabelecido na Lei dos compromissos e dos pagamentos em atraso, que tem carácter imperativo sobre a demais legislação, incluindo sobre a missão do SNS e a necessidade de assegurar cuidados de saúde.

O próprio Tribunal de Conta no Acórdão n.º 17/2019, de 18 de junho de 2019, refere que se se está “perante um verdadeiro problema sistémico a carecer de resolução urgente por parte do legislador”, dado o elevado número de recusas de visto prévio a diversos contratos de entidades do SNS.

A alteração introduzida no âmbito do processo de discussão e aprovação do Orçamento do Estado para 2020, alargando o prazo para a consideração dos fundos disponíveis no SNS, alivia, mas não resolve o problema, tal como é afirmado pela Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares. Administradores, profissionais de saúde, várias associações e entidades consideram que não faz nenhum sentido a lei dos compromissos e dos pagamentos em atraso se aplicar no SNS e entendem que é preciso remover este obstáculo na gestão dos estabelecimentos públicos de saúde.

Na prática a Lei dos compromissos e dos pagamentos em atraso está a impedir o normal funcionamento das unidades hospitalares, colocando em causa o direito à saúde. Na gestão dos serviços públicos, em especial das unidades de saúde que integram o SNS, o que deve imperar não são critérios de natureza administrativa e economicista, mas sim critérios de natureza clínica e de proteção da saúde dos doentes.

Esta situação põe em evidência, a necessidade de se criar um regime excecional para o SNS, excluindo da aplicação da lei dos compromissos e dos pagamentos em atraso, a aquisição de medicamentos, de produtos químicos e farmacêuticos, de material clínico e dispositivos médicos, de investimentos financiados por fundos comunitários e investimentos com cabimentação orçamental. O PCP apresenta esta iniciativa legislativa para que não seja posta em causa a prestação de cuidados de saúde de qualidade e de forma atempada.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1º

Objeto

A presente lei cria um regime excecional para o Serviço Nacional de Saúde no âmbito da Lei n.º 8/2012 de 21 de fevereiro.

Artigo 2º

Âmbito

Os estabelecimentos de saúde que integram o Serviço Nacional de Saúde são excecionados da aplicação da Lei n.º 8/2012 de 21 de fevereiro nas seguintes situações:

  1. Aquisição de medicamentos;
  2. Aquisição de produtos químicos e farmacêuticos;
  3. Aquisição de material de consumo clínico e dispositivos médicos;
  4. Aquisição de bens e serviços;
  5. Execução de investimento cujos projetos tenham sido aprovados com fundos comunitários;
  6. Execução de investimentos cujos projetos tenham cabimentação orçamental.

Artigo 3º

Entrada em Vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

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