Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia,
Relativamente à matéria que trouxe a debate nesta Assembleia, que se prende com a proposta de Orçamento do Estado que todos acabámos de receber, há uma questão que ressalta no debate político em torno deste Orçamento, a qual tem a ver com as pressões absolutamente despudoradas que têm vindo a ser dirigidas, pelo Governo e pela maioria, ao Tribunal Constitucional. Ou seja, este Governo, que, aliás, é reincidente na aprovação de disposições legislativas, designadamente em matéria orçamental, já declaradas inconstitucionais — já tivemos dois Orçamentos do Estado consecutivos com normas declaradas inconstitucionais —, incorpora, neste Orçamento, em termos de impacto orçamental, medidas que estão ainda, neste momento, sob fiscalização do Tribunal Constitucional. E o Governo tem consciência de que este Orçamento contém disposições que afrontam, até de uma forma grosseira, princípios constitucionais — é o próprio Governo a reconhecê-lo.
É preciso dizer que os princípios constitucionais que têm sido violados por estas disposições não são originalidades da Constituição Portuguesa. O princípio da igualdade, o princípio da proporcionalidade, o princípio da proteção da confiança são princípios inerentes a qualquer Estado de direito democrático, não têm que ver com nenhuma originalidade portuguesa.
O que acontece é que o Governo não se conforma com a existência de quaisquer limites à arbitrariedade! Essa é que é a questão, Sr.ª Deputada. E, como o Governo não quer que existam limites para as suas arbitrariedades, lança as baterias precisamente contra a entidade que tem competência para, nos termos do Estado de direito, proceder a essa fiscalização e impor o respeito por princípios elementares do Estado de direito democrático!
A maioria sabe que dispõe de uma maioria nesta Câmara que lhe permitirá aprovar o Orçamento do Estado como entender, mas não tem a garantia de que o Tribunal Constitucional não exerça as suas competências.
Nesse sentido, desenvolve toda uma linha de chantagem e até de ameaça como quem diz «se os senhores exigirem o respeito pelo Estado de direito democrático são os culpados por um segundo resgate, por uma qualquer desgraça», ou seja, serão responsabilizados pelas consequências de uma política que é da responsabilidade exclusiva do Governo e da maioria! Isto é, a maioria e o Governo procuram fazer recair sobre o Tribunal Constitucional as consequências do completo fracasso da sua política!
Gostava, pois, que a Sr.ª Deputada, se pudesse, nos desse a sua opinião acerca desta verdadeira linha de chantagem e de ameaça que tem sido desenvolvida contra o Tribunal Constitucional e que, do nosso ponto de vista, constitui uma afronta maior aos valores e aos princípios do Estado de direito democrático!