Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, Apresentação do Compromisso Eleitorial do PCP

«O Compromisso Eleitoral que apresentamos é um compromisso com os trabalhadores e o povo cuja concretização depende da sua mobilização e luta»

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A dimensão e profundidade dos problemas com que o País está confrontado, aqui já expostos, colocam na ordem do dia a necessidade de uma política alternativa, de uma política patriótica e de esquerda que, no essencial, se fixou no Programa Eleitoral que apresentámos em 2019 ao povo português.

É um facto que se passaram dois anos. Dois anos profundamente marcados pelos impactos da epidemia. Mas dois anos que não só mostraram o quanto importante teria sido terem-se adoptado muitas das opções e medidas então apontadas no Programa Eleitoral apresentado pelo PCP, como confirmaram a sua actualidade e validade futura.

O Compromisso Eleitoral que hoje aqui apresentamos deve ser por isso apreendido como um desenvolvimento do Programa de 2019, em que se procura dar uma maior visibilidade e responder a dez questões cruciais para a vida e o futuro do País.

Uma resposta que esteja comprometida com os valores de Abril, cujo 50.º aniversário da Revolução se assinalará em breve, e que vise o aprofundamento da democracia nas suas vertentes política, económica, social e cultural, indissociável do processo de superação do capitalismo com a sua natureza exploradora, opressora, agressiva e predadora.

Uma resposta que enfrente e rompa com os interesses do grande capital e que assuma a libertação do País da submissão ao Euro e das imposições da UE, e que assuma uma estratégia soberana de desenvolvimento e uma política externa assente na paz e na cooperação.

Uma resposta que passe pela recuperação de instrumentos de soberania; que reclame o controlo público dos sectores e empresas estratégicas; que aposte na produção nacional como questão decisiva para o emprego, o desenvolvimento, a soberania e a diminuição da dependência e endividamento externos.

Estas são questões centrais que um governo comprometido com os interesses nacionais deverá prosseguir. .

Como primeira e crucial questão para o desenvolvimento do País está a necessidade do aumento geral dos salários enquanto emergência nacional.

Portugal é um País marcado por uma crescente desigualdade entre capital e trabalho. O modelo de baixos salários é um factor de atraso e não de competitividade como alguns dizem. É necessário o aumento geral dos salários, para dinamizar o mercado interno, garantindo procura às MPME, condição para estimular a actividade económica e a produção nacional, assegurar a permanência em Portugal da força de trabalho necessária ao desenvolvimento do País, garantir mais receitas para o Estado e a Segurança Social.

A valorização dos salários é inseparável da eliminação das normas gravosas da legislação laboral, designadamente com a revogação da caducidade da contratação colectiva e a reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, repondo a negociação colectiva.

É preciso combater a precariedade, assegurando o princípio de que a um posto de trabalho permanente deve corresponder um contrato efectivo de trabalho.

É preciso que os benefícios decorrentes dos avanços tecnológicos também sejam aplicados na melhoria das condições de trabalho; na redução geral do horário de trabalho para as 35 horas semanais, no combate à desregulação dos horários, na eliminação de tarefas penosas e dos ritmos intensivos de trabalho, na garantia dos direitos no trabalho por turnos.

Propomos o aumento geral dos salários, com um significativo aumento do salário médio, concretizando a convergência com a Zona Euro em 5 anos, a valorização das profissões e das carreiras, a elevação do Salário Mínimo Nacional para 850 euros a curto prazo, fixando o seu valor em 800 euros durante o ano de 2022. Valorização que compreende os trabalhadores do sector privado e da Administração Pública garantindo, entre outras medidas, a recuperação e valorização do poder de compra.

O aumento dos salários é também uma questão igualmente decisiva e intimamente ligada à resposta ao défice demográfico do País. Inseparável também da valorização dos direitos das crianças e dos pais. O incentivo à fixação de jovens e à natalidade é decisivo para a substituição de gerações no futuro e para o desenvolvimento do País.

O respeito pelos direitos das crianças e pelo seu desenvolvimento integral, a par da inversão da quebra demográfica, exige soluções transversais, integradas e duradouras, que garantam estabilidade no emprego, nos horários e na habitação, bem como o aumento dos salários.

Entre outras medidas que identificamos, destacamos aqui o objectivo de assegurar a gratuitidade das creches para todas as crianças e a criação de uma rede pública de creches, ou soluções equiparadas, alargando em cem mil o número de vagas.

Por outro lado, o aumento da esperança de vida é uma marca de progresso civilizacional, que deve ser valorizada e prosseguida. Importa garantir que mais anos de vida são acompanhados de melhores condições de vida.

