Comunicado do Comité Central do PCP, de 11 e 12 de Novembro de 2005

O Comité Central do PCP reunido a 11 e 12 de Novembro de 2005 procedeu à análise da proposta de Orçamento de Estado para 2006 e às consequências negativas que dele decorrem para as condições de vida dos trabalhadores e da população em geral e para o desenvolvimento económico do país; debateu e avaliou os traços mais marcantes da situação social, designadamente aqueles que a ofensiva do governo contra direitos políticos e sociais tem vindo a agravar, e definiu as principais orientações para lhe dar resposta e combate. O Comité Central do PCP avaliou ainda o desenvolvimento do quadro político em que as eleições presidenciais irão decorrer, designadamente com a formalização da candidatura de Cavaco Silva e as linhas de campanha que em seu redor se perfilam, e confirmou o papel decisivo que a candidatura de Jerónimo de Sousa desempenha, pelo esclarecimento e pelo voto, para afirmar o rumo diferente para um Portugal com futuro e contribuir para a derrota de Cavaco Silva e dos projectos que em seu torno se agregam. O Comité Central debateu ainda matérias relativas ao trabalho de direcção e ao reforço da organização do Partido.

I

1. A proposta de Orçamento do Estado para 2006 que o Governo manteve por desvendar até às eleições para as autarquias locais , por razões que o PCP repetidamente denunciou, não só não dá resposta aos principais problemas do país como contribuirá para o seu agravamento.

A proposta de Orçamento do Estado, assente em critérios e orientações neoliberais, não só não resolve os problemas da crise económica que o país enfrenta como criará, pelo contrário, dificuldades acrescidas à sua eventual recuperação, ao insistir numa política restritiva em relação ao mercado interno e ao promover um corte acelerado do investimento público; não dá resposta à grave situação social contribuindo, pelas medidas nele previstas, para acentuar as dificuldades da generalidade da população e para manter sobre os mesmos de sempre, trabalhadores, reformados e sectores mais desfavorecidos da população, o peso dos sacrifícios e das restrições; não só não contribui para atenuar as desigualdades de distribuição da riqueza como se constitui como um instrumento activo para acentuar essa desigualdade pelas opções da política fiscal — assente, por um lado, no crescente peso dos impostos indirectos e na aplicação indiscriminada do imposto sobre os rendimentos de trabalho e, por outro, pelo aumento dos benefícios fiscais dedicados à actividade especulativa e financeira; um Orçamento do Estado que prossegue a desastrosa política de privatização de empresas, de funções sociais do Estado e de serviços públicos essenciais, na energia, na saúde, na água etc..

A proposta de Orçamento do Estado prossegue o caminho de ataque aos trabalhadores da administração pública e prolonga a perda de poder de compra da população que se tem verificado nos últimos anos, agrava o desemprego optando por um modelo de desenvolvimento do país assente nos baixos salários, na precariedade e na alienação de património público. A efectiva redução dos meios financeiros das autarquias e das Regiões Autónomas decretada por este Orçamento traduzir-se-á não apenas na redução da sua capacidade de investimento e resposta às necessidades da população, como terá importantes repercussões negativas na vida económica local. Contribuirá igualmente para o agravamento das assimetrias regionais decorrente da insuficiência e dos critérios dos investimentos do PIDDAC, pelo desenvolvimento de políticas que liquidarão instalações e serviços públicos, (saúde, educação, justiça), pelos resultados das privatizações de empresas como a EDP, GALP, REN, e também porque os cortes nas transferências para as autarquias afectam mais significativamente os municípios das regiões com maiores problemas de desenvolvimento económico.

A falência desta política e das suas opções é testemunhada não apenas pelo agravamento continuado dos problemas estruturais que o país enfrenta, mas também pela revelação que com estas orientações o caminho da divergência com a União Europeia se acentuará — crescimento de 1,1% para o nosso País contra os 1,8% para a União Europeia — atrasando cada vez mais Portugal.

A proposta de Orçamento do Estado confirma a opção pela continuidade das políticas prosseguidas pelos governos anteriores, caracterizada pelo cego cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento e dos seus critérios restritivos e monetaristas e por uma política anti-social. Um Orçamento que serve os interesses do grande capital nacional e transnacional e penaliza a generalidade da população — trabalhadores, reformados, micro e pequenos empresários, agricultores e pescadores.

