Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

Concurso para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como da educação especial

Altera as regras do concurso para selecção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como da educação especial, retirando a consideração dos resultados da avaliação de desempenho para efeitos de colocação de professores
(projecto de lei n.º 250/XI/1.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Todos nos recordamos do momento em que estes projectos de lei foram apresentados — o projecto de lei do PCP, que agora apresento, e o projecto de lei do BE — e da importância que teria a sua aprovação naquela altura. Mas também nos lembramos dos expedientes que o PS, então, utilizou para bloquear um consenso e para impedir que eles fossem votados a tempo de produzirem efeitos quando mais se exigia, que era à beira da realização de um concurso de
ingresso, de recrutamento e mobilidade de professores.
No entanto, Srs. Deputados, o objectivo e o objecto dos projectos de lei ora em discussão continuam a ser válidos. Lembro que o processo de avaliação decorre nas escolas, um pouco em função da decisão do PSD e do CDS, que inviabilizaram o projecto de resolução apresentado pelo PCP há umas semanas para travar o processo de avaliação das escolas — e por isso ele continua a decorrer, fazendo, assim, a vontade ao Partido Socialista, sendo que vai produzir uma série de consequências.
Sabemos que não produzirá consequências na carreira docente nem na progressão na carreira, porque todas as carreiras se encontram congeladas — e, por isso mesmo, é de certa forma incompreensível a pressão que o Partido Socialista faz para que continue a ser levado a cabo um processo que não produzirá consequências, pelo menos, que sejam palpáveis num prazo razoável —, mas ainda assim o processo continua, prossegue.
Ora, esse processo de avaliação tem, para já, um efeito muito claro, que é o de contabilizar os seus efeitos no quadro de colocação de professores. Os concursos de professores, que supostamente deveriam tomar os professores candidatos todos por igual, estão neste momento, à partida, inquinados, porque decorre um processo de avaliação — que, como os Srs. Deputados sabem, pondera para efeitos de concurso e que pode bonificar em mais um ou dois pontos na lista graduada os professores em causa — que é diferente de escola para escola.
Os Srs. Deputados sabem bem que há escolas que decidiram nem sequer realizar o procedimento total da avaliação e fazer uma avaliação quase administrativa. E também sabem que há escolas em que não houve aulas observadas, há escolas que não conseguiram concluir o procedimento. E os professores que leccionam nessas escolas não têm qualquer responsabilidade pelo facto de estarem a ser avaliados por uma bitola diferente dos professores da escola vizinha, por exemplo, mas vão ser sujeitos a concurso exactamente nas
mesmas condições, como se tivessem sido avaliados todos pela mesma bitola. Ora, isso não é justo, Srs. Deputados!!
O que o PCP propõe é que seja retirada a avaliação para efeitos de concurso, e sobre isto é urgente que esta Assembleia delibere, tendo em conta a realização próxima de concursos — muito embora o Governo já tenha voltado atrás no compromisso que assumiu no acordo de princípios com os sindicatos no que toca à realização de um concurso extraordinário de ingresso para 2011 —, uma vez que há outros concursos que se vão realizar ainda este ano e que carecem dessa deliberação urgente desta Assembleia. Portanto, para garantir a mínima justiça no que toca a um procedimento que é um concurso público para colocação de professores é necessário que seja retirada a avaliação para efeitos de concurso.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
De facto, assistimos aqui a um exercício de contorcionismo lógico por parte do PSD assinalável.
Senão, vejamos: esta avaliação é má? É. Esta avaliação é burocrática? É. Esta avaliação é injusta? É. Esta avaliação padece praticamente de todos os problemas que têm sido identificados pelos diversos grupos parlamentares da oposição e pelos professores? Sim, padece. Deve produzir efeitos? Sim, deve produzir
efeitos. Injustos? Sim. Tal e qual.
Ora, isto demonstra bem até onde o PSD está disponível para fingir, para ensaiar uma discrepância com a orientação política do PS, mas que, na prática, ampara sempre as políticas que este Governo tem levado a cabo, porque, na verdade — e a verdade seja dita —, o PSD não tem absolutamente nada de diferente para oferecer. Prova disso é o PSD ter votado contra a suspensão da avaliação há duas semanas. E, já agora, também estranhamos a posição que o CDS assumiu ao não apoiar a suspensão da avaliação que o PCP propôs através de um projecto de resolução.
Nunca pensei dizer tal coisa, mas a única intervenção coerente foi a do PS, que veio aqui fazer um exercício de ignorar a realidade que se passa lá fora, de se fechar numa redoma opaca, de dizer que tudo vai bem e que a avaliação é um espectáculo e que as escolas estão satisfeitíssimas e os professores vêem o seu mérito premiado.
O que está aqui em causa não é premiar o mérito, mas sim, Srs. Deputados do Partido Socialista, uma questão muito objectiva: num concurso que é nacional e que deve considerar todos por igual, vamos utilizar um instrumento que, ainda que comensurável, que é a avaliação, não é aplicável como bitola, porque é realizado de forma diversa de escola para escola. É daí que advém a principal injustiça.
Ora, isso não é premiar o mérito, isso é alimentar um sistema de injustiças num concurso público — os concursos de colocação de professores são concursos públicos! — e estamos a introduzir um sistema que é, à partida, injusto.
Deixo um último recado para a Sr.ª Deputada Vânia de Jesus, que me citou na sua intervenção: o PSD, num discurso contra a avaliação e na defesa dos professores, tem um empenhamento que é do tamanho da Ilha da Madeira, mas nas acções, nos actos, quando é chamado a participar tem uma «coragenzinha» do tamanho das Selvagens.

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