Portugal tem de garantir justiça social aos reformados, pensionistas e idosos, a quem contribuiu para este País com uma vida inteira de trabalho. Garantir melhores pensões no futuro implica valorizar hoje os salários, as carreiras, as profissões, implica combater a precariedade. Um sistema de Segurança Social e bem financiado exige também o reforço e a diversificação das fontes de financiamento, completando-as com uma contribuição que tenha em conta o Valor Acrescentado Líquido das empresas..

No imediato, propomos a actualização anual de todas as pensões, incluindo das que estiveram congeladas, assegurando a reposição e valorização do poder de compra, com um valor mínimo em 2022 de 10€. Propomos igualmente que se assegure o direito à reforma para quem tenha 40 anos de descontos, acabar com o famigerado factor de sustentabilidade e voltar a colocar a idade de reforma aos 65 anos, eliminando também as penalizações sobre os pensionistas empurrados para reformas antecipadas.

Tal como nas creches, também aqui é preciso alargar a resposta às necessidades da população idosa, assegurando a criação de uma rede pública de equipamentos e serviços de apoio à terceira idade, entre os quais lares, e à deficiência, a complementar e articular com a actual rede de apoio.

Se há conclusão que podemos retirar deste período de combate à epidemia é a da importância do Serviço Nacional de Saúde. A grave situação do SNS exige respostas imediatas. A saída em larga escala de profissionais está a reflectir-se no aumento dos utentes sem médico de família, no atraso nas consultas, exames, tratamentos e cirurgias, que põem em causa o direito à saúde dos portugueses. A não existirem medidas urgentes que permitam fixar e atrair profissionais, concretizar os investimentos em equipamentos e infraestruturas e combater o desvio de recursos públicos para o sector privado, o SNS poderá ser irremediavelmente diminuído e descaracterizado.

Entre outras medidas, é fundamental instituir a opção de dedicação exclusiva dos médicos e enfermeiros. É preciso também garantir incentivos que tornem atractiva a opção, de médicos e enfermeiros, pela fixação em zonas carenciadas, tal como se impõe a construção de infraestruturas já decididas e programar o conjunto de outras, inclusivé obras de reabilitação e requalificação do parque de instalações do SNS.

Na verdade, é preciso assegurar o desenvolvimento de todos os outros serviços públicos, revertendo os processos de transferência de competências para as autarquias, repondo freguesias que foram extintas, reabrindo serviços que foram encerrados e reforçando os existentes, garantindo a cobertura do território nacional, recrutando os milhares de profissionais em falta e revalorizando as suas carreiras na justiça, na saúde, na segurança social, nas forças e serviços de segurança, e nas restantes funções administrativas e públicas.

Na Escola Pública, é urgente combater a carência de professores que atinge centenas de milhar de alunos, vinculando todos os professores com três ou mais anos de tempo de serviço e criando incentivos à sua fixação nas áreas que deles mais carecem. Ao mesmo tempo, é preciso avançar para a contratação de mais 6 mil trabalhadores não docentes até 2023, tal como o reforço de outros profissionais e reduzir o número de alunos por turma e o número de turmas por professor. Tal como é preciso assumir no domínio da cultura uma política que assegure condições de trabalho aos seus profissionais e à criação artística, a democratização da cultura e da fruição cultural, concretizando no imediato a nossa proposta de 1% do Orçamento do Estado para o sector.

Num outro plano, é preciso responder aos velhos e novos problemas com que o País está confrontado em matéria de habitação e transportes. Como é sabido, o chamado novo regime do arrendamento urbano provocou milhares de despejos, associados também à pressão decorrente do turismo e do investimento estrangeiro desregulados e da especulação imobiliária. Os preços das rendas de casa dispararam, os contratos de arrendamento tornaram-se precários, a oferta pública deixou praticamente de existir.

É preciso Revogar a Lei do Regime de Arrendamento Urbano e a adopção de um quadro legal que combata a especulação, regule preços e assegure estabilidade nos contratos de arrendamento por um período mínimo de 10 anos para novos contratos. É necessário alargar a oferta pública de habitação em mais 50 mil fogos e mobilizar recursos para habitação a custos controlados.

E depois do avanço que constituiu a redução do valor do passe nos transportes públicos, impõe-se um forte investimento público no alargamento da oferta a todo o País, bem como assegurar a progressiva gratuitidade dos transportes públicos, a começar pela gratuitidade até aos 18 anos em 2022.

As soluções que apresentamos para o aumento dos salários e das pensões, para a melhoria dos serviços públicos e reforço das funções sociais do Estado, são inseparáveis da avaliação que fazemos de que não só existem os meios necessários para o fazer, como esses mesmos meios podem ser alargados e reforçados se outras forem as opções políticas.

Neste domínio a receita fiscal é um dos instrumentos de que o Estado dispõe para cumprir as suas missões. O volume dos impostos e contribuições arrecadados em Portugal não está longe da média europeia. Está é mal distribuído, pesando essencialmente sobre os trabalhadores e as MPME e concentrado nos impostos indirectos (mais injustos), ao mesmo tempo que o grande capital acumula privilégios.

