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Comício do 85º Aniversário do PCP - Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP


Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP
no no Comício do 85º Aniversário do PCP, em Almada

Aqui estamos a celebrar os oitenta e
cinco anos de vida do nosso Partido, a comemorar o aniversário
do Partido com a consciência da nossa própria razão
de ser, com a convicção dos nossos ideais e objectivos,
com o orgulho do nosso passado e da história de 85 anos de
luta ao serviço dos trabalhadores, do povo português e
de Portugal a lutar no presente, a pensar e a acreditar, com
confiança e determinação no futuro do Partido,
da democracia e de Portugal.

Enganaram-se todos aqueles que
esperavam ver-nos desiludidos, desanimados, abandonando objectivos e
ideais, deixando cair o sonho, o projecto político, a acção
revolucionária. Enganaram-se todos aqueles que, confundindo
desejos com realidades, determinaram, nos seus escritos, sentenças
e profecias, o “definhamento irreversível” do PCP.

Afinal frustrando tão intensos
desejos, tão violentas e sofisticadas campanhas, expressas em
toneladas de papel e quilómetros de fita, aqui estamos de pé,
determinados e confiantes a olhar e a caminhar para a frente, num
tempo em que surgem e persistem ameaças e perigos sombrios,
mas não perdendo de vista a linha de horizonte, nem o percurso
que temos de percorrer com as nossas energias, com a nossa
combatividade e convicção, transportando o nosso
projecto transformador e emancipador.

No seu pedestal de seguidores e
beneficiários do sistema, ou no pântano do seu
conformismo, não entenderam que este Partido vive e viverá
porque integra na sua análise, acção e luta os
verdadeiros problemas, necessidades, interesses e aspirações
populares, porque compreende que na história, a luta dos
trabalhadores e dos povos passa por avanços e recuos,
estagnação e progressos, vitórias e derrotas,
num processo milenário de transformações
sociais. Não entenderam que nós não abdicamos
nem nos afastamos da compreensão profunda de que são os
povos que acabam por decidir do seu próprio destino.

Há sempre quem subestime ou
procure esconder que este Partido foi construído, caldeado e
temperado devido à abnegação, coragem e heroísmo
de milhares de comunistas que, mesmo com a perda da vida, não
pretenderam que o Partido os acompanhasse na morte, mas que antes
continuasse em direcção ao futuro, pelas mãos,
empenhamento revolucionário e luta de outros comunistas que
hoje integram e virão a integrar o nosso grande colectivo
partidário.

85 anos é um longo e complexo
percurso carregado de profundas transformações da
realidade. E por isso não temos dúvidas que se o
Partido se tivesse quedado imóvel no pensamento e na acção,
teria morrido ou ficado reduzido à insignificância. E se
o comemoramos com esta pujança e confiança foi porque
aprendeu com Marx, Engels e Lénine, com a revolução
de Outubro e a experiência revolucionária de comunistas
de outros países. Mas, simultaneamente, aprendeu também
com a sua própria reflexão, a sua própria
experiência, ao longo de décadas, enriquecendo o seu
pensamento teórico, os seus objectivos, a sua acção
prática, procurando respostas novas perante novas situações.

Respondendo à situação
concreta de Portugal, assumindo lições e ensinamentos
aprendidos em mil lutas e batalhas, o nosso objectivo e projecto de
sociedade deixaram de obedecer a modelos, forjando, desenvolvendo e
cimentando a identidade própria deste Partido Comunista
Português. Lutas e batalhas sempre em defesa dos interesses e
direitos dos trabalhadores e das massas populares. Lutas e batalhas
pela liberdade e a democracia. Lutas e batalhas em defesa do
interesse nacional, da independência e da soberania. Lutas e
batalhas inspiradas pelos ideais da solidariedade internacionalista.

A história de 85 anos do PCP é
aquela que está expressa na sua acção e na sua
luta, que está inscrita nas suas decisões, resoluções
e Programa, história que é a própria história
da luta da classe operária e dos trabalhadores após as
duas primeiras décadas do século XX e os anos primeiros
deste século XXI.

Quem estude a história do
Partido encontrará em todo o seu percurso uma característica
essencial da luta do Partido, antes e depois de 25 de Abril: é
ter sempre estado inseparavelmente ligado à defesa dos
interesses dos trabalhadores e à sua luta, por sua vez
inseparável da actividade e da luta do Partido. Não
significa esta característica marcante que o Partido tenha
intervido e intervenha na sociedade como força do trabalho mas
também da inteligência e da cultura que contasse e conte
nas suas fileiras militantes oriundos de diversas camadas e classes
sociais, que abraçam a causa do socialismo, que tenha surgido
como dinamizador de grandes movimentos democráticos unitários.
Mas o que foi e é determinante e predominante no quotidiano da
acção do Partido e se transformou em duas realidades
inseparáveis: luta dos trabalhadores - luta do PCP.

