Intervenção de Carla Cruz na Assembleia de República

O caos na Saúde resulta das opções políticas do Governo

Pelo reforço dos cuidados de saúde primários de proximidade às populações
Pelo reforço e valorização dos profissionais de saúde no Serviço Nacional de Saúde
(projetos de resolução n.os 1110/XII/4.ª e 1111/XII/4.ª)

Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
Os problemas com que o País se confronta, de Norte a Sul, nos serviços de urgência, não são de agora, não são novos, não são pontuais, são estruturais.
O Governo, perante estes problemas, insiste em manter o discurso da propaganda, negligenciando os problemas com que se confrontam os doentes: os que esperam horas para serem atendidos num serviço de urgência; os que ficam internados em cadeirões porque os hospitais não têm camas para os receber; os que não têm acesso a medicamentos que lhes podia salvar vidas; os que não tomam a medicação porque não têm condições económicas para o fazer; os que não vão à consulta ou aos tratamentos porque não conseguem pagar os transportes.
O caos em que se encontra o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e o serviço de urgências resulta, claramente, das opções políticas do Governo — o subfinanciamento do SNS, o desinvestimento nos cuidados de saúde primários, a desvalorização social e profissional dos profissionais de saúde.
Sobre o desinvestimento nos cuidados de saúde primários, é o próprio relatório do Tribunal de Contas, de agosto de 2014, que o diz, e passo a citar: «O financiamento destinado aos cuidados de saúde primários, entre 2009 e 2012, é contrário à pretensão sucessivamente anunciada de uma aposta séria na dinamização dos cuidados de saúde primários». E o relatório diz mais: «O ano de 2012 destaca-se pelo afastamento mais acentuado, comparativamente aos anos anteriores, entre o financiamento destinado aos cuidados hospitalares e o destinado aos cuidados de saúde primários.»
Há muito que o PCP vem alertando para as consequências deste desinvestimento nos cuidados de saúde primários, na diminuição da capacidade de resposta por encerramento de serviços de proximidade, pela falta de profissionais e pelo subfinanciamento que impede a assunção dos compromissos e da missão a que estão destinados os cuidados de saúde primários.
Mais de um milhão e quatrocentos mil portugueses estão sem médico de família. Foi, aliás, promessa feita por este Governo a de atribuir um médico de família a todos os portugueses, mas que não foi cumprida, tal como muitas outras.
A falta de respostas de serviços de proximidade empurra os portugueses para os serviços de urgência.
Também a desvalorização dos profissionais de saúde tem levado a que muitos abandonem precocemente o Serviço Nacional de Saúde, que só em relação a médicos se verificou, até novembro de 2014, o abandono precoce de 416.
Faltam todos os tipos de profissionais. É por isso, para resolver os problemas com que se confronta o Serviço Nacional de Saúde, porque os problemas são estruturais e não pontuais, que o PCP apresenta estas duas iniciativas legislativas.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Srs. Deputados do PSD, não somos nós que estamos no Governo a negociar com a farmacêutica, é o Governo. E é o Governo que está a deixar os doentes sem medicação e a deixar que eles morram sem essa medicação.
Mas vamos recentrar o debate naquilo que deve ser o debate. Os senhores podem ficar muito incomodados com as consequências das vossas políticas, mas o que não podem fazer é calar-nos para não trazermos aqui e denunciarmos o desespero e as situações dramáticas com que os doentes se confrontam: os doentes que esperam horas numa urgência para serem atendidos; os doentes que não tomam a medicação porque o Governo não lhes permite aceder a essa medicação; os doentes que não tomam a medicação porque não têm condições económicas para o fazer; os doentes que, estando à espera nas urgências, as abandonam sem serem atendidos porque desistem desse atendimento.
Ora, perante estes problemas, os senhores tentam fugir-lhes, os senhores não lhes respondem claramente. Porquê? Para manterem intocável a propaganda do Governo, para continuarem a esconder as malfeitorias que o Governo, a política do Governo faz.
Mas, quanto a isso, Sr. Deputado do PSD, o PCP não se exime a apresentar aqui propostas. Nós, para além de denunciarmos os problemas, temos feito muitas e boas propostas com vista à sua resolução. Mas o PSD e o CDS-PP, invariavelmente, chumbam essas propostas.
E o que tem de ficar aqui claro é que a situação que hoje se vive no Serviço Nacional de Saúde, a situação com que os doentes estão confrontados é uma confirmação daquilo que o PCP tem dito: este Governo está há demasiado tempo em funções e cada dia que passa é mais um dia que o País perde, é mais um dia que o País retrocede. Por isso, este Governo já deveria ter sido demitido ou já deveria ter-se demitido.
Não o fazendo, iremos continuar a lutar pela demissão deste Governo e pela rutura com esta política, para que, de facto, todos tenham acesso à saúde e para que os cuidados de saúde primários sejam reforçados.

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