Pergunta ao Governo

Cortes no financiamento ao Ensino Artístico – Despacho n.º 12522/2010

Cortes no financiamento ao Ensino Artístico – Despacho n.º 12522/2010

A política do actual Governo para o Ensino Artístico tem vindo a revelar-se desarticulada e desestruturada o que, por si só, constitui um importante constrangimento ao funcionamento e ao cumprimento da missão do Ensino Artístico especializado no âmbito do papel que lhe é atribuído na legislação portuguesa. Além de não ter vindo a produzir-se qualquer efeito positivo da chamada "refundação do ensino artístico", o Governo persiste numa linha de desvalorização deste ramo do ensino especializado.

Em todas as vertentes políticas que cabem ao Governo cuidar, desde a formação e profissionalização de professores, à sua contratação, passando pela real articulação do ensino artístico com o ensino regular, e terminando nos meios colocados à disposição das entidades proprietárias das escolas de ensino artístico, se assiste a uma gradual desresponsabilização. Em última análise e perante a continuidade destas políticas, o ensino especializado das artes terá reservado um lugar cada vez mais residual no âmbito do ensino público, uma falsa generalização no contexto das actividades de enriquecimento curricular e será sujeito a um cada vez maior elitismo, acompanhado de uma degradação da qualidade do ensino prestado e dos efeitos por ele gerados na sociedade.

A publicação, a 3 de Agosto de 2010, do Despacho nº 12522/2010, que determina a limitação dos valores de financiamento e o universo de candidaturas, vem afirmar-se nessa orientação política que vem sendo imposta ao ensino artístico desde há muito e que consiste no seu sub-financiamento, enquanto estrutura. A política de "nichos" ou "ilhas" de suposta excelência à custa da degradação genérica da qualidade do ensino artístico considerado como um todo gerará apenas o empobrecimento deste importantíssimo pilar do ensino em Portugal.

Porque os efeitos deste Despacho se anunciam claros, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português exige que o Governo recue nesta política de estrangulamento financeiro. É necessário que o Governo invista no Ensino das Artes, nas suas diversas modalidades, de forma consistente e justa. A discriminação contida nesse Despacho implica a impossibilidade de apresentação de candidatura por parte de todas as entidades proprietárias que não tenham celebrado contrato de patrocínio com o Ministério da Educação. Isto significa que um significativo número de escolas privadas do ensino especializado da música vai deixar de poder aceder a uma importante fonte de financiamento em função dos alunos matriculados. Este efeito será imediatamente repercutido nos alunos que, no sentido de poderem continuar a frequentar esse ensino numa escola sem contrato de patrocínio, terão de começar a pagar avultadas mensalidades. Certamente que não se poderá enquadrar esta medida no âmbito de uma política de massificassão do acesso ao ensino artístico ou sequer de estímulo à qualidade do ensino.

A rede pública de ensino especializado da música é profundamente insuficiente, o que faz com que a cobertura territorial garantida por entidades cooperativas ou particulares seja determinante para a possibilidade de acesso ao ensino especializado da música para milhares de crianças e jovens portugueses. Essas escolas e conservatórios particulares desempenham um papel que o Estado se nega a cumprir, embora lhe seja constitucionalmente atribuído e ao invés de o Governo iniciar um conjunto de políticas que reforcem o seu papel e garantam o seu cumprimento, o Governo debilita a prestação do serviço assegurado por entidades particulares, muitas das quais, inclusivamente, excluídas da lógica comercial e mercantil e aplicadas na divulgação e garantia do ensino artístico.

Desta forma, não só o Governo não cria as bases para o alargamento do ensino especializado da música, como fragiliza a resposta já existente, por via da imposição de constrangimentos financeiros que terão fortes impactos na qualidade do ensino e no número de alunos capaz de frequentar esse ramo do ensino.

Além disso, o Governo introduz flagrantes injustiças no quadro da distribuição dos recursos públicos. Tendo em conta que as escolas particulares do ensino especializado da música que se encontram licenciadas e reconhecidas pelo Ministério da Educação só terão acesso às candidaturas em caso de serem abrangidas por contrato de patrocínio, isso significa que um conjunto de escolas, embora reconhecidas pelo mesmo ministério e prestando serviço de igual importância que as restantes, não poderão aceder a essas candidaturas e aos consequentes fundos.

Mais grave é o impacto que essa discriminação injustificada provocará junto do aluno propriamente dito. Por que motivos o aluno da Escola com contrato de patrocínio tem a sua frequência apoiada pelo Estado enquanto que o aluno das restantes escolas não tem, muito embora essa escola seja considerada parte da rede de ensino e leccione cursos nos diversos regimes de ensino especializado da música?

Assim, nos termos regimentais aplicáveis, pergunto ao Governo, através do Ministério da Educação e com carácter de urgência, o seguinte:

1. Que motivos objectivos levam o Governo a discriminar entre Escolas com contrato de patrocínio e escolas sem contrato de patrocínio para efeitos de acesso às candidaturas a financiamento público no âmbito do ensino especializado da música?

2. Qual o valor total que o Governo julga poder vir a não gastar, tendo em conta a limitação agora anunciada no referido Despacho?

3. Que sucederá aos alunos que frequentam escolas sem contrato de patrocínio e que se encontram em posição de renovação de matrícula?

4. Que medidas tomará o Governo para assegurar a viabilidade das escolas particulares do ensino especializado da música que ficam agora sem acesso às candidaturas e que poderão vir a perder alunos, tendo em conta o fim do apoio à frequência destes?

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