Este é também o ano em
que comemoramos os 75 anos do «Avante!». A
história do «Avante!» ao longo dos seus 75
anos de vida, é indissociável da história do
PCP, da sua luta e da luta dos trabalhadores e do nosso povo pela
liberdade, pela democracia e o socialismo. Comemorar os 75 anos do
«Avante!» é saudar a coragem e a dedicação
de gerações sucessivas de comunistas que, com
inteligência, capacidade e engenho, construíram e
constróem um jornal que é um dos mais notáveis
exemplos na imprensa clandestina de todo o mundo e que no Portugal de
Abril se assumiu como voz da luta, da democracia e do progresso.

Celebrando os 85 anos de vida do
Partido, homenageamos todos os seus construtores que ao longo das
suas vidas e até ao momento da sua morte se mantiveram firmes
no seu ideal comunista. Mas julgo que, sem esquecer ninguém, é
justo que lembremos, neste aniversário que pela primeira vez
não conta com a sua presença, o nome do camarada Álvaro
Cunhal.

Ao falar deste Partido, da sua
história, da sua prática, natureza e ideologia, das
suas características fundamentais, dos seus métodos e
avanços teóricos, do seu Programa, temos de referenciar
como intrínsecas à vida deste Partido, a vida, a obra,
a luta de Álvaro Cunhal. A sua inteligência, a sua
coragem, o seu humanismo, a sua ética política, as suas
convicções, são indissociáveis do Partido
que temos e do Partido que somos. Construtor e defensor do Partido,
quando alguns pensaram descaracterizá-lo, fraccioná-lo
e transformá-lo noutra cosia que não num partido da
classe operária e de todos os trabalhadores, num Partido
Comunista.

Não pretendendo fazer balanço
de toda a sua obra teórica, política e revolucionária,
reafirmamos hoje aqui, neste aniversário, que estamos a
cumprir hoje, e tudo faremos para realizar no futuro, o seu mais
fundo sonho e ideal – de prosseguir todos os combates para que este
Partido se mantenha como Partido com uma natureza de classe, Partido
de projecto revolucionário na luta pelo socialismo –
ancorados no seu pensamento e contribuições teóricas,
no seu exemplo de comunista. Mas ouvindo aqui os jovens comunistas
ele gostaria de gritar a sua palavra de ordem: A luta continua!

Comunistas do nosso tempo, firmes no
nosso ideal, usando o marxismo-leninismo, com a concepção
do seu permanente enriquecimento pelo estudo de novas situações
e fenómenos, processos, conhecimentos e experiências,
mas assumindo-o como instrumento insubstituível para a análise
das realidades, procuramos a explicação das novas
realidades do mundo e do país em movimento.

Nós sabemos do peso das
mutações nos sistemas económicos e na sua
interacção e relacionamento, dos efeitos das derrotas
do socialismo e da actual relação de forças, da
inevitabilidade objectivamente considerada do aprofundamento da
divisão internacional do trabalho, das alterações
na composição social da classe operária, da
necessidade de encontrar novas formas de cooperação
internacional nas esferas científica e tecnológica, da
tarefa crucial de toda a humanidade em defesa da paz, da busca de
soluções para problemas ecológicos e ambientais,
da fome, da doença, do esgotamento dos recursos naturais, da
explosão demográfica que colocam novas exigências
de cooperação entre os povos e os Estados
independentemente do seu sistema social ou regime político.

Mas também sabemos que tais
realidades não eliminam os antagonismos de classe nas
sociedades capitalistas e a luta de classes como motor da evolução
social e política. Sabemos que o mundo hoje está mais
inseguro, mais injusto, menos democrático. E os que abdicam
desse instrumento de análise e guia de acção
consubstanciado nas teses de Marx, Engels e Lénine,
precipitaram-se na avaliação conducente ao dogma de que
o mundo caminhava para um sistema socioeconómico único,
que era possível civilizar e democratizar o capitalismo, que o
Estado estava a perder a sua natureza de classe, que a luta de
classes deixou de ter sentido, logo deixava de existir a necessidade
dos Partidos Comunistas.

E não será motivo de
reflexão para os que (admitindo até que com objectivos
justos) consideram e procuram outras fontes de análise, outras
formas de organização, outras prioridades de
intervenção, o facto de hoje os centros de decisão
mais exacerbados do grande capital proporem a criminalização
do comunismo e do marxismo-leninismo por receio da sua atracção
e irradiação junto dos trabalhadores e dos povos, por
medo da sua actualidade e validade, pondo em risco a relação
de forças a seu favor e a sua sede predadora de exploração
e opressão que é intrínseca à sua própria
natureza?

