Intervenção de

Alterações no sistema fiscal

 

Alteração dos Códigos do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), do Imposto sobre Veículos (ISV), do Imposto Único de Circulação (IUC) e do Estatuto dos Benefícios Fiscais, visando gerar receitas adicionais, introduzir maior justiça fiscal e promover maior equidade na distribuição de rendimentos
Criação de um novo imposto sobre operações realizadas no Mercado de Valores Mobiliários

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

O PCP traz hoje a debate dois projectos de lei (projecto de lei n.º 732/X e projecto de lei n.º 733/X) com objectivos bem claros e precisos.

Em primeiro lugar, o PCP quer fazer alterações significativas no sistema fiscal que, sem aumentar um cêntimo a carga fiscal para a esmagadora maioria dos portugueses, sem qualquer sobrecarga fiscal para as micro e pequenas empresas, permitam que o Estado aumente as suas receitas fiscais.

Em segundo lugar, o PCP quer também fazer alterações no regime de deduções fiscais que permitam, simultaneamente, aliviar o fardo fiscal sobre as famílias de menores rendimentos e aumentar o rendimento disponível de todos os que são tributados pelos escalões inferiores do IRS.

Podem dizer o que quiserem. Pode alguma direita e algum PS dizer que estas medidas propostas pelo PCP aumentam a carga fiscal, penalizam os contribuintes ou, quiçá, são apresentadas na parte final da Legislatura. São argumentos falsos que constituem meros pretextos para recusar ou desvalorizar a importância destas iniciativas.

Estas iniciativas, ao contrário do que dizem ou possam dizer, são apresentadas na lógica e em sequência de iniciativas anteriores do PCP e, ao contrário do que possam argumentar, visam, tão-só e em exclusivo, tributar de forma extraordinária bens de luxo, transacções bolsistas e lucros milionários de grandes grupos económicos e financeiros.

Sr. Presidente,
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados:

Num cenário de crise nacional e mundial provocada pelo mesmo tipo de políticas e de orientações neoliberais que são realizadas pelo Governo de José Sócrates, quando, em Portugal, as consequências dessa crise se medem em meio milhão de portugueses sem emprego - números oficiais - e em dezenas e dezenas de milhares de trabalhadores ameaçados por cortes ou reduções nos seus salários, as grandes soluções oficiais para enfrentar a crise têm passado pela deslocação de milhares de milhões de euros de fundos públicos para o sistema financeiro, com consequências imediatas nas contas públicas, acompanhadas pelo condicionamento e limitação do crédito acessível para as micro e pequenas empresas e para os projectos de natureza pública, a par do pré-anúncio de novas medidas futuras de contenção ou restrição nas despesas sociais.

Há, porém, outros caminhos. Por isso, temos proposto e defendido o reforço do papel e da intervenção do Estado em sectores e áreas estratégicos, particularmente no sector financeiro, energia, telecomunicações e transportes. Por isso, temos continuado a exigir o fim dos paraísos fiscais e denunciado a política de boas intenções praticada pelo Governo, que continua «à espera de Godot», enquanto a evasão e o crime fiscal proliferam.

Entendemos que o Estado tem a obrigação estrita de diversificar a sua capacidade de aumentar receitas para fazer face a antigas, actuais, mas permanentes, necessidades no âmbito social.

Por isso, apresentamos hoje ao País a criação de um novo imposto - o imposto sobre as transacções em Bolsa, o ITB -, imposto sobre as transacções financeiras em Bolsa.

Trata-se de um imposto de nova geração, com uma pequena taxa de 0,1% (isto é, 1/1000), aplicável a todas as transacções financeiras efectuadas na Bolsa. Trata-se de um imposto nacional que não precisa de autorização ou de articulação na União Europeia. Trata-se de um imposto que seria liquidado metade pelo comprador, metade pelo vendedor (ou seja, 0,5/1000 para cada um dos intervenientes na transacção). Trata-se de um imposto que, apesar da sua diminuta taxa, se poderia traduzir em receitas muito significativas. Só em 2008, a Bolsa de Lisboa transaccionou 154 000 milhões de euros. E, no 1.º trimestre de 2009, apesar da crise, os movimentos em Bolsa totalizaram 14 000 milhões de euros.