Contra esta política que o PS prossegue obstinadamente, em sentido contrário à contestação popular bem patente nos resultados das últimas eleições autárquicas, ergue-se a luta e a resistência dos trabalhadores e de outros sectores da população em defesa dos seus direitos, dos seus salários e dos seus postos de trabalho. As acções de luta já realizadas, de que a jornada de luta promovida ontem pela CGTP é expressivo testemunho, com níveis de adesão assinaláveis, na área da justiça, das forças de segurança, dos militares, dos professores e enfermeiros, dos trabalhadores da administração pública e de numerosas empresas do sector privado constituem uma firme e indispensável resposta dos trabalhadores a esta ofensiva e pela exigência de políticas alternativas que valorizem a sua situação profissional, que dignifiquem a sua actividade e preservem os seus direitos e conquistas sociais.

Solidário com a luta dos trabalhadores e activamente empenhado na sua dinamização o Comité Central do PCP sublinha o papel essencial da resistência e do protesto na defesa dos interesses, direitos e conquistas e na construção de um caminho capaz de impor uma viragem na política e orientações de direita que há longos anos comandam os destinos do país.

II

1. O desenvolvimento da pré-campanha das presidenciais confirma a justeza da decisão do PCP de se apresentar e disputar estas eleições com um candidato próprio. A distinta natureza e posicionamento da candidatura de Jerónimo de Sousa face aos cruciais problemas nacionais e internacionais que com clareza se revelam quando comparados com quaisquer dos outros candidatos, trazem à candidatura de Jerónimo de Sousa acrescidas responsabilidades e um papel indelegável nesta batalha política.

O Comité Central do PCP sublinha a enorme importância desta batalha eleitoral e apela a todos os militantes para uma empenhada contribuição na construção de uma alargada campanha de esclarecimento.

2. Num quadro em que o carácter distintivo, pelo seu objectivo e conteúdos, da candidatura de Jerónimo de Sousa se evidenciava perante as candidaturas já antes conhecidas de Mário Soares e Francisco Louçã, a apresentação já no mês de Outubro das candidaturas de Manuel Alegre e Cavaco Silva só veio confirmar tal facto. Fica assim claro que só na candidatura apresentada pelo PCP se encontram com clareza a centralidade dada aos problemas dos trabalhadores e do povo português, a denúncia clara da política de direita e da sua responsabilidade no agravamento dos problemas do País, a clara formulação e a acção consequente com o objectivo de derrotar os projectos que se agregam no candidato da direita, a enunciação de uma política alternativa articulada com um forte enraizamento social e capacidade de organização e de luta, a confiança na conquista de uma política diferente e de esquerda indispensáveis a uma vida melhor e a um Portugal com futuro.

3. Na verdade a candidatura de Manuel Alegre, refugiada numa pretensa independência face aos partidos («independência» que só se verifica por ter visto negado o apoio do partido socialista) e suportada numa inconsistente postura crítica sobre o estado do País (como se o próprio não fosse há trinta anos deputado e dirigente do PS com participação e responsabilidades nas políticas de direita de sucessivos governos), parece sobretudo centrada numa disputa com o outro candidato da sua área política e por uma atitude de desvalorização, e até branqueamento, de Cavaco Silva e das consequências de um seu eventual êxito eleitoral.

4. A candidatura de Cavaco Silva não constitui, e muito menos introduz, qualquer elemento de novidade. Encenada e preparada há largo tempo o seu anúncio confirma no essencial a formalização de um projecto cuidadosamente construído pelos sectores mais à direita da sociedade portuguesa. Apresentada como providencial e messiânica, a candidatura de Cavaco Silva, e do seu círculo de apoio, evidencia nestes primeiros momentos da sua afirmação, e apesar dos esforços para a manter num registo tolerante e de não confronto com a Constituição, traços que não podem ser subestimados: a ostensiva afirmação de distanciamento da política e de desvalorização dos partidos que, apesar do logro que constitui, introduzem uma perigosa deriva antidemocrática; o indisfarçável projecto de uso da Presidência da República para uma intervenção executiva que, ao arrepio dos limites constitucionais, invadiria poderes e responsabilidades de outros órgaõs de soberania; a ideia, ainda que não abertamente explícita, de uma candidatura forte, com «mão e pulso» para impor, autoritariamente, as alegadas reformas que faltariam ao país e que mais não visam que, ao serviço de uma maior concentração da riqueza, um acentuar sem precedentes das medidas antisociais contra os interesses dos trabalhadores e do povo. Cavaco Silva e a sua candidatura, não é só o que a memória desvenda enquanto protagonista e responsável por uma década de governação marcada por uma violenta e repressiva ofensiva contra os trabalhadores e os seus direitos, pelo agravamento dos problemas económicos do país, pela arrogância e intolerância democrática de que a carga policial da Ponte 25 de Abril é apenas uma das suas expressões. O que esta candidatura representa sobretudo é o polo de um projecto mais vasto onde se reúnem e agregam os sectores mais reaccionários e revanchistas do grande capital nacional, os que aspiram ao ajuste de contas com Abril e os que vêem em Cavaco, e na dinâmica que em redor dele se criar, o autoritarismo a que aspiram para prosseguirem sem sobressaltos a sua acção de voragem do país e dos seus recursos.