Procuramos sempre aprender com a
experiência dos outros. Mas bem bastava a situação
que hoje vivemos em Portugal, os perigos que decorrem para a
democracia motivados por políticas de classe levadas por
diante nas últimas décadas para avaliar a justeza da
nossa análise!

Se quisermos fazer uma síntese
do balanço de um ano de governação PS basta
pensar e demonstrar que hoje a economia está estagnada, há
mais desemprego, há mais desigualdades sociais e regionais, há
mais concentração da riqueza e alargamento da pobreza.

A ofensiva contra as estruturas
socioeconómicas instauradas pela Revolução de
Abril permanece hoje pela mão do governo PS/Sócrates
com novas e nefastas consequências nas vertentes da democracia
social, cultural e política.

Neste ano que leva de governação,
assumiu por inteiro a herança das políticas de
concentração e restauração dos grandes
grupos económicos monopolistas dos seus antecessores,
consolidando e reforçando, com a sua política, o poder
dominante do grande capital na economia nacional.

Assim tem sido com a política
fiscal, a política de rendimentos (preços e salários),
a política orçamental, assim é com o recente
anunciado programa privatizações, dando mais um passo
na destruição das estruturas económicas que
deveriam sustentar uma política económica democrática
ao serviço do povo e do país.

O PS, com o aplauso do PSD e CDS-PP,
mais uma vez coloca nas mãos dos grandes grupos económicos
e financeiros, a pretexto da resolução imediata dos
problemas orçamentais ou da redução momentânea
da dívida pública, empresas altamente rentáveis
que se juntam a outras que eram e são, em conjunto, essenciais
para a aplicação de uma política de
desenvolvimento nacional e para assegurar as condições
básicas à garantia, ampliação e
aperfeiçoamento de uma democracia social, política e
cultural.

A política de privatizações,
instrumento central da política de direita de concentração
capitalista, apenas agudiza a crise estrutural que o país
enfrenta e fragiliza a capacidade de resposta do país no
combate à crise.

A experiência dos processos de
privatização já mostrou bem ao que conduziu:
levou à redução da actividade produtiva, ao
agravamento dos problemas orçamentais, ao agravamento do
desemprego e ao aumento dos preços dos serviços
públicos, à diminuição dos direitos dos
trabalhadores e ao aumento das desigualdades sociais.

Não é a vender o
património público, desviando milhares de milhões
de euros do Orçamento do Estado que se garantem no futuro as
tão apregoadas finanças públicas saudáveis.
Com o novo pacote de privatizações de importantes
empresas, em cada ano, são mais cerca de 950 milhões de
euros só pela via dos seus lucros que deixam de contar do lado
das receitas para responder às necessidades de desenvolvimento
do país.

Também não é com
esta política de subordinação às
estratégias e aos interesses dos grandes grupos económico
e financeiros que se garante a soberania nacional e se mantêm
os centros de decisão da economia em mãos nacionais. A
verdade é que com tais decisões, mais cedo ou mais
tarde, os centros de decisão vão passar, como tem
acontecido, para a mão do capital transnacional.

A subordinação da
economia nacional e o ajustamento das estruturas socioeconómicas
às necessidades dos grandes interesses, particularmente do
capital financeiro e da sua política de acumulação
de capitais e de concentração de riqueza não
está apenas dependente da política de privatizações
dos sectores e dos negócios mais suculentos, mas também
de um conjunto de sofisticados mecanismos de exploração
dos trabalhadores e do povo e dos diversos sectores da economia
nacional.

É uma escandalosa evidência
que todo o país passou a trabalhar para engordar os grandes
grupos económicos, particularmente os que dominam a banca.
Anos consecutivos de crise e dificuldades para o povo e para o país,
os mesmos anos ininterruptos de obscenos lucros da banca.

Em 2005, eis novamente lucros
desmedidos em tempo de crise. Basta ver a amostra de três dos
principais bancos privados, o BCP, BPI e BES que apresentam um
aumento médio global dos seus lucros de 56%, um valor que
corresponde a um lucro de 1 300 milhões de euros.

Lucros que são o resultado do
estrangulamento financeiro de milhares de micro, pequenas e médias
empresas, submetidas a volumosos níveis de endividamento,
enormes restrições de crédito e elevados
serviços de dívida. Lucros que resultam do pagamento de
brutais e especulativos custos dos serviços bancários.

O mesmo para milhares e milhares de
portugueses, cujo elevado endividamento, atinge o valor recorde de
124% do rendimento disponível da generalidade das famílias
portuguesas, elas também submetidas às draconianas
comissões bancárias.