Se o imposto sobre as transacções em Bolsa já existisse, a receita para o Estado, no 1.º trimestre de 2009, podia ter atingido 14 milhões de euros.

Receita de que o País bem precisa. Receita, diga-se e sublinhe-se novamente, que nem um cêntimo iria buscar ao bolso dos trabalhadores ou das micro e pequenas empresas.

Sr. Presidente,
Sr.as Deputadas,
Srs. Deputados:

As desigualdades na distribuição dos rendimentos são crescentes em Portugal. A remuneração dos administradores executivos das empresas cotadas em Bolsa é mais de 100 vezes o salário mínimo nacional.

Os cinco maiores bancos em actividade no País tiveram mais de 500 milhões de euros de lucros no 1.º trimestre de 2009. Apesar da crise! Os cinco maiores grupos económicos nos sectores da energia e das telecomunicações tiveram mais de 550 milhões de euros de lucro no 1.º trimestre de 2009. Apesar da crise, Srs. Deputados!

Aceitar o congelamento ou o corte parcial dos salários de quem trabalha, como tem sido imposto ou tem sido ensaiado em muitas empresas, com o apoio implícito ou explícito do Governo - veja-se o caso mais recente da AutoEuropa -, significa exactamente o benefício dos accionistas dos grandes grupos, o agravamento das injustiças, novas reduções no poder de compra dos portugueses e no consumo interno no País, com reflexos e os efeitos económicos e sociais inevitáveis e bem conhecidos dos portugueses.

O País precisa que a riqueza produzida seja melhor distribuída. Exige-se uma nova política que defenda e concretize aumentos do poder de compra, do salário mínimo nacional, das pensões e reformas, que promova o aumento do consumo privado e contribua, assim, para o relançamento da economia nacional.

Mas, a par disso, o País precisa também de uma política fiscal que sirva para atenuar o fosso hoje existente entre grandes rendimentos e patrimónios, por um lado, e a quase exclusão social de quase 20% da nossa população, por outro lado.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, apresentamos também hoje ao País um projecto que pretende, por via fiscal, atenuar as desigualdades e aumentar o rendimento disponível dos que menos possuem. Por isso, propomos que, de uma vez por todas, as mais-valias bolsistas sejam totalmente tributadas. Por isso, propomos que quem ganhe mais de 200 000 € por ano passe a pagar mais 4 pontos percentuais (46% em vez de 42%) na parte que supere aquele valor. Por isso, propomos que prémios ou indemnizações de administradores sejam tributados com taxas autónomas iguais ou superiores a 75%. Por isso, propomos que os patrimónios pessoais superiores a 1 milhão de euros que produzam rendimentos anuais sejam tributados com uma taxa autónoma de 0,5%. Por isso, propomos que os grandes grupos financeiros e económicos, com lucros líquidos superiores a 50 milhões de euros anuais - repito: 50 milhões de euros - paguem mais 5 pontos percentuais de IRC (30% em vez de 25%), a incidir somente na parte de lucro que supere aquele valor de 50 milhões. Por isso, propomos que quem compre um prédio de valor superior a 1 milhão de euros passe a pagar imposto municipal sobre transacções a uma taxa de 10% em vez de 6%.

E, por isso, propomos também que o imposto municipal sobre imóveis (IMI) seja de 1%, em vez de 0,7%, apenas para os prédios com valor superior a 1 milhão de euros. Aqueles poucos, muito poucos portugueses que são proprietários de aviões particulares, iates de recreio ou automóveis de luxo devem passar a pagar, por imperativo ético e político, tal como consta do projecto que, hoje, aqui debatemos, taxas agravadas dos respectivos impostos.

