Intervenção de João Ramos na Assembleia de República

Aumento de preços dos bens essenciais

Debate de urgência sobre o aumento dos preços dos bens essenciais

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Com o novo ano chega, para a grande maioria dos portugueses, o agravamento da sua situação económica, com grande prejuízo para a sua vida e para o seu futuro. A dimensão e a extensão dos aumentos de preço abrangem praticamente todos os bens essenciais a uma vida digna.
Os aumentos das taxas moderadoras, do custo com os medicamentos e com o transporte de doentes são incomportáveis. A isto não podemos deixar de associar a cada vez maior dificuldade de acesso aos cuidados de saúde, empurrando, os que podem, para o recurso à medicina privada.
No âmbito das deslocações, os aumentos até 17% no preço dos combustíveis, das portagens que, no caso das SCUT, em média, podem ir de 88 € a 136 € mensais, consoante a área em que esta se insere, ou, no caso das pontes, de 2,3 e 2,49%. Também os transportes públicos, que em Julho já tinham aumentado 1,2%, voltaram a partir de Janeiro a subir entre 3,8 e 4,5%.
No consumo doméstico, os aumentos com vestuário e calçado, telecomunicações e produtos alimentares agravam em muito as despesas das economias familiares (só no pão, os aumentos podem atingir os 12%).
Não poucas vezes o aumento dos impostos levou a arredondamentos penalizadores para os consumidores.
A educação também dará o seu contributo para o agravamento da situação económica dos agregados. O aumento das propinas e a redução dos apoios sociais à educação confirmam isto mesmo.
As rendas de casa nos bairros geridos pelo IRHU estão a sofrer aumentos, com a situação caricata de ver aqueles que se preocuparam com a conservação que o senhorio não fez serem agora penalizados com um aumento maior, motivado pelo bom estado de conservação da habitação.
Também a electricidade apresenta um aumento de 3,8% para o consumo doméstico e o gás um aumento de 23%.
Um substancial contributo para o aumento do custo de vida é dado pelo aumento da taxa do IVA, que se iniciou logo em meados do ano passado.
E, como se não fosse já suficientemente penalizador aumentar este imposto, ainda se optou por um aumento maior, de 20%, para as taxas aplicadas aos produtos essenciais.
Também o IRS é agravado e também desta vez com o mesmo princípio aplicado ao imposto anterior, uma subida maior para aqueles que declaram menos rendimentos.
Esta situação difícil é cada vez mais visível e ir-se-á acentuar nos próximos meses. Numa altura em que um grande número de portugueses ficará mais desprotegido, aquilo que o Governo tem para oferecer vem na linha das medidas até agora referidas: o aumento das custas judiciais e de outras taxas do Estado.
Também o sector bancário, como se não lhe bastasse a intimidade promíscua com a crise, faz dela uma oportunidade: não só beneficia de benesses vedadas à maioria dos portugueses como ainda aplica taxas acima do que lhe é permitido!
As famílias, aliciadas e empurradas para as garras do sector bancário como panaceia para os seus problemas, estão hoje sobreendividadas — só à DECO pediram ajuda mais de 17 000!…
Foi o próprio Instituto Nacional de Estatística que, ainda ontem, divulgou informação que confirma a subida em 1,4 pontos percentuais do índice de preços no consumo, o que mais um vez demonstra a pertinência deste debate de urgência convocado pelo PCP.
Como se não bastasse o aumento dos bens essenciais, os portugueses e as suas famílias estão hoje muito mais penalizados nos seus rendimentos. De mãos dadas com esta asfixia, aparecem as diminuições dos salários e do apoio social às famílias em situação mais difícil.
Neste grupo estarão, certamente, os mais de 700 000 desempregados, 7% de todos os portugueses, que não têm acesso a qualquer prestação social. Todo este processo em torno do
salário mínimo não é mais do que uma ofensiva ideológica para o abaixamento generalizado do valor do trabalho.
É neste contexto que o Governo rasga compromissos assumidos há anos, ignora recomendações desta Assembleia e retira 15 € aos 25 € que deveriam melhorar a situação daqueles que recebem apenas o salário mínimo nacional, o que faz com que este aumento, em termos nominais, seja o mais baixo dos últimos 28 anos e se situe abaixo da inflação prevista.
Isto quanto ao salário mínimo nacional, mas é aqui relevante relembrar que 37% dos trabalhadores por contra de outrem, ou seja, mais de um terço receberam, no último trimestre de 2010, um salário inferior a 600 € mensais.
Os cortes feitos de forma cega atingiram de forma indecente também os pensionistas e os reformados.
Congelar reformas de pouco mais de 200 €, neste contexto de grande aumento dos bens de consumo não só é injusto como imoral! E bem pode o PS vir valorizar números sobre a pobreza, porque a realidade, infelizmente, é mais fria do que os próprios números.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
É caso para dizer, utilizando um conhecido ditado popular, que, neste caso, tem de ser adaptado, que «o Governo tira com uma mão e (…) tira também com a outra», aumenta os preços e baixa os rendimentos.
Enquanto isto acontece, o PS e o Governo esforçam-se na tentativa de convencer os portugueses de que todos temos de fazer sacrifícios, como ainda ontem, aqui, o Sr. Ministro das Finanças reiterou. Muito pode o Governo insistir nesta tentativa, porque as notícias, a espaços, vindas a público põem a nu o verdadeiro mundo dos criadores da crise: marcas como a Porsche, Lamborghini, Dior, Chaumet, Gucci ou Prada, e outras, todas de bens de luxo, não se ressentem da crise, não baixam os preços, aumentam as suas receitas e ainda lançam novos produtos nos segmentos topo de gama.
A instalação de todos estes processos patrocinados pela crise vai cada vez mais ao encontro do que o PCP tinha avançado: 90% da factura da crise é dirigida aos trabalhadores!!
É este o Portugal onde a repartição dos rendimentos é a mais desigual da União a 27.
É isto que a auto-intitulada esquerda moderna tem para oferecer ao País, a aplicação da mesma receita de sempre, que de moderna tem muito pouco e de esquerda não tem nada!
Os portugueses querem mais e merecem melhor!

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