Comissões que apresentam um
crescimento acumulado de 46% entre 1986 e 2004 e que consubstanciam
um verdadeiro imposto que os portugueses e as empresas pagam à
banca e cujo peso, per capita ronda hoje os 200 euros anuais.

Lucros que se explicam pelo brutal
tributo que pesa sobre o consumo e as empresas com a aplicação
de taxas de juro efectivas muito superiores às baixas taxas de
juro nominais de referência. Taxas de juro reais que atingem,
muitas vezes, os 20%, 24 e até 28% no consumo.

Mas este é também o
resultado da apropriação de escandalosos dividendos
pelas participações no capital nas grandes empresas de
energia, transportes, telecomunicações e outros
serviços e empresas como a Brisa, Portucel ou Cimpor, antes
públicas e agora total ou parcialmente privatizadas.

Empresas que garantem escandalosos
lucros à custa da exploração dos seus
trabalhadores e de uma política de preços dos seus
serviços excepcionalmente elevada, em detrimento também
da competitividade da generalidade das empresas portuguesas e do
crescente agravamento do custo de vida dos trabalhadores e do povo.

Lucros que são também o
resultado de novas descidas das taxas efectivas de IRC no ano de
2005, graças às vantagens fiscais de que continuam a
beneficiar. Taxas efectivas de imposto muito aquém da taxa
estabelecida de 25%. Na realidade é um escândalo que os
lucros, as comissões e as margens financeiras cresçam e
os impostos correspondentes decresçam.

São estes mecanismos de
exploração e de subtracção de recursos ao
povo e ao país, aos quais se acrescenta a desenfreada
exploração também dos trabalhadores bancários,
hoje com degradadas condições de trabalho.

Mas sendo esta a realidade, porque é
que o governo e o Banco de Portugal fazem vista grossa a este
escandaloso processo de extorsão financeira em prejuízo
do conjunto da economia portuguesa e dos rendimentos dos portugueses
e que afrontam os princípios fundamentais da Constituição
da República?

Porque a política de direita é
uma política de classe ao serviço dos grandes
interesses e dos grandes senhores do dinheiro e, por isso, a coragem
que o governo diz ter e diz ser necessária para impor aos
trabalhadores e ao povo cada vez mais sacrifícios, não
é a mesma para confrontar os grandes interesses e o grande
poder económico com os quais se identifica.

Diga o governo o que disser, na
verdade a crise não é para todos e muito menos é
paga por todos.

Diga o que o governo disser, não
há desenvolvimento harmonioso da economia nacional, nem
resposta às necessidades do seu crescimento e à
elevação da sua qualidade e capacidade de satisfação
das necessidades do país sem uma política firme e
determinada que confronte a usura de tais interesses.

É por isso também que o
governo olha com visível condescendência e compreensão
amiga o assalto do grande capital à PT desencadeado com a OPA
de Belmiro de Azevedo e aos direitos especiais do Estado (golden
share
) nesta empresa estratégica.

Operação que é
mais um passo no reforço do poder económico de uns
poucos, num quadro de crescente submissão do poder político
ao poder económico. Mais uma operação financeira
que nada cria, a não ser, mais especulação
bolsista.

Entretanto, aí temos com a
concretização da operação de
transferência de proprietário da PT a perspectiva do
desmantelamento da empresa e da eliminação de mais uns
milhares de postos de trabalho.

Aí temos também o
descaminho nos próximos anos pela via dos impostos e dos
lucros de uma nova fatia de receitas do Estado.

Não são os interesses
nacionais que ganham com tal operação, sejam eles os da
segurança, inviolabilidade das comunicação ou da
defesa nacional, mas apenas os interesses de Belmiro de Azevedo.

Um ano após a tomada de posse
do governo PS/Sócrates o que o país constata é a
agudização de todos os problemas a que conduziu a
desastrosa política dos governos do PSD/CDS-PP. Um ano após
a aplicação, no essencial, da mesma política, os
mesmos resultados, as mesmas consequências agravadas pela sua
persistência no tempo.

Se com os governos do PSD/CDS-PP o
desemprego foi sistematicamente assumindo dimensões cada vez
mais preocupantes, com o PS no governo ao fim de um ano o desemprego
atinge a mais alta taxa dos últimos 20 anos. São os
dados do desemprego de Janeiro que assim o dizem.

Se com os governos do PSD/CDS-PP
assistimos à contínua destruição do
aparelho produtivo nacional e à crescente dependência
económica do país, com o governo do PS, um ano passado
e o país combina uma grave situação de
estagnação com um brutal agravamento das contas
externas.

Contas que apresentam um défice
a crescer de 43% durante o ano de 2005, este sim um défice
muito mais decisivo e preocupante que qualquer outro, incluindo o
orçamental.

