Intervenção de

Autoridade de Segurança Alimentar e Económica - Intervenção de Agostinho Lopes na AR

Organização e actividade da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE)

 

 

 

Sr. Presidente,

Srs. Deputados:

Os projectos de resolução em debate (projecto de resolução n.º 261/X)  (projecto de resolução n.º 280/X) prolongam a audição da ASAE, realizada na Comissão de Assuntos Económicos, sobre a sua intervenção.

Não retiramos uma vírgula ao que então afirmámos: a ASAE, ou, melhor, a sua intervenção, é a face propagandística da fúria pseudomoralizadora dos costumes socioeconómicos da pequena economia e da economia informal, exercida pelo Governo mais imoral dos últimos anos em termos de justiça social e de assimetrias regionais.

Simultaneamente, é o bode expiatório de erradas e incompetentes políticas de sucessivos governos, do PS, do PSD e do CDS-PP.

Tal não significa que se possa estar de acordo com uma intervenção em vários casos sem «peso, conta e medida», marcada pelo excesso: excesso de zelo, excesso de mediatização.

A notícia da acção de ontem, suspeita de querer intervir no debate de hoje, é excessiva face às atribuições e competências da ASAE nalgumas afirmações do seu principal responsável.

Dito isto, não pode deixar de se anotar a responsabilidade principal dos partidos que tiveram funções governamentais ao longo das últimas três décadas, pelos problemas e absurdos que a intervenção da ASAE põe a nu e que só agora alguns descobriram: a responsabilidade pelo gueto económico a que a política de direita foi confinando a agricultura familiar e a pesca artesanal e costeira, sujeitas ao rolo compressor e uniformizador da política agrícola comum e da política comum de pescas.

Trata-se, no fundo, de constatar o horror com que estas políticas das lógicas neoliberais únicas e exclusivas do mercado, da competitividade, da dimensão viável, olhavam e olham para outras lógicas económicas, melhor dizendo, socioeconómicas, da economia informal, ainda dominantes em grande parte do nosso mundo rural ou mesmo de unidades familiares em tantas áreas de actividade.

Ou já se esqueceram, por exemplo, de uma reestruturação da rede de matadouros, que os liquidou em dezenas de municípios, afastando, nalguns casos, a pequena produção pecuária do norte e centro mais de 100 km das instalações de abate, o que significou a clandestinização do mesmo?

Foi uma reestruturação a que apenas o PCP se opôs e que foi, além do mais, um autêntico desastre financeiro para o Estado.

Ou esquecem-se de políticas de eliminação de muitas feiras ou da redução das suas dimensões agropecuárias - a que aliás algumas câmaras deram uma boa ajuda... - com argumentos como os que agora são usados pela ASAE? Mesmo as que restam sofrem a pressão do licenciamento desregrado das grandes superfícies comerciais e não há qualquer programa para apoio ao pequeno comércio rural.

Esquecem-se da normalização e da padronização da produção agro-pecuária e da transformação artesanal ao nível dos equipamentos, processos produtivos e comercialização, levados a cabo sob os ditames dos regulamentos e directivas de Bruxelas? Como será de recordar, a este propósito, o que foi imposto ao Queijo da Serra, caso que já hoje foi citado, não tendo sido a ASAE que descobriu agora essas regras...

Poderíamos falar igualmente da normalização dos produtos hortofrutícolas, que é um processo de selecção de espécies regionais e autóctones do nosso país, a que se juntam processos burocráticos de certificação por parte de inevitáveis entidades certificadoras privadas que sobretudo acresceram uma nova punção monetária à cadeia de comercialização, reduzindo mais a margem do produtor.

Poderíamos ainda falar da fúria regulamentadora que proibia o vinho à caneca nos restaurantes e que legalizou, porque engarrafada e selada, a mistura hidroalcoólica dos vinhos de diferentes países da Comunidade.

E não se argumente com a saúde dos consumidores porque os grandes problemas de sanidade animal e vegetal nos últimos anos na União Europeia, a doença das «vacas loucas», os nitrofuranos e mesmo a gripe aviária, resultaram não da pequena exploração familiar ou da agricultura familiar mas da grande produção agro-pecuária industrializada.

Mas o PS, o PSD e o CDS-PP têm outras «culpas no cartório», e não são menores. É que, afinal, a ASAE aplica e interpreta - às vezes mal, na nossa opinião - normas e regulamentos de que não é autora. Ora, ao longo dos anos, particularmente depois da adesão à CEE, quando estes partidos estiveram no governo, transformaram-se nos mais zelosos aplicadores das tantas vezes absurdas regras comunitárias. Foram eles que as transcreveram, tantas vezes «mais papistas do que o Papa», completamente à margem da realidade socioeconómica do País. Mas era moderno e vinha de Bruxelas...

Algumas das questões a que os projectos de resolução pretendem responder prendem-se com a aplicação em Portugal do Regulamento n.º 852/2004, já hoje aqui referido. Temos de convir que houve atrasos da parte de anteriores governos como há um evidente atraso por parte do actual Governo do Partido Socialista!

Gostaria de dizer que o PS e o Governo do PS não se comportaram melhor, pois, para lá das suas directas responsabilidades, através do Ministério da Economia, no acompanhamento da forma e conteúdo da intervenção da ASAE no quadro regulamentar actual, é igualmente um facto que a única iniciativa legislativa produzida em três anos de Governo foi o Decreto-Lei n.º 113/2006, de 12 de Junho, que estabelece o regime sancionatório das infracções às normas do Regulamento n.º 852. E o Governo avançou agora, tal como já aqui foi referido, com a criação de um grupo de trabalho, no âmbito da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional.

Temos de convir que é pouco e é tarde, sobretudo comparado com as malfeitorias que os Ministros da Economia e da Agricultura têm feito e continuam a fazer às unidades familiares e às pequenas empresas destas áreas.

O PCP não só continuará o combate contra as políticas que estão na base dos problemas em apreço como tomará oportunamente as iniciativas que julgar necessárias em defesa dos produtos regionais e da pequena produção artesanal.

Trata-se de produções e de produtos que representam não só um inestimável património cultural, que é necessário defender e valorizar, como um importante complemento à viabilização do que resta da nossa agricultura e mundo rural e também de muitas das nossas comunidades ribeirinhas, que vivem dias difíceis causados pela política de direita do actual Governo PS.

 

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