Mas, Sr. Presidente,
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados,

A par do aumento de receitas fiscais resultantes deste esforço suplementar que se exige a quem tem elevados rendimentos e elevadíssimos patrimónios, o PCP propõe-se, também por via fiscal, a aumentar o rendimento disponível dos que menos podem e dos que menos possuem. Por isso, propomos majorar, de forma degressiva, as deduções com despesas de saúde dos portugueses apenas dos escalões inferiores do IRS.

Tal como o Governo fez em Setembro de 2008, com a majoração degressiva das deduções dos escalões inferiores de IRS para as prestações dos empréstimos para a compra de habitação, o PCP propõe agora exactamente a mesma medida para as despesas com os encargos daqueles que pagam rendas de casa (isto é, dos que não têm empréstimos, mas pagam renda de casa, ou seja, têm menores rendimentos), e, igualmente, para as despesas com a saúde feitas pelas pessoas que têm os mesmos escalões inferiores de IRS.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

O Relatório de Orientação da Política Orçamental, que o Governo apresentou há dias, revela bem a forma insuficiente como o Governo está a responder à crise com que os portugueses estão confrontados.

A famosa Iniciativa para o Investimento e Emprego representa, segundo o Governo, globalmente, entre 2008 e 2009, 1,2% do PIB nacional. Em termos europeus, os diversos programas nacionais representam, em média, 3,3% dos respectivos PIB. Por aqui se mede com exactidão a dimensão da insuficiência dos meios financeiros e das chamadas medidas com que o Governo diz estar a combater a crise.

É urgente aumentar os meios financeiros para combater a crise. É urgente aumentar os fundos para investimentos públicos de efeitos imediatos na economia e no emprego, em escolas, mas também em unidades de saúde, em instalações de forças de segurança ou para a justiça. É urgente aumentar os meios orçamentais para fazer face à avalanche social do desemprego e da exclusão, reforçando o valor do subsídio de desemprego, melhorando o seu acesso, aumentando a sua duração. É urgente aumentar os meios orçamentais para promover, de facto, o apoio ao investimento e ao funcionamento das micro e pequenas empresas.

É, por isso, urgente, Sr.as e Srs. Deputados, aumentar as receitas fiscais sem sobrecarregar os que trabalham, sem sobrecarga fiscal das micro e pequenas empresas.

Para isso, Sr.as e Srs. Deputados, ficam para debate estes dois projectos de lei do PCP.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado José Manuel Ribeiro,

Tive o cuidado de, na minha intervenção, fazer um pré-aviso, pois já estava à espera que o argumento da direita fosse, essencialmente, aquele que foi utilizado pelo Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, o de que estes projectos do PCP iriam aumentar a carga fiscal dos portugueses. O Sr. Deputado é muito previsível.

O Sr. Deputado faz parte da direita e a direita é, infelizmente, muito previsível no nosso país. E vou demonstrar-lhe porquê. É que nada do que o senhor disse consta dos projectos de lei do PCP. Não queremos aumentar a carga fiscal para os portugueses, queremos aumentar a contribuição e o fardo fiscal sobre quem ganha mais de 200 000 € por ano, Sr. Deputado José Manuel Ribeiro!

É justo que esses portugueses, em vez de pagarem 42%, paguem 46%!

Sabem quanto é que pagam em Inglaterra pessoas com rendimentos um pouco inferiores, Sr. Deputado José Manuel Ribeiro? Pagam 50%! Como se está a ver, ficamos bem abaixo disso!

Considera ou não que é justo que quem tem um avião particular ou um iate pague uma taxa agravada pela utilização e detenção destes bens patrimoniais?!

Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, trata-se somente disto: a direita quer enganar os portugueses dizendo que o PCP propõe aquilo que não propõe.

Pelo contrário, o que também hoje propomos é que quem está nos três primeiros escalões do IRS aumente as suas deduções com as despesas de saúde, aumente as suas deduções com rendas de casa, isto é, passe a ter rendimentos disponíveis superiores.

E isso, Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, a direita não consegue ver, o que não é surpresa!

(...)

Sr. Presidente.
Sr. Deputado Luís Fazenda,

Agradeço a sua pergunta.