É esta linha condutora que os
partidos do bloco central, ao serviço dos interesses dos
grupos económicos e financeiros, têm concretizado em
alternância no poder e que agora se apresentam para prosseguir
no futuro imediato, sobre a eufemista designação de
“cooperação estratégica”, sob a protecção
de Cavaco Silva.

Ao mesmo tempo que, paralelamente, o
PSD rebobina a fita do filme da oposição fictícia,
empolando aspectos secundários e encobrindo as suas próprias
responsabilidades na crise, para abrir um novo ciclo de ilusões
nesse “jogo político” já visto e revisto em que os
mesmos partidos se vão revezando no Governo em alternância,
mas sem que tal signifique realmente uma alternativa política
e políticas alternativas.

Só a falta de decoro permite à
direita, ao PSD e ao CDS-PP apresentarem-se como oposição
às mesmas políticas que eles próprios conduziram
nos dois últimos governos em que participaram e cujo conteúdo
antidemocrático e anti-popular teve as mesmas desastrosas
consequências que afirmam agora querer combater.

As alterações
produzidas nestes anos na estrutura socioeconómica, com a
reconstituição dos grandes grupos económicos
monopolistas e do seu domínio, condicionou e fez regredir as
outras componentes da democracia. A evolução da
sociedade portuguesa nestes anos últimos revelou mais uma vez
o carácter inseparável das quatro vertentes da
democracia – a económica, a social, a cultural e a política
– e o papel determinante da estrutura socioeconómica nessa
evolução.

À medida que a democracia
económica dava passos atrás com a subversão das
estruturas económicas sobre o controlo público e a sua
passagem para o controlo e domínio dos grandes grupos
económicos e financeiros, inflectia também num sentido
antidemocrático a política social e cultural e o
próprio regime político.

Foi assim que vimos no plano social,
para além do desemprego em massa, a progressiva liquidação
de direitos fundamentais dos trabalhadores, a generalização
da precariedade, o ataque ao salários e ao direito à
contratação colectiva de trabalho. Foi assim que vimos
desenvolver-se paralelamente uma poderosa ofensiva contra as funções
sociais do Estado e a sua privatização, visando a
desresponsabilização do estado das suas obrigações
nos domínios da saúde e da segurança social.

Se com os últimos governos do
PSD e CDS-PP o mais violento ataque aos direitos dos trabalhadores e
às suas organizações ficou patente no Código
de Trabalho. Esse Código, que espelha um profundo retrocesso
social. Com o governo do PS demarcando-se apenas em palavras da
ofensiva da direita e do seu Código que agora resiste a
revogar, assistimos ao aprofundamento da mesma política da
direita nas várias frentes contra os direitos dos
trabalhadores, com particular virulência contra os
trabalhadores da Administração Pública.

Não se trata apenas do ataque
aos seus direitos enquanto trabalhadores, como o congelamento dos
salários, agora pela sexta vez, do inadmissível
congelamento das carreiras, no inqualificável agravamento das
condições de aposentação, pela criação
de novas formas de desvinculação (despedimento), mas à
própria essência da função pública,
à natureza do seu estatuto de trabalhador da Administração
Pública com a introdução, em larga escala, do
regime de contrato individual de trabalho e da negação
do direito à contratação colectiva.

É esta política social
antidemocrática e anti-popular que transformou e continua a
transformar Portugal no país mais desigual da União
Europeia.

Na política cultural, vemos o
ressurgimento das componentes elitistas no ensino e em todas as áreas
da vida cultural. Foi assim também com últimos governos
do PSD/CDS-PP. É assim com o governo do PS, particularmente em
relação ao ensino, cuja prioridade tem sido uma brutal
ofensiva contra a escola pública, a gestão democrática,
os direitos dos docentes e alunos.

Na democracia política,
assistimos ao sucessivo caminhar para o empobrecimento e perversão
do regime democrático. Foi a aprovação de novas
leis sobre os partidos e o seu financiamento, impondo determinadas
formas de organização e funcionamento que limitam de
forma inaceitável a liberdade de associação
política. Foram e são a instrumentalização
do aparelho do Estado e a sua ocupação e
partidarização, bem como dos grandes órgãos
de comunicação social, mas também as tentativas
de governamentalização da justiça e do poder
político. Os bloqueamentos a uma eficaz fiscalização
da acção governativa. A criação de novos
serviços de informação e dessa solução
neoliberal – as Entidades Reguladoras monopolizadas na sua
composição pelos partidos do poder e pelos
representantes dos grandes interesses económicos sob o manto
da independência.

Esta evolução da
democracia política tem agora a sua continuação
nas anunciadas alterações aos sistemas eleitorais que
o PS acaba de anunciar como uma prioridade para 2006.

