Projecto de Lei N.º 420/XI

Altera a “Lei do Cibercrime”, descriminalizando o ensino e a investigação científica

Altera a “Lei do Cibercrime”, descriminalizando o ensino e a investigação científica

Exposição de Motivos

Com a aprovação da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, vulgo “Lei do Cibercrime”, foi revista e reformulada a legislação nacional sobre criminalidade informática. O PCP encarou com naturalidade tal processo no quadro das convenções internacionais e do Direito comunitário a que Portugal está vinculado, considerando que tal legislação foi aprovada há já muitos anos, em 1991, num quadro muito diferente do actual. Nesse sentido, é uma evidência que essa lei estava profundamente desactualizada em função da realidade tecnológica actual e, também, da criminalidade informática existente.

Questão diferente, oportunamente suscitada pelo PCP, foi a forma utilizada pelo Governo para transpor estes instrumentos de Direito internacional – nomeadamente no que concerne à proposta que resultou na aprovação da actual lei.

Manifestámos então as nossas reservas quanto a essa matéria, particularmente quanto à questão da latitude da incriminação consagrada no diploma. No contexto desse debate parlamentar, foram expressas preocupações e alertas das comunidades educativa, científica, dos utilizadores das tecnologias, com destaque para a contribuição da Associação Nacional para o Software Livre – que foi aliás considerada nas propostas de alteração que o PCP apresentou na especialidade. Posteriormente, e após a publicação da referida lei em Diário da República, vários cidadãos se têm dirigido à Assembleia da República manifestando a sua discordância e preocupação face às normas que ela impõe.

Com efeito, a lei em vigor estabelece não apenas a incriminação de comportamentos ilícitos, designadamente intromissão em sistema informático (como, por exemplo, a introdução de um vírus num sistema informático). Criminaliza-se também a produção de programas susceptíveis de gerar esse tipo de comportamentos.

Tal como o PCP observou no debate em Plenário, estamos perante um erro comparável ao de confundir o crime de homicídio com o fabrico da arma que pode ser utilizada num homicídio. O que a realidade demonstra é que é perfeitamente possível – e deve ser evidentemente encarado como legítimo – conceber programas informáticos, até para efeitos de investigação com vista à prevenção e mesmo à repressão da criminalidade informática. Tal produção intelectual, obviamente, não pode ser criminalizada, mas neste momento é o que sucede: a lei em vigor determina algo que tem que ver, já não apenas com a prevenção da criminalidade, mas mesmo com a proibição de produção intelectual e até de investigação científica e tecnológica.

Por essas razões o PCP apresenta esta iniciativa, com o objectivo de salvaguardar o ensino e a investigação científica, designadamente retirando as referências na lei à produção ou distribuição de programas ou dados informáticos que possam ser utilizados para o estudo, a investigação, a auditoria de segurança de sistemas informáticos.

Assim, ao abrigo do disposto no Artigo 156.º da Constituição da República e do Artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo único
Alteração à “Lei do Cibercrime”

São alterados os artigos 4.º, 5.º, e 6.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, que passam a ter a seguinte redacção:  

«Artigo 4.º
[…]
1 – (…).
2 – (…).
3 – Incorre na mesma pena do n.º 1 quem ilegitimamente por qualquer forma introduzir num ou mais sistemas informáticos dispositivos, programas ou outros dados informáticos destinados a produzir as acções não autorizadas descritas nesse número.
4 – (…).
5 – (…).
6 – (…).
7 – A produção ou distribuição no contexto de ensino ou investigação, sem intenção de causar prejuízo a outrem ou de obter um benefício ilegítimo, para si ou para terceiro, não é ilegítima. 

Artigo 5.º
[…]
1 – (…).
2 – Na mesma pena incorre quem ilegitimamente por qualquer forma introduzir num ou mais sistemas informáticos dispositivos, programas ou outros dados informáticos destinados a produzir as acções não autorizadas descritas no número anterior.
3 – (…).
4 – (…).
5 – (…).
6 – A produção ou distribuição no contexto de ensino ou investigação, individual ou em estabelecimento de ensino seja este público ou privado, sem intenção de causar prejuízo a outrem ou de obter um benefício ilegítimo, para si ou para terceiro, não é ilegítima. 

Artigo 6.º
[…]
1 – (…).
2 – Na mesma pena incorre quem ilegitimamente por qualquer forma introduzir num ou mais sistemas informáticos dispositivos, programas um conjunto executável de instruções, um código ou outros dados informáticos destinados a produzir as acções não autorizadas descritas no número anterior.
3 – (…).
4 – (…).
5 – (…).
6 – (…).
7 – A produção ou distribuição no contexto de ensino ou investigação, individual ou em estabelecimento de ensino, sem intenção de causar prejuízo a outrem ou de obter um benefício ilegítimo, para si ou para terceiro, não é ilegítima.»

Assembleia da República, em 23 de Setembro de 2010

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