Intervenção de

Alteração à Lei nº 142/85, de 18 de Novembro (Lei Quadro da Criação de Municípios) - Intervenção de João Amaral

Alteração à Lei nº 142/85, de 18 de Novembro
(Lei Quadro da Criação de Municípios)
Intervenção de João Amaral

 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,

Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, começo a minha intervenção com uma saudação
a todos os que, como os Vizelenses, olham para este debate com a esperança de
que seja desta vez que se encontre vontade política para avançar
para a criação de novos municípios como o de Vizela. Acho, Senhor Presidente,
que esses portugueses, que continuam a ter esperança nesta Assembleia, devia
ser-lhes dada a medalha de fé democrática. Eles que foram enganados
pelo PS, pelo PSD e pelo CDS em 82, 85,87, 95, 96, e novamente há dois meses,
eles que mesmo assim continuam a ter esperança nesta Assembleia, têm de ser
daqui saudados, pela sua fé nesta casa. Espero as vossas palmas, a esta sugestão,
Senhor Deputados do PS e do PSD, porque são os senhores quem mais do que ninguém
tem a obrigação de se penitenciar!

O debate que aqui travamos ainda não é para criar municípios. É só para alterar
a Lei Quadro de Criação de Municípios, inventada em 1983 por PS, PSD e CDS para
impedir a criação do concelho de Vizela. Discutiram na durante dois longos anos,
entre 83 e 85, sempre dizendo aos Vizelenses, "já vai, já vai, isto resolve-se".
Foram desenhando nesses dois anos, critérios onde Vizela cabia ao milímetro,
e sempre dizendo " já vai, já vai". Chegaram à hora da verdade, e
quando o texto subiu a plenário, em Maio de 1985, "Zás" inventaram
o célebre artigo 14 nº 4 (segundo o qual só poderia haver novos municípios quando
houvesse regiões) e deram com ele na cabeça das esperanças dos Vizelenses.

A Lei Quadro de Criação de Municípios não é uma lei. É por definição a anti-lei,
é um aborto que se chama "de Criação de Municípios" e cuja utilidade
é impedir essa mesma criação. Foi uma lei elaborada ad hominem
contra os Vizelenses. É uma lei que envergonha a República.

No decurso do processo de Vizela, logo nos primórdios, o Dr. Vitorino (então
ainda jovem, marxista, e da UEDS) classificava os processos seguidos para impedir
Vizela de manhosos; e o Dr. Carlos Lage, já então absoluto
e oficialmente PS, falava de monumental hipocrisia. Não há
melhores palavras para clarificar esse artigo 14º, nº 4 - foi um acto de manhosos
para uma monumental hipocrisia.

E agora? Este projecto em debate do PSD já aqui foi discutido há ano e meio.
O PSD fez promessas em Fátima de criação do concelho, e para dar um ar sério
dessas promessas apresentou esse projecto para revogar o famigerado artigo 14º,
n.º 4 que ele próprio tinha votado em 1985. Devo dizer que nesse distante dia
de Maio de 1996 ainda acreditei que houvesse mesmo um novo "milagre de
Fátima" e que esse 14º n.º 4 fosse revogado de imediato. Mas era tudo fita.
PS e PSD entenderam-se para fazer baixar o projecto por 90 dias à Comissão.
Para quê? Para estudar, disseram. Mas isto é matéria de "sim" ou "não".
O que é que há para estudar?

Claro que passaram os 90 dias, passaram 500 dias!, não estudaram nada, e agora
à beira das autárquicas, o PSD, a toque de Fátima, volta com
o projecto. Toda a gente entende. Por um lado, vai começar nova sessão legislativa,
e há quem tenha prometido voltar à carga com a criação de municípios. Imagine-se
o peso com que o PSD ficaria na cabeça se fosse traído por alguém no seu amor
aos fatimenses... Depois, há uma questão de fundo. Se o PSD é oficialmente contra
as regiões (com numerosos desaguisados internos...), se não quer que elas se
criem, como é que pode dizer que defende a criação de municípios como o de Fátima,
e ao mesmo tempo conformar-se com esta impossibilidade de haver municípios enquanto
não houver regiões?

Aí temos então, por tortuosas razões, o debate do projecto. E parece que agora
há milagre, todos se preparam para o votar.

Mas, para quê? Para depois criarem efectivamente municípios? Parece-me bem que
é por outras razões. É porque contam que os Vizelenses, e outros, vão mais uma
vez acreditar e terem fé nas vossas promessas.

Querem revogar o artigo 14º, nº 4? porque são contra as regiões, como o são
o PSD e o PP. E porque querem fazer da criação de municípios uma arma de arremesso
contra as regiões como se novos municípios e criação de regiões se opusessem
ou fossem substitutivos um do outro!

É preciso entretanto saber o que vai exactamente suceder neste processo. O projecto
do PSD tem um só artigo, e não precisa de nenhuma outra alteração. Então, o
que deve ser feito é votar de imediato, aqui no Plenário,
o projecto na generalidade, na especialidade em votação final global. Com isso,
sempre se ganhará alguma coisa. Continua a não haver novos municípios, mas a
desculpa da lei travão fica arrumada de vez!

Agora, se, como anda a ser dito, o que querem é votar e depois fazer baixar
novamente à Comissão, para fazerem muitos estudos sobre a lei quadro para a
reformularem, etc., etc., então tudo isto é não só a habitual hipocrisia, mas
também uma vergonhosa farsa.

Da nossa parte, assim como votamos contra esse artigo 14º, nº 4, quando foi
aprovado, e assim como propusemos em devido tempo a sua revogação, assim como
em coerência sempre votarmos aqui favoravelmente a criação de municípios como
Vizela que sejam viáveis, necessários e efectivamente desejados pela população,
votaremos agora favoravelmente este projecto de lei, até à sua votação final
global. Nunca regatearemos a nossa contribuição para que este processo tenha
o desfecho que as populações reclamam, com toda a justiça.

Disse.

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