Alguns cidadãos menos
informados podem pensar que se é certo que o Governo do PS em
matéria de política económica, de política
social e sobre os direitos dos trabalhadores é uma repetida
desilusão, pelo menos no que toca à democracia política
não há motivos para alarme ou preocupação
com as orientações do PS, do seu Governo e da sua
maioria absoluta de deputados.

Infelizmente, isso nem de longe nem
de perto corresponde à verdade dos factos e à verdade
das intenções.

Porque a verdade é que o PS,
em significativa convergência com o PSD, ao voltar a anunciar o
seu urgente empenho em aprovar as alterações às
leis eleitorais para as autarquias locais e para a Assembleia da
República o que está a pensar é limitar e
desfigurar a democracia política consagrada na Constituição.

Quanto à lei eleitoral para as
autarquias, o PS e o PSD querem é dar um golpe profundo na
legitimação directa das populações, na
democraticidade do poder local, nos mecanismos de fiscalização
e controlo democrático do poder.

Quanto à lei eleitoral para a
AR que o PS – também aqui em significativa cumplicidade com
o PSD – quer alterar, é nossa estrita obrigação
democrática voltar a acusar o PS de pretender criar um sistema
eleitoral que, para além de confuso, complicado e
incompreensível para a maioria dos cidadãos, pretende
sobretudo favorecer e estimular a concentração de votos
no PS e no PSD, com prejuízos manifestos para todas as outras
forças.

É esse e só esse o real
e verdadeiro objectivo da tão falada criação de
círculos uninominais (ou seja, de círculos em que só
é eleito um único deputado – o que ganhar).

E tudo isto é sempre «vendido»
como sendo um grande serviço prestado à democracia pois
assim se garantiria uma alegada «aproximação dos
deputados aos eleitores».

E se, como dizem, o PS e o PSD estão
preocupados com o descrédito da política e propõem
estas soluções, é preciso dizer-lhes que o
divórcio, o descrédito e o afastamento das pessoas
resulta acima de tudo de uma política que não responde
aos anseios e aspirações dos trabalhadores e do povo e
de uma prática de certos políticos que nunca cumprem o
que prometem.

A
democracia tem que ser considerada, simultaneamente e em estreita
articulação, nas suas quatro vertentes fundamentais.

O
país não está condenado a prosseguir esta
política de desastre nacional ao serviço dos grandes
interesses. Há outro caminho. Outro caminho que pressupõe
uma ruptura democrática e de esquerda, uma real viragem de
rumo na política nacional. Política que assuma que não
há democracia social, nem democracia cultural, nem uma
efectiva democracia política, se não há
democracia económica. Isto é, se o poder económico
e financeiro, o domínio do país é exercido pelos
grandes grupos económicos e financeiros e se o bem-estar das
populações é sacrificado aos seus estreitos
interesses.

A
persistência no actual caminho encerra numerosos perigos não
só para o desenvolvimento do país, mas para a própria
democracia com a imposição de sistemas de engenharia
eleitoral que inviabilizem o aparecimento de alternativas ao bloco
central do poder e dos grandes interesses.

Por
isso, a exigência do reforço e aprofundamento da
democracia económica tem necessariamente que continuar a estar
no centro da intervenção e acção política
do partido, dos trabalhadores e das massas populares.

A
democracia económica, tal como temos afirmado e defendido é
incompatível com a destruição do aparelho
produtivo nacional e a liquidação de milhares de micro,
pequenas e médias empresas. Como é incompatível
com o processo privatizador dos sectores estratégicos da
economia nacional e dos serviços públicos essenciais à
vida das populações.

A
democracia económica pressupõe que o Estado assume um
forte e dinâmico Sector Empresarial nas áreas económicas
de importância estratégia para desenvolvimento e
modernos e sólidos Sistemas de Serviços Públicos
que concretizem as funções sociais do Estado nas áreas
da saúde, educação e protecção
social e o acesso a um conjunto de bens essenciais às
populações, como a água.

O
verdadeiro desenvolvimento exige o aumento do emprego e a melhoria
das condições de vida das populações em
todo o território nacional. Tal como exige uma política
de mobilização dos recursos e potencialidades nacionais
para o desenvolvimento da indústria, agricultura e pescas.

A vida mostra que não são
as políticas de direita que podem dar resposta aos problemas
de um país com uma economia periférica, enormes défices
estruturais e com significativos atrasos que urge vencer.

É preciso e necessário
romper todo este colete-de-forças que amarra a democracia
portuguesa e bloqueia o desenvolvimento do país. É
preciso e necessário abrir a luta em todas as frentes, mas
essencialmente é necessário apoiar e desenvolver a luta
dos trabalhadores e do povo.

