Pergunta ao Governo N.º 3830/XII/1

Acesso de dirigentes cooperativos à reforma antecipada

Acesso de dirigentes cooperativos à reforma antecipada

O atual Governo de coligação entre o PSD e o CDS tem insistido na afirmação da valorização do voluntariado social e das instituições ou organizações que, não assumindo uma lógica de funcionamento para a obtenção de lucros, concretizam uma significativa intervenção económica
e social em prol das comunidades em que estão inseridas. A apresentação pelos Grupos Parlamentares do PSD e do CDS de uma proposta de Lei de Bases da Economia Social aparentemente iria ao encontro desse discurso.
No entanto, as opções políticas do atual Governo assentam numa realidade que vai muito além do discurso político imediato. A proposta de retirar da Constituição da República Portuguesa a valorização e o enquadramento jurídico e político do sector cooperativo e social, apresentada pelo PSD no final da anterior legislatura, a par das opções políticas concretas no plano do acesso ao financiamento e ao crédito, dos programas operacionais no âmbito do QREN, a revogação do Estatuto Fiscal Cooperativo, e o fim da discriminação positiva, tanto no plano fiscal como contributivo, são exemplos de que a intervenção política concreta está muito afastada da retórica política deste governo e dos partidos que o suportam.
Há dias o Grupo Parlamentar do PCP foi confrontado com um exemplo que vem reforçar esta leitura política das opções e prioridades do Governo. No passado dia 9 de Março, o Grupo Parlamentar do PCP entregou a Pergunta ao Governo n.º 2416/XII/1ª sobre a recusa na atribuição do subsídio de desemprego a dirigentes associativos. Nesta pergunta ao Governo afirmámos:
«Em outubro de 2011 o Grupo Parlamentar do PCP confrontou o Governo com a escandalosa situação de a Segurança Social estar a indeferir a atribuição da prestação de subsídio de desemprego pelo facto de a pessoa então em causa, ser dirigente associativo. Como referimos na devida altura, a atividade de dirigente associativo, naquele caso, não era remunerada, pelo que nada justificava aquela decisão. No dia 16 de Novembro, o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, respondeu ao Grupo Parlamentar do PCP, afirmando que se tratou de um lapso. Acontece que a Segurança Social voltou a cometer o atrás referido “lapso”. Chegou ao conhecimento do Grupo Parlamentar do PCP uma outra situação idêntica. Desta vez foi uma dirigente da associação “Amigos Atletismo Charneca da Caparica”, que viu indeferida a pretensão de atribuição da prestação de desemprego. Acontece que este indeferimento ocorre no passado dia 27 de Dezembro de 2011, isto é, depois da resposta deste Ministério a admitir o lapso cometido.»
Na sua resposta do passado dia 4 de Julho de 2012 o Governo afirma: «Na situação reportada pelo Grupo Parlamentar do PCP, já foi corrigido o enquadramento da entidade sem fins lucrativos e já foi deferido o subsídio de desemprego à beneficiária.
Inicialmente, a generalidade dos membros de órgão estatutários (MOE) de pessoas coletivas, não remunerados, e que não estavam obrigatoriamente enquadrados no respetivo regime,
estavam qualificados com um código que abrangia todos os MOE. Com a implementação da aplicação informática nacional de gestão do subsídio de desemprego, que ocorreu em 2005, a maior parte das situações com o código antigo foram migradas das anteriores aplicações informáticas (…) podendo ocorrer, pontualmente, sobreposição com situações de MOE que os serviços analisam e corrigem a qualificação após confirmarem a natureza da pessoa coletiva, tal como sucedeu nesta situação.»
Num processo com diferenças, mas que tem em comum tratar-se de um membro de um órgão estatutário, no caso da cooperativa de consumo COOPPOFA, um dirigente acumulava as funções de membro da direção da cooperativa com a de gerente a tempo inteiro. Entretanto, o mesmo, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 187/2007, solicitou à Segurança Social a pensão antecipada do regime de flexibilização por velhice.
No ofício em que informa o deferimento da pensão, a Segurança Social esclarece que «É proibida a acumulação de pensão antecipada de velhice, atribuída no âmbito da flexibilização, com rendimento provenientes de exercício de trabalho ou atividade, a qualquer título, na mesma empresa ou grupo empresarial, por um período de três anos». Acrescentando que o mesmo será válido para rendimentos de trabalho independente para as mesmas entidades.
Por fim, o ofício a Segurança Social solicita a entrega de um comprovativo em que o dirigente em causa «renuncia à gerência da firma em questão».
No decorrer do processo, o dirigente em causa, para aceder à respetiva pensão de reforma, foi obrigado a renunciar ao mandato de dirigente da COOPPOFA, cargo que não corresponde à atividade remunerada que até então exercia na mesma cooperativa.
Como é do conhecimento do Ministério da Solidariedade e da Segurança Social e, com certeza, também da própria Segurança Social a generalidade dos membros dos órgão sociais das cooperativas de consumo não auferem qualquer remuneração a qualquer título pela atividade
associativa, em regime de voluntariado, que exercem.
Neste caso, o dirigente em causa, ao reformar-se, renunciou à sua atividade remunerada na COOPPOFA, passando a exercer a sua responsabilidade estatutária em regime de voluntariado.
No entanto, por ação da Segurança Social, tal não foi possível, pelo que o mesmo teve que se demitir.
Ao Grupo Parlamentar do PCP têm chegado informações de que casos idênticos, em que estão em causa dirigentes ou outros membros de órgão sociais em regime de voluntariado, têm vindo a verificar-se noutras cooperativas de consumo.
Acontece que sendo as cooperativas de consumo empresas associativas que poderão gerar excedentes, segundo o Código Cooperativo, estes terão que ser aplicados na própria atividade da cooperativa não sendo distribuídos pelos seus membros, ao contrário do que poderá acontecer com outro tipo de cooperativas. Pelo que nestas cooperativas não se verifica a distribuição de rendimentos aos associados, nem aos seus dirigentes.
Assim, ao abrigo da alínea d) do artigo 156º da Constituição e nos termos e para os efeitos do 229º do Regimento da Assembleia da República, perguntamos ao Ministério da Solidariedade e da Segurança Social o seguinte:
1.Tendo em conta que este Ministério já tinha sido alertado para este problema e que este reconheceu o “lapso” no caso de processos de atribuição de subsídios de desemprego, como justifica que se verifiquem novos casos em processos de atribuição de pensões de reforma?
2.Tem o Governo conhecimento que as cooperativas de consumo não distribuem os seus excedentes pelos seus membros ou dirigentes, os quais exercem o seu mandato a título de voluntariado, sem qualquer remuneração, exceto nos casos em que existe uma norma
estatutária, aprovada em Assembleia Geral que atribua uma determinada remuneração a determinados dirigentes?
3.Que medidas vai o Ministério tomar, de uma vez por todas, para resolver o problema acima descrito e outros, semelhantes, que possam surgir?

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