De facto, ia fazer essa pergunta ao Sr. Deputado Victor Baptista, mas o Sr. Deputado antecipou-se.

O Sr. Deputado Victor Baptista, quando usar da palavra, terá oportunidade de comentar.

De facto, o Dr. Vital Moreira apresentou ontem a proposta de criação de um imposto europeu sobre transacções financeiras. Mas para isso suceder, como todos sabemos, é preciso o consenso de 27 Estados, o que significa que, porventura, esta proposta é para «deitar para o caixote do lixo», é para fazer retórica na campanha eleitoral.

Aliás, a eurodeputada Ilda Figueiredo, hoje de manhã, já lançou um repto ao Deputado Vital Moreira, perguntando se ele estaria disposto a influenciar a bancada do Partido Socialista a aprovar o projecto de lei do PCP que propõe a criação de um imposto sobre transacções financeiras, não na Europa, mas em Portugal.

Portanto, respondendo ao Deputado Luís Fazenda, também lançamos o repto ao Dr. Vital Moreira - e ao Deputado Victor Baptista, por antecipação - no sentido de perguntar de se esta é ou não a altura de criar, primeiro em Portugal, por razões de justiça, um imposto sobre transacções financeiras em Bolsa, que, repito, apesar da crise, só no primeiro trimestre deste ano, podia ter-se traduzido numa receita fiscal acrescida de perto de 15 milhões de euros. Vamos ver como responde o Partido Socialista!.

(...)

Sr. Presidente,

O Sr. Deputado Luís Fazenda deu o mote, eu dei-lhe seguimento e lancei o repto, por antecipação, ao Deputado Victor Baptista para comentar a proposta do Professor Vital Moreira.

Ele não o fez, mas eu vou insistir.

Gostávamos de perceber se a bancada do Partido Socialista e o Deputado Victor Baptista, em particular, entendem ou não que aquilo que se propõe para a Europa é bom e aquilo que nós propomos para Portugal passa a ser mau. Era esta a pergunta que gostaríamos muito de ver hoje aqui respondida.

Além disso, Sr. Deputado, o que me parece é que o senhor está preocupadíssimo pelo facto de os lucros do sector bancário e financeiro descerem 44%.

E eu pergunto-lhe: mas será que a banca teve prejuízo? Será que a banca vai ter prejuízo?

Não vai, Sr. Deputado! Não vai ter prejuízo! Só no 1.º trimestre de 2009, a banca, com a qual o senhor está tão preocupado, teve mais de 500 milhões de euros de lucro, Sr. Deputado Victor Baptista.

Ao contrário do que o senhor diz, o PCP não propõe um aumento do IRC.

O senhor, tal como a direita fez aqui, neste debate, está a «agitar espantalhos», está a «atirar areia para os olhos» dos micro e pequenos empresários, está a tentar passar uma imagem falsa das propostas do PCP, que aqui não propõem o aumento de 1 cêntimo, sequer, sobre as micro e pequenas empresas!

O que propomos, Sr. Deputado Victor Baptista - e por isso corrija o que disse e não lance espantalhos -, é aumentar o IRC para os grupos económicos que têm mais de 50 milhões de euros de lucros anuais! A proposta de aumento é só para essas!

Quantas são as empresas, Sr. Deputado Victor Baptista? Está preocupado com elas? Está preocupado que se peça um pouco mais de esforço a estas empresas?! Olhe, eu não estou!

O senhor, pelos vistos, está!

Mas o senhor não quis comentar uma outra proposta, que se refere ao aumento das deduções para os rendimentos inferiores. O senhor recusa-se a alargar uma proposta feita pela sua bancada, em Setembro de 2008.

Recusa-se a alargar as deduções com as rendas de casa para os escalões inferiores do IRS. Recusa-se a alargar as deduções de saúde para quem ganha menos, para os escalões inferiores do IRS.

Isto, o senhor não vê! Para isto, o senhor está cego, surdo e mudo como, pelos vistos, está cega, surda e muda a bancada do PS, que quer dar uma imagem de esquerda, mas, de facto, não consegue!

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