Apreciação Parlamentar

Apreciação Parlamentar N.º 100/X - Regime jurídico da instalação e da modificação dos estabelecimentos de comércio a retalho e dos conjuntos comerciais

 

Do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro, que "No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 42/2008, de 27 de Agosto, estabelece o regime jurídico da instalação e da modificação dos estabelecimentos de comércio a retalho e dos conjuntos comerciais"

[Publicado no Diário da República n.º 12, série I, de 19 de Janeiro de 2009]

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Tendo em conta a publicação do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro, que "no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 42/2008, de 27 de Agosto, estabelece o regime jurídico da instalação e da modificação dos estabelecimentos de comércio a retalho e dos conjuntos comerciais", que procede à revisão da Lei n.º 12/2004, de 30 de Março, o Grupo Parlamentar do PCP considera oportuno e imperioso requerer a sua Apreciação Parlamentar, pelos seguintes motivos:

1. Por razões processuais que violam a intervenção da Assembleia da República na revisão da Lei n.º 12/2004, de 30 de Março.

A Lei n.º 12/2004, de 30 de Março, estabelecia, no seu artigo 37.º, o processo da sua própria revisão: «A presente lei será objecto de revisão no prazo de três anos após a sua entrada em vigor, na sequência da apreciação, pela Assembleia da República, de um relatório apresentado pelo Governo quanto à sua execução.»

O Governo, através do Ministério da Economia e Inovação, elaborou um anteprojecto de legislação sobre o qual ouviu algumas (poucas) associações do sector, mas não dando conhecimento do mesmo à Assembleia da República, nem tendo em conta o comando imperativo do artigo 37.º da Lei n.º 12/2004!

Quando o Senhor Secretário de Estado do Comércio foi ouvido em sede da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional (CAEIDR) sobre o relatório previsto no artigo 37.º, a 24 de Junho de 2008, tinham passado muitos meses sobre a decisão da Comissão, de Outubro de 2007, para a sua audição sobre o assunto.

E o debate, que teve lugar no Plenário da Assembleia da República em 4 de Julho de 2008, teve como objectivo a abordagem da Proposta de Lei n.º 192/X/3.ª, "pedido de autorização legislativa do Governo, para rever o regime jurídico de licenciamento exclusivamente em matéria de taxas e contra-ordenações", porque assunto da exclusiva competência da Assembleia da República.

Registe-se que a «arrogância legisladora» do Governo foi ao extremo de, na fórmula preambular do Decreto-Lei n.º 11/2009, agora publicado, referir terem sido ouvidas, a título obrigatório ou facultativo, treze entidades (órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, Associação Nacional de Municípios Portugueses, Conselho Nacional do Consumo, Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, União Geral de Consumidores, Associação de Consumidores da Região dos Açores, Federação Nacional das Cooperativas de Consumo, Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição, Associação Portuguesa dos Centros Comerciais, Associação Empresarial de Portugal e Associação Industrial Portuguesa), sem fazer qualquer referência à Assembleia da República ou ao «Parecer sobre o Relatório de Execução da Lei n.º 12/2004, de 30 de Março, sobre o Licenciamento Comercial», aprovado pela CAEIDR a 12 de Dezembro de 2007.

Assinale-se ainda que, durante meses, o secretário de Estado do Comércio, para justificar a urgência e formas expeditas para rever a Lei n.º 12/2004, de 30 de Março, marginalizando a Assembleia da República, referia a pressão e ameaças da União Europeia para as alterações a fazer, sob risco do País ser penalizado (como se isso fosse argumento aceitável!), e depois, ter demorado quase meio ano a aprovar a documentação em Conselho de Ministros após a publicação da autorização legislativa referida anteriormente (27 de Agosto de 2008).

2. Por razões do seu conteúdo material que representa a total liberalização do processo de licenciamento de áreas comerciais, reforçando a concentração e domínio dos mercados grossista e de retalho pelos grupos de grandes cadeias de distribuição e promotores (imobiliários) dos centros comerciais, acentuando o desequilíbrio entre os diversos formatos comerciais.

O Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro, entre outros aspectos, apresenta as seguintes alterações negativas face à Lei n.º 12/2004 de 30 de Março:

i) Eliminou o objectivo previsto no artigo 2.º da Lei n.º 12/2004, de assegurar «a coexistência e equilíbrio dos diversos formatos comerciais», mesmo que a aplicação da referida lei se tenha traduzido já por uma expansão brutal das áreas de comércio promovida pelos grupos das cadeias de distribuição;

ii) Restringe, no artigo 2.º, o âmbito do licenciamento ao comércio a retalho excluindo, contrariamente ao estabelecido na Lei n.º 12/2004, o comércio por grosso; eleva os níveis das áreas comerciais a licenciar: o que era obrigatório no comércio a retalho a partir de 500 m2 (alínea a), nº 1 do artigo 4.º da Lei n.º 12/2004), passa a ser a partir dos 2 000 m2, (alínea a), n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei em apreciação); na avaliação da dimensão da área acumulada no plano nacional por um dado grupo, que torna obrigatório que o licenciamento, qualquer que seja a área de venda, passe de 500 m2 (alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 12/2004), para 30 000 m2 (alínea b) do n.º 10 do artigo 2.º do Decreto-Lei em apreciação), assim liberalizando e alargando o licenciamento de áreas comerciais sem qualquer controlo;

iii) Estabelece como critérios para pontuação e determinação da «valia do projecto» (artigo 10.º - Parâmetros para a elaboração do relatório final), parâmetros de grande subjectividade e ambiguidade, susceptíveis de produzir as mais díspares avaliações, mas permitindo elevadas pontuações. Caso da alínea c), que estabelece dois parâmetros, avaliação da «qualidade do emprego» e avaliação da «responsabilidade social da empresa». Como se avaliam e traduzem em pontos esses parâmetros? Que é feito do critério objectivo, rigoroso, de quantidade de emprego criado?

iv) Afastaram-se, no artigo 11.º (Comissões de autorização comercial), das Comissões de Licenciamento - como desejava a grande distribuição - as associações concelhias e regionais de comerciantes;

v) Substituiu-se o sistema de candidaturas por fases, que permitia alguma avaliação do mérito relativo dos projectos, para uma mesma localidade, e logo, alguma racionalidade no ordenamento comercial (artigo 10.º da Lei n.º 12/2004), por um sistema de entrada de candidaturas em contínuo, com o argumento de que aquele sistema era «penalizador do investimento e dos promotores», estranhamente em contradição com os projectos de candidaturas ao QREN, em que se utiliza o sistema de fases de candidaturas!

vi) Reduz algumas das coimas por violação de normas do processo de licenciamento a valores simbólicos para os grandes grupos da distribuição; por exemplo, a falta de envio de informações à DGAE pelas empresas é penalizada com uma coima entre 250 e 1250 euros.

Face às questões referenciadas, o Grupo Parlamentar do PCP considera que se deve permitir a prevista e adequada intervenção da Assembleia da República, conforme a exigência estabelecida para o processo de revisão do artigo 37.º da Lei n.º 12/2004, de 30 de Março, e as alterações necessárias para corrigir os seus aspectos mais gravosos, nomeadamente dos indicados anteriormente, com o objectivo de fixar um quadro legal que possa contribuir para algum reequilíbrio entre os diversos formatos comerciais e garantir um ordenamento do território e urbanismo comercial que salvaguardem uma perspectiva integrada e valorizadora do desenvolvimento da economia e da protecção do ambiente.

Nestes termos, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 162.º e do artigo 169.º da Constituição da República Portuguesa e ainda do artigo 189.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, vêm requerer a apreciação Parlamentar do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 16 de Janeiro que "No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 42/2008, de 27 de Agosto, estabelece o regime jurídico de instalação e de modificação dos estabelecimentos de comércio a retalho e dos conjuntos comerciais".

Assembleia da República, em 4 de Fevereiro de 2009

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