A concentração de apoio dos grandes grupos económicos e das principais confederações do grande patronato, o perfilamento editorial de grandes meios da comunicação social ao serviço da sua promoção e o que vai sendo desvendado quanto aos objectivos desta candidatura são sinais de uma dinâmica e de um projecto que as forças democráticas e os trabalhadores não podem subestimar.

Cavaco Silva e a sua candidatura não constituem, antes pelo contrário, qualquer risco para o prosseguimento e aprofundamento das políticas neoliberais que, quer pela mão do PS ou do PSD, o país tem conhecido. Mas sem dúvida que introduzem elementos que não só tendem a reforçar os interesses dominantes como, em seu nome, podem conduzir a novos e mais violentos ataques a direitos e conquistas sociais e ao aprofundamento das ameaças ao regime, às liberdades e à democracia conquistadas com o 25 de Abril.

3. O Comité Central do PCP sublinha a necessidade do desenvolvimento de uma campanha eleitoral marcada pelo intenso trabalho de esclarecimento que centrada na situação do país e nos problemas nacionais, contribua para: afirmar um novo rumo para a política nacional; dar combate à política anti-social do governo do PS e denunciar as suas consequências para a vida do país e dos portugueses bem como a contribuição que essa política traduz de favorecimento do candidato da direita às presidenciais; evidenciar que o voto na candidatura de Jerónimo de Sousa é o único que dará expressão, com clareza e coerência, à insatisfação e protesto face aos problemas do país e às políticas e ofensiva do actual governo; sublinhar a importância de dar força a uma candidatura que, distintamente, vê no exercício presidencial um espaço de contribuição para valorizar os direitos e conquistas sociais, para defender o aparelho produtivo e promover o emprego, para construir um país mais justo socialmente e equilibrado territorialmente, para afirmar um Portugal respeitado, soberano e independente. Uma campanha que com coragem possa, como nenhuma outra, denunciar os projectos e objectivos do candidato da direita, avivar a memória sobre o seu passado e responsabilidades na situação do país. Uma campanha que assegure pelos votos e expressão eleitoral obtidos a afirmação do projecto e valores da candidatura e contribua para a derrota dos objectivos da direita, condições indispensáveis para o prosseguimento da luta para derrotar as políticas de direita e abrir caminho a uma política alternativa que dê futuro a Portugal e aos portugueses. Uma campanha que afirme a candidatura de Jerónimo de Sousa — a candidatura de esquerda, coerente e combativa, vinculada aos valores de Abril — como aquela que comporta um elemento de esperança e que, com confiança e determinação, não desiste de Portugal e se bate por um projecto de mudança indispensável a um País mais desenvolvido e mais justo.

III

A nova fase de concretização das orientações e medidas para o reforço do Partido, definidas pelo 17º Congresso, que agora se inicia associa-se a um vasto conjunto de iniciativas que vão ter lugar em 2006:

— As comemorações do 85º aniversário do Partido que, com as muitas iniciativas que por todo o país terão lugar, devem ser momentos importantes de afirmação do Partido, da sua identidade e objectivos, nomeadamente de divulgação do nosso projecto libertador e transformador;

— A passagem do 75º aniversário do órgão central do Partido, o “Avante!”, com a realização de iniciativas que potenciem o alargamento da sua leitura e divulgação, valorizando e afirmando o seu papel ímpar na informação e no esclarecimento político e ideológico;

— A 30ª “Festa do Avante!”, a realizar nos dias 1, 2 e 3 de Setembro, deverá integrar-se neste importante objectivo mais geral do Partido — fazer de 2006 um ano de grande afirmação do que somos e queremos para Portugal e para os portugueses;

— O 8º Congresso da JCP, marcado para 20 e 21 de Maio, em Vila Nova de Gaia, sob o lema “Transformar o Sonho em Vida” deve ter na sua preparação, concepção e realização o objectivo de fortalecer a Juventude Comunista Portuguesa e afirmar o ideal e o projecto comunista junto da juventude, prosseguindo os objectivos decididos pela Direcção Nacional da JCP;

— O assinalar do centenário do nascimento de Fernando Lopes Graça e dos 70 anos da abertura do campo de concentração do Tarrafal.

A par destas iniciativas e no quadro da sua actividade internacional o PCP tem em preparação a realização, por ocasião do aniversário do Partido, dum Encontro Internacional subordinado ao tema «Europa e União Europeia – realidades, experiências de luta e novas oportunidades de transformação», visando o fortalecimento da cooperação dos partidos comunistas e outras forças de esquerda.