Intervenção de

Alteração ao Código da Estrada e revogação da Lei n.º 1/2002, de 2 de Janeiro (Taxa de alcoolemia)<br />Intervenção de Lino de Carvalho na Assembleia

Senhor Presidente, Senhores Deputados,Ao debate de hoje aplica-se com toda a propriedade um conhecido provérbio popular "o que nasce torto tarde ou nunca se endireita".O debate, as cambalhotas e os zigue-zagues que tem sofrido a definição da taxa de alcoolemia aplicável aos condutores é bem o exemplo dos caminhos que a Assembleia da República não deve percorrer sob pena de se desprestigiar e de contribuir muito negativamente para o sentido de responsabilidade de quem conduz. Foi assim, na legislatura passada, sob a responsabilidade do Partido Socialista. É assim agora, pela mão do PSD.Em Outubro passado, na apreciação parlamentar suscitada então pelo PSD e pelo CDS/PP, argumentou-se com a falta de fundamentos científicos suficientes para suspender a norma do Código da Estrada que baixava para 0,2 g/l a taxa de álcool máxima no sangue acima da qual se considerava que o condutor estaria sob a influência do álcool.Desde cedo, o PCP definiu a sua posição: preocupamo-nos com o alto nível de sinistralidade rodoviária em Portugal e apoiamos todas as medidas que a permitam combater, designadamente ao nível da educação cívica dos condutores, das condições das estradas, do estado dos veículos e das medidas de dissuassão. Somos absolutamente contrários e condenamos totalmente a condução sob o efeito do álcool. Por isso quando surgiu a medida de redução do valor da taxa de alcoolemia de 0,5 para 0,2 g/l (na União Europeia só a Suécia tem um limite idêntico, sendo superiores todos os restantes) procurámos conhecer os seus fundamentos, os estudos estatísticos que haveria sobre o número de acidentes entre aqueles dois valores, os dados sob as alterações de comportamento dos condutores para cada um daqueles valores. Todos os Grupos Parlamentares e os próprios sectores da produção vinivola acompanharam as posições de equilíbrio e sensatez que orientaram a nossa intervenção. Verificou-se então que não existiam quaisquer estudos que sustentassem de forma consistente as decisões do Governo de alteração, neste ponto, ao Código da Estrada. Bem pelo contrário. O Governo, em 2 de Novembro de 2000 publicava, em resolução do Conselho de Ministros, um Plano de Acção contra o Alcoolismo que em matéria de sinistralidade rodoviária nada afirmava sobra a redução da taxa de alcoolemia para 0,2 g/l que, cerca de seis meses depois e aparentemente sem a alteração de nenhum pressuposto, é imposta por nova decisão do Conselho de Ministros. Depois de várias peripécias, tal decisão entrou na nossa ordem jurídica através do decreto-lei n.º 265-A/2001 de 28 de Setembro. Durante o respectivo debate o Governo meteu os pés pelas mãos, apresentou pareceres superficiais e contraditórios entre si e elaborados já depois da publicação daquele diploma legal, foi navegando ao sabor dos empurrões dos vários interesses, não conseguiu demonstrar a bondade da medida que, percebeu-se então, tinhas meros efeitos propagandisticos de uma medida fácil acabando por ser o próprio Grupo Parlamentar do PS a lançar a toalha ao ringue propondo a suspensão da aplicação daquela norma do Código da Estrada pelo prazo de dez meses. O próprio PSD sustentou toda a sua posição na falta de elementos científicos crediveis. Por isso, a Assembleia da República decidiu-se pela suspensão da redução da taxa e pela Lei n.º 1/2002 de 1 de Janeiro criou uma Comissão de Acompanhamento e Avaliação com o prazo de seis meses para apresentar um relatório que confirmasse ou não o peso da alcoolemia e a que níveis nos acidentes rodoviários. Todos os Grupos Parlamentares, com excepção do PEV e do BE (bem como de 16 deputados do PS), aprovaram esta lei o que significa que, de forma responsável, todos eles entendiam que era necessário proceder aos estudos necessários à definição do valor máximo de álcool no sangue, sem fundamentalismos mas também sem facilitismos, acima do qual os condutores seriam punidos. A verdade é que entretanto a Assembleia foi dissolvida, a Comissão não foi constituída e, consequentemente, nenhum estudo ou relatório foi efectuado. Para bem da coerência de cada uma das bancadas parlamentares e desta Assembleia o que se deveria fazer agora era dar corpo às decisões publicadas em Janeiro. Nada disso. O PSD, que tanto criticou a precipitação da alteração da taxa de alcoolemia devido á ausência de estudos fundamentados vem agora, também sem quaisquer novos estudos, propôr, sem mais, o regresso definitivo aos 0,5 g/l. Não dá para entender. Onde está a coerência ? Onde está o sentido de responsabilidade ? Esta é também a razão porque manifestamos o mesmo tipo de reservas em relação ao projecto do BE.O PSD, está, com o seu comportamento, a enviar mensagens profundamente irresponsáveis para os portugueses e, em particular, para os condutores. Que credibilidade pode ter uma legislação que é alterada ora num sentido, ora no sentido diametralmente oposto, sem nada que a sustente ? É obviamente um convite ao seu não cumprimento e à sua não aplicação por quem tem essa responsabilidade. Não senhores deputados. O único caminho sério para se sair desta embrulhada é concretizar aquilo que a própria Assembleia da República aprovou ainda há bem pouco tempo. Só dessa forma se salva minimamente a coerência do que foi aqui dito e aprovado. Só dessa forma se darão sinais de responsabilidade que contribuam construtivamente para o combate aos acidentes rodoviários.

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