Luta que é
um elemento decisivo para obrigar o Governo a recuar nas
medidas injustas e desastrosas que anunciou e desencadeou e impedir
que prossiga o caminho de aprofundamento da política de
direita, que sacrifica os interesses do povo e do País.

Saudamos os trabalhadores que na
Administração Pública, no sector ferroviário
e em muitas empresas e sectores lutam pelos seus direitos e
interesses contra esta política nociva para o país.
Saudamos em particular a CGTP-IN que como obra ímpar
construída pelos trabalhadores portugueses continua, na sua
acção e na sua luta, a dar sentido à matriz
unitária, democrática, independente, de massas e de
classe. E aos trabalhadores e às suas organizações
lançamos um apelo: Sacudam as teses e os fabricantes do
conformismo e das inevitabilidades. Aos trabalhadores nunca e nada
foi dado. Foi sempre conquistado pela sua unidade na acção,
pela sua luta persistente, quase sempre dura e prolongada, mas com
avanços e resultados!

Nesta celebração
queremos manifestar a nossa admiração, solidariedade e
saudação a todos os trabalhadores, forças
revolucionárias e progressistas, a todos os povos que lutam,
resistem e dão passos adiante na defesa dos seus direitos de
democracia e de soberania e independência nacionais.

Sabendo e defendendo que hoje é
cada vez mais premente a internacionalização da
solidariedade e da luta, da procura permanente da convergência,
da cooperação e linhas de intervenção e
iniciativas comuns como resposta à cada vez maior articulação
do grande capital e das grandes potências na sua ofensiva de
exploração, opressão e guerra, partimos da nossa
característica de sermos um Partido patriota e
internacionalista.

Nós sempre defendemos uma
ideia base: cabe ao povo português, como a todos os povos do
mundo decidir do seu próprio regime económico, social e
político, da sua própria política interna e
externa, do seu destino, do seu futuro.

Outros partidos, de direita, o
próprio PS e até da área esquerdista, que no
passado nos acusavam de ser um partido estrangeiro, acusam-nos agora
de sermos um partido nacionalista ou, em linguagem mais rebuscada, um
partido “soberanista”. Teses que curiosamente são
defendidas por grandes potências ao proclamarem ultrapassada a
soberania de outros Estados enquanto vão obtendo para si
mesmos um monstruoso alargamento da sua própria soberania.

Nós, comunistas, somos
patriotas não somos nacionalistas. Patriotas de sempre e de
raiz, porque a nossa luta é com o nosso povo e na nossa
pátria. Mas só entendemos e assumimos esse patriotismo
porque não o dissociamos da nossa dimensão
internacionalista. Respeitamos e somos solidários com outros
povos porque respeitamos e amamos o nosso povo.

O PCP não só respeita
os interesses e direitos de outros povos e nações como
é para com eles profundamente solidário. Solidário
com todos os trabalhadores e povos que no mundo lutam contra a
exploração e a opressão, que lutam pela sua
independência, pela paz, pela democracia.

Fomos, somos e seremos solidários
para com os comunistas, as forças revolucionárias e
progressistas, com os que se opõem ao imperialismo, que
insistem em construir o socialismo, solidários com Cuba terra
livre na América, com o povo palestiniano e o seu direito
inalienável a um Estado independente.

Continuaremos a lutar por uma
política digna de Portugal de Abril, uma política de
independência nacional, de relações de amizade e
cooperação diversificadas com todos os povos do mundo.
Continuaremos a luta contra o envolvimento de Portugal na estratégia
expansionista e agressiva do imperialismo, quer se trate dos Estados
Unidos, da NATO ou da União Europeia, e contra a participação
de militares portugueses no Iraque e no Afeganistão. Aqui
desta Tribuna apelo à vossa participação na
concentração a realizar, no Largo do Camões em
Lisboa , no próximo dia 18 de Março, lembrando os 3
anos de invação e ocupação do Iraque.

Aqui estamos, inquietos mas
simultaneamente muito confiantes, animados por aquela esperança
que não fica à espera, prontos para os combates
quotidianos, estimulados pelos bons resultados das três
batalhas eleitorais recentes que, demonstrando também a esse
nível, a falência e a falácia da tese da
inevitabilidade do definhamento do PCP, criaram melhores condições
para concretizar com êxito o objectivo de considerar o ano de
2006 como ano de reforço do Partido. Ano para agarrar e
concretizar as decisões e orientações do XVII
Congresso no sentido de materializar o conceito integrado do reforço
da intervenção e reforço da organização,
direccionando a prioridade do nosso trabalho para as empresas e
locais de trabalho, prosseguindo e concretizando a deliberação
Sim, é possível um PCP mais forte!