Com mais justiça fiscal é possível obter mais receita. Consideramos que é possível enfrentar a corrupção, os privilégios e a fuga do grande capital ao pagamento de impostos, designadamente por via dos offshores e desagravar a tributação sobre o trabalho e as MPME. É justo avançar com a tributação do património mobiliário, implementar o englobamento obrigatório de todos os rendimentos para os contribuintes do actual último escalão de IRS, ao mesmo tempo que queremos desagravar a tributação sobre os rendimentos mais baixos e intermédios no IRS, nomeadamente aumentando os escalões, o valor do mínimo de existência e da dedução específica.

A redução do peso dos impostos indirectos – os mais injustos socialmente – passa, entre outras medidas pela reposição do IVA sobre a electricidade e o gás nos 6%, assegurando a mesma taxa para o gás de botija.

Não prescindimos também de políticas na área da energia que assegurem um Plano Energético Nacional, capaz de promover a redução dos preços da energia; a utilização racional e a eficiência energética; o maior aproveitamento de recursos endógenos, particularmente das renováveis. Opções contrárias às que têm vindo a ser impostas ao País e que passam pela recuperação do seu controlo público deste sector, num quadro em que é preciso desamarrar a transição energética dos interesses do capital monopolista e transnacional.

A situação ambiental do País é marcada pela privatização de sectores fundamentais como a água, a energia ou os resíduos. A abordagem às alterações climáticas, seja no domínio da mitigação, seja em relação à adaptação, caracteriza-se pela insuficiência e desadequação de medidas, assentes em «soluções de mercado», que revelaram já a sua ineficácia e perversidade.

Ao contrário da instrumentalização que está a ser feita em torno das alterações climáticas, são necessárias medidas que sejam eficazes na mitigação e adaptação a esta realidade. Medidas de ordenamento do território, abarcando várias dimensões, com particular enfoque na floresta, de limitação dos modos de produção intensiva e superintensiva e tendo em vista a promoção, conservação e recuperação da biodiversidade e o incentivo à produção e consumo locais, no quadro de um estímulo mais geral à produção nacional.

A promoção do acesso, utilização e salvaguarda dos recursos hídricos, com garantia da sua gestão e propriedade públicas, são igualmente opções que assegurem no presente e para as gerações futuras, esse bem essencial à vida, como é a água. .

Por fim, uma última palavra sobre as opções que consideramos necessárias a um crescimento e desenvolvimento económico que responda aos desafios que se irão colocar nos anos mais próximos.

Queremos assegurar um significativo crescimento do investimento público – fixando como referência 5% do PIB ao ano, o que envolve não só uma ajustada e integral execução do Plano de Recuperação e Resiliência e dos demais Fundos Comunitários, e uma forte promoção do investimento empresarial, mas também a mobilização de outros recursos que garantam esse objectivo.

É preciso avançar de facto com a reindustrialização, em vez de assistirmos ao encerramento de activos estratégicos como está a acontecer novamente em Portugal, desta vez em nome de ditas preocupações com o clima.

É preciso substituir importações por produção nacional, aumentar o valor acrescentado nacional e a componente nacional nas exportações; investir na produção nacional designadamente de alimentos, medicamentos e meios de transporte como temos vindo a propor ao longo destes anos.

Promover o desenvolvimento da agricultura familiar, da pesca artesanal e costeira e das cooperativas, visando a soberania e segurança alimentares.

E assegurar o desempenho presente e futuro de empresas estratégicas, com destaque para opções urgentes que o País precisa de tomar, como é o caso da TAP assegurando o seu desenvolvimento futuro e enfrentando os que no País e na União Europeia estão apostados em descaracterizar, diminuir e destruir a nossa companhia aérea.

O PCP nunca se desviou do objectivo de encontrar soluções para os problemas do povo e do País. Foi a força que mais se bateu pela concretização de avanços de que damos também nota no Compromisso Eleitoral que hoje apresentamos.

Como a vida provou, os trabalhadores e o povo podem contar sempre com o PCP.

A situação do País exige uma política alternativa patriótica e de esquerda. Uma política alternativa que reclama um governo capaz de a concretizar, com todos os que dêem prioridade às soluções que a situação exige.

É essa perspectiva de alternativa que o PCP defende. Convergir na resposta concreta aos problemas - é essa a determinação do PCP. É isso que é necessário.

O Compromisso Eleitoral que hoje aqui apresentamos, e que divulgaremos ao longo das semanas que nos separam do dia 30 de Janeiro, é um compromisso com os trabalhadores e o povo cuja concretização depende da sua mobilização e luta. Propostas e soluções para um Portugal com futuro, que terão tanto mais força para se tornarem uma realidade na vida do povo português quanto mais força a CDU obtiver nas próximas eleições legislativas.

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