Intervenção de

Aumento intercalar do salário mínimo nacional<br />Intervenção de Francisco Lopes

Senhor Presidente Senhores deputados O PCP propõe o aumento intercalar da retribuição mínima mensal fixando o seu valor em 400 euros a partir de 1 de Julho de 2005. É uma proposta que se insere no objectivo mais amplo da valorização dos salários, da valorização do trabalho e dos trabalhadores. Múltiplas razões justificam e dão grande actualidade a esta iniciativa do PCP. Em Portugal mais de trezentas mil pessoas passam fome e há mais de dois milhões e trezentos mil portugueses em situação de pobreza. São reformados com pensões baixas, são excluídos e marginalizados da sociedade, mas são também centenas de milhar de trabalhadores que, auferindo o salário mínimo nacional ou uma remuneração próxima do seu valor, empobrecem a trabalhar. Portugal tem o maior fosso entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres no âmbito da União Europeia. No ano 2000, o Salário Mínimo Nacional correspondia a 51,8% do salário médio, quando no ano de 1990 representava 59,4%, numa evidente demonstração do agravamento das desigualdades salariais e da depreciação do salário mínimo. Este, quando foi criado em 1974 com o valor de 3 300 escudos beneficiou cerca de 50% da população activa, mas por acção de sucessivos governos foi degradado no seu valor real em cerca de 29%. Para que tivesse hoje a capacidade aquisitiva de 1974 deveria ter um valor de cerca de 500 euros, Quando na realidade o seu valor é apenas de 374 euros mensais. O baixo salário mínimo, os baixos salários têm incidências que ultrapassam o seu efeito imediato. Os baixos salários provocam pensões de reforma muito mais baixas, determinando novas gerações de reformados que vão ficar na miséria e aos baixos salários correspondem também baixos subsídios de doença e de desemprego, afectando duplamente os trabalhadores nestas situações. Nada justifica que esta situação continue. A riqueza produzida e os ganhos de produtividade são cada vez mais canalizados para os lucros das empresas em prejuízo dos rendimentos do trabalho. É particularmente chocante, quando se degrada o poder aquisitivo dos salários, ver que os lucros dos grupos económicos e financeiros não param de subir. No ano passado, ano de quebra dos salários reais e de degradação do poder de compra da população, os lucros das empresas cotadas em bolsa disparou, a banca teve dos melhores resultados de sempre e apenas quatro empresas (EDP, PT, Brisa e GALP) tiveram mais de 1400 milhões de euros de lucro, que corresponderam por sua vez à distribuição de volumosos dividendos. Por outro lado ao longo dos últimos anos o aumento dos bens e serviços de primeira necessidade foi muito superior ao aumento nominal dos salários. Com os Governos do PSD/CDS-PP acentuou-se a política de depreciação do salário mínimo, designadamente com o recurso a previsões fictícias dos valores da inflação que eram usadas para calcular a evolução do salário mínimo. E os aumentos de preços continuam, de que é exemplo o aumento dos transportes públicos em 3,7% ontem anunciado pelo governo, que se soma a muitos outros numa escalada de encarecimento dos transportes públicos É necessário dizer ainda que comparado com outros países da Europa, o salário mínimo nacional em Portugal, não só fica a léguas do praticado na generalidade dos países, como o seu crescimento relativo é dos menores, ao contrário do que se passa por exemplo com a vizinha Espanha. O aumento intercalar do salário mínimo nacional e dos salários em geral, é assim um importante instrumento de justiça social no combate à pobreza e às carências económicas e sociais que é urgente accionar. O aumento dos salários é necessário para responder ao dia a dia de muitas famílias de reduzidas possibilidades financeiras sujeitas às necessidades elementares e ao consumo induzido por uma agressiva propaganda. O aumento dos salários é indispensável para enfrentar o elevado grau de individamento das famílias. O aumento dos salários é necessário para evitar o prolongamento das jornadas de trabalho, o duplo emprego e outras formas de obter remunerações que se possam associar ao salário diminuto e que estão na base da economia subterrânea, de cansaço e desgaste do trabalhadores, provocando redução da capacidade de trabalho, acidentes, ausência de acompanhamento familiar. Mas, além dos seus efeitos sociais, o aumento do salário mínimo nacional, o aumento dos salários constituem um importante factor para a dinamização da economia, a elevação da produtividade, o estimulo à qualificação e à formação profissionais, para o alargamento do mercado interno. O PCP propõe hoje aqui o aumento intercalar do salário mínimo nacional como medida imediata, mas avança ao mesmo tempo com a necessidade mais profunda de revalorização do salário mínimo nacional nos próximos anos com prazos e compromissos claros de montantes a atingir que restabeleçam o poder aquisitivo que perdeu. Nada pode justificar o agravamento, das desigualdades, a desvalorização do trabalho. Não é possível uma família viver com 374 euros mensais, os cerca de 75 contos que representa o valor actual do salário mínimo nacional. Aumentar já a partir de 1 de Julho o salário mínimo nacional para 400 euros, tomar medidas para a recuperação do poder de compra perdido pelo salário mínimo nacional desde a sua criação, apostar na valorização geral dos salários, é um necessidade premente, um factor de justiça social e de desenvolvimento económico. Numa sociedade como aquela em que vivemos, guiada pelos valores do agravamento da exploração, das políticas anti-sociais, do privilégio aos ganhos espúrios, à especulação bolsista cujos proveitos muitas vezes nem sequer são sujeitos a impostos, tem grande importância a afirmação de outros valores. A proposta do PCP de aumento do salário mínimo, de aumento dos salários, é também um forte sinal de valorização dos trabalhadores e de valorização do trabalho esse elemento fundamental de criação de riqueza, de realização e progresso humano. Disse. Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Ramalho,Fiquei um pouco surpreendido e pouco esclarecido com a sua intervenção, designadamente no que se refere à mudança de posição do Partido Socialista relativa a uma opção anterior sobre o salário mínimo nacional. Resta, talvez, como razão para esta mudança de opinião o facto de o Partido Socialista tervotado favoravelmente quando estava na oposição e agora, estando no Governo, assumir uma posição diferente. À falta de explicações mais desenvolvidas, parece ser esta a única ilação que podemos tirar! Isto porque há todas as razões e justificações para ser adoptada uma medida de aumento intercalar do salário mínimo nacional. Por um lado, pela situação objectiva em que vivem centenas de milhares de trabalhadores e, por outro, por estarem a verificar-se aumentos de preços de bens essenciais e de serviços, como o caso aqui evidenciado do aumento dos transportes públicos em 3,7%, ontem anunciado. Ora, isto penaliza os trabalhadores, a população e também aqueles que auferem o salário mínimo nacional. Não se pode estar à espera do próximo ano, com todas as consequências que isto tem, para fazer a actualização do salário mínimo nacional! Por sua vez, sabemos que o País tem um problema de criação de riqueza. É necessário mais produtividade e mais criação de riqueza. Mas há também um grave problema de distribuição da riqueza que é criada e não há justificação para se manter um salário mínimo nacional de 374 €, quando verificamos os lucros escandalosos dos grupos económicos e financeiros, designadamente da banca, estes 1400 milhões de euros de lucro, em 2004, apenas de quatro empresas. Se se distribuir melhor a riqueza, é possível dar resposta a um aumento intercalar do salário mínimo nacional! Aplausos do PCP. Finalmente, é necessário dizer que a proposta do PCP, com uma larga fundamentação, se insere numa perspectiva mais ampla. Não nos limitamos à proposta de aumento intercalar do salário mínimo nacional, que agora está a ser apreciada. Entendemos indispensável uma revalorização do salário mínimo nacional que reponha o poder de compra perdido. Também nesta matéria, é necessário que haja resposta, designadamente por parte do Partido Socialista, quanto a prazos e a compromissos de valores a atingir para que não fique apenas, como palavra vã, a ideia de revalorização do salário mínimo nacional. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelas intervenções aqui feitas, aparentemente, pareceu haver uma preocupação e uma sensibilidade quanto à iniciativa que o PCP hoje trouxe de valorização do salário mínimo nacional. No entanto, vê-se que, na prática, desde o PS ao PSD passando pelo CDS, há uma atitude contrária a essa primeira impressão. E perde-se aqui uma grande oportunidade de, aprovando esta proposta do PCP, dar um sinal de justiça social, de contributo para o desenvolvimento económico, mas também de valorização do trabalho e dos trabalhadores. Num tempo em que se promovem as desigualdades sociais, num tempo em que se promove a exploração, num tempo em que se promove a especulação bolsista, é fundamental que se afirmem os valores do trabalho, que se valorize o trabalho, e o aumento do salário mínimo nacional é também um sinal para a valorização do trabalho. Por outro lado, referiu-se aqui o carácter intercalar desta proposta como sendo um óbice. Srs. Deputados, esta proposta que fazemos não é inédita, houve governos que decidiram aumentos intercalares do salário mínimo. Portanto, este não é um problema, e os Srs. Deputados do PSD são capazes de estar recordados deste facto. Também não é razão a comparação com os outros países da Europa — aliás, a comparação justificaria que se tomasse, desde já, esta medida. É que não são só os países mais desenvolvidos que têm um salário mínimo acima do salário mínimo português. A vizinha Espanha, que tem um salário mínimo muito acima do nosso, decidiu recentemente um aumento extraordinário que nos diferencia ainda mais desse país. Mas outros países, como o Chipre, têm hoje salários mínimos acima do que é praticado em Portugal. Portanto, há aqui um problema não apenas de criação de riqueza mas uma opção na distribuição da riqueza, uma opção que está mal feita e tem de ser corrigida. Cabe ainda dizer que aquilo que propomos relativamente ao salário mínimo nacional tem uma preocupação social e é necessário os Srs. Deputados interrogarem-se no sentido de saber como é possível uma família viver com 374 € por mês!… Ora, a proposta que fazemos é faseada, é um aumento intercalar, e tem o valor de apenas mais 25 €, de apenas mais 5 contos por mês. É um passo para uma revalorização mais profunda do salário mínimo nacional que aqui é necessário assumir como compromisso quer quanto a prazos quer quanto a montantes. Termino, referindo que há, de facto, um problema de congelamento. Na prática, o salário mínimo nacional não só tem sido congelado como tem sido desvalorizado. E o PCP tomará as iniciativas que forem necessárias, com toda a convicção, para descongelar o salário mínimo nacional, para descongelar o progresso e a justiça social. Tomaremos todas as medidas nesse sentido, e esta é uma delas.

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