Quero daqui anunciar que - tendo em
conta que neste mês de Março nos propusemos há um
ano atrás, conseguir 2500 novos recrutamentos de militantes
para o Partido – não só atingimos como ultrapassámos
a meta tendo hoje mais 2600 novos militantes, sendo justo referir
que a JCP, desde a Festa do Avante! até agora,
conseguiu 500 novos recrutamentos. Este reforço orgânico
do Partido vai servir não para ter, estar e mostrar. É
uma questão crucial para preparar melhor o Partido nas suas
respostas à situação, para intervir e agir a
todos os níveis da sociedade, mas fundamentalmente lá
onde pulsa o problema, a aspiração, lá onde se
trava e se desenvolve a luta dos trabalhadores, da juventude e das
massas populares, lá onde residem as causas e os destinatários
principais da razão de ser deste Partido Comunista, que
resistiu e lutou o tempo que foi preciso, que continua a interpretar
o sonho mais avançado, ainda que milenário, do ser
humano, de libertação e emancipação, que
se afirma como um grande colectivo capaz de impulsionar os avanços
progressistas de que a sociedade portuguesa carece, capaz de dar a
sua contribuição para relançar e reforçar
o movimento comunista e revolucionário de que os trabalhadores
e os povos precisam, tendo como alternativa ao capitalismo o
socialismo.

Correspondendo às muitas
saudações enviadas por ocasião deste 85º
aniversário, e sublinhando com particular fraternidade, começo
por saudar as diversas delegações que, presentes numa
iniciativa internacional realizada aqui no nosso país,
quiseram aqui estar connosco, garantindo-vos que podem contar com o
PCP e a sua acção e luta internacionalista e a procura
de caminhos e lutas comuns, saudar os trabalhadores e as suas
organizações sociais de classe, manifestando da nossa
parte um claro e determinado empenho na luta em defesa dos direitos
individuais e colectivos, no trabalho com direitos.

Saudar a juventude declarando o nosso
empenhamento na sua luta para concretizar anseios e reivindicações
laborais e estudantis, saudando particularmente a JCP para que o 8º
Congresso, a realizar em Maio, constitua um grande êxito e
avanço para, como diz o seu lema, transformar o sonho em
vida
.

Saudar as mulheres portuguesas, no
limiar das comemorações do 8 de Março, Dia
Internacional da Mulher, declarando o nosso apoio às suas
iniciativas, acção e luta de combate às
desigualdades, à defesa da sua dignidade e das suas causas
civilizacionais.

Saudar os intelectuais que tomam
partido pela liberdade, pela democracia social e cultural, pela paz,
pela justiça social, com a certeza de que encontrarão
no PCP um protagonista avançado dessas causas e objectivos, um
espaço de realização dos seus saberes e
conhecimentos.

Saudar os micro, pequenos e médios
empresários e agricultores, dizendo-lhes que vejam neste
Partido um defensor coerente dos seus problemas e legítimos
direitos.

Saudar os reformados e os cidadãos
com deficiência manifestando, hoje como no passado, o nosso
empenhamento na luta por melhores condições de acesso à
saúde e combate às discriminações.

Saudar todos os democratas que,
inquietos e preocupados com o rumo da política nacional e com
a democracia, estão dispostos a procurar causas e caminhos
convergentes para connosco defender o regime democrático e a
liberdade, saudando particularmente os nossos amigos do Partido
Ecologista “Os Verdes” e da Intervenção
Democrática..

Saudar o povo português
afirmando-lhe que os comunistas portugueses e o seu Partido não
regatearão nenhum esforço, não virarão a
cara a nenhum combate, para encetar um outro rumo na vida nacional,
para construir um Portugal de paz, de progresso e de justiça
social.

85 anos é um tempo curto de
qualquer processo histórico e de vida dum povo. Mas é
o tempo bastante para julgar da história, da luta e da
validade de um partido e do seu projecto.

Neste fascinante percurso não
ficamos isentos de erros, conhecemos dificuldades e debilidades
porque este Partido é uma obra humana! Mas perante o povo e o
país afirmamos com grande honra e convicção:
valeu e vale a pena ter este Partido, valeu e vale a pena a sua
história e a sua luta. Valeu e vale a pena olhar para o futuro
com confiança, determinação e esperança,
porque perseguimos o ideal mais nobre da emancipação e
libertação da exploração do homem pelo
homem, porque queremos uma vida melhor para quem trabalha, porque
queremos um Portugal desenvolvido, de progresso, independente, onde
seja o povo a decidir. Com tranquilidade e orgulho queremos dizer ao
povo português, com aquela verdade que nos caracteriza, que
temos um Partido Comunista digno desse nome.