Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral

45.º Aniversário da libertação dos povos das ex-colónias portuguesas

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Permitam-me que comece por valorizar e agradecer a presença de representantes do MPLA, do PAICV, do PAIGC e da FRELIMO neste encontro promovido pelo PCP comemorativo do 45.º aniversário da conquista da independência dos povos africanos das colónias portuguesas.

Para o PCP é motivo de grande satisfação e alegria ter-vos aqui connosco neste acto singelo mas que vemos carregado de significado político, pois com ele recordamos um acontecimento particularmente marcante da história dos nossos partidos e dos nossos povos, que assinala, a par da conquista da independência pelos povos de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, que foi alcançada à custa dos mais pesados sacrifícios, a aliança entre os nossos povos no combate contra o inimigo comum, o fascismo e o colonialismo português.

Uma aliança que tornou inseparáveis a Revolução Portuguesa de 25 de Abril, que colocou fim a 48 anos de ditadura fascista em Portugal, e a libertação dos povos africanos do jugo colonial português.

Uma aliança que desejamos possa prosseguir na actualidade com relações de amizade e cooperação entre o Portugal democrático e os Estados africanos independentes, orientadas pelos valores da soberania, do progresso social e da paz, de onde sejam definitivamente afastados preconceitos paternalistas e propósitos neocolonialistas.

O PCP está a celebrar o centenário da sua fundação em 6 de Março de 1921 e ao avaliar o caminho percorrido, também ele marcado por pesados sacrifícios, a dureza da clandestinidade e a violência da repressão fascista, é com orgulho que podemos afirmar que o PCP foi o único partido que, enfrentando de cabeça bem erguida a infame calúnia de “traição à pátria”, esteve sempre solidário com a luta libertadora dos povos das colónias portuguesas, forjando com os movimentos revolucionários de libertação africanos estreitas relações de amizade e cooperação, relações que resistiram a grandes mudanças e viragens e se prolongaram até aos nossos dias.

Orgulhamo-nos do papel desempenhado pelo órgão central do nosso Partido, o “Avante!”, o jornal clandestino que até à Revolução de Abril, sem esquecer a Rádio Portugal Livre, foi praticamente a única voz a denunciar sistematicamente os crimes do colonialismo, a apoiar as lutas pela independência e a exigir o fim das guerras coloniais.

Orgulhamo-nos das arriscadas acções promovidas pelos militantes comunistas contra a guerra, a propaganda clandestina, as lutas nos quartéis, a agitação entre as tropas mobilizadas, as operações de sabotagem de armamento para a guerra colonial levadas a cabo pela Acção Revolucionária Armada.

Orgulhamo-nos de termos tido ao nosso lado no movimento da Oposição Democrática, nomeadamente no MUD Juvenil, revolucionários que se tornaram dirigentes dos seus movimentos de libertação nacional e dos novos Estados independentes.

E orgulhamo-nos sobretudo da posição de princípio do nosso Partido de condenação do colonialismo e reconhecimento do direito dos povos sujeitos ao domínio colonial português à autodeterminação e à independência, posição de sempre do PCP que o V Congresso em 1957 tornou particularmente visível, com o relatório «Sobre o Problema das Colónias», apresentado pelo camarada Jaime Serra, e a declaração então adoptada que sublinhou o direito à incondicional, imediata e completa independência dos povos africanos colonizados.

Partido patriótico e internacionalista, profundamente convicto de que não pode ser livre um povo que oprime outros povos, o PCP sempre considerou que a sua luta contra o domínio imperialista sobre Portugal era inseparável da liquidação do colonialismo português, como considerou a luta dos povos colonizados por Portugal como uma ajuda à luta do povo português. No Programa aprovado no VI Congresso realizado em 1965, o PCP inscreveu como um dos oito objectivos fundamentais da Revolução Democrática e Nacional “reconhecer e assegurar aos povos das colónias portuguesas o direito à imediata independência”. Um objectivo que a Revolução de Abril ajudou a concretizar, sem que, no entanto, não tenha que ter enfrentado a forte resistência e a oposição terrorista da reacção contra-revolucionária e que implicou, mesmo com partidos do campo democrático, um duríssimo combate, como se viu particularmente em relação à proclamação da independência de Angola, em 11 de Novembro de 1975, cerimónia que o Governo português de então boicotou e na qual apenas esteve representado o PCP.

Pergunta-se por vezes como foi possível que o império colonial português tivesse tido tal longevidade e fosse o último a desaparecer. A nossa resposta é clara: isso aconteceu porque, sendo Portugal um país colonizador, era simultaneamente um país colonizado pelo imperialismo. Sem o apoio da NATO ao regime fascista de Salazar e Caetano, sem a conivência interesseira das chamadas “democracias ocidentais” e o armamento com que alimentavam as criminosas guerras coloniais, o fascismo e o colonialismo português não teriam sobrevivido ao impetuoso movimento libertador estimulado pela Vitória sobre o nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial, cujo 75.º aniversário este ano comemoramos.

45 anos passados, muitos acontecimentos tiveram lugar marcando a evolução da situação nos nossos países e no mundo. O imperialismo e as forças reaccionárias nunca se conformaram com as derrotas sofridas com a Revolução portuguesa, com a conquista da independência dos povos das colónias portuguesas e a derrota do apartheid na África Austral, com a derrocada dos impérios coloniais. É por isso que, tirando partido da imensa alteração na correlação de forças no plano internacional que resultou do desaparecimento da União Soviética, o imperialismo pôs em marcha uma violenta ofensiva exploradora e agressiva contra os trabalhadores e os povos, de que são parte integrante a tentativa de imposição de políticas neocolonialistas e de recolonização em África, na América Latina ou na Ásia. Para tanto utiliza os mais diversos instrumentos, que vão desde o flagelo da dívida e à pilhagem das multinacionais, ao apoio às forças mais reaccionárias e obscurantistas e mesmo à utilização de grupos mercenários terroristas. Não obstante as importantes conquistas e mudanças verificadas, o imperialismo procura por todos os meios afastar do poder as forças que conduziram a luta de libertação dos seus povos e apagar da sua memória a gesta de generosidade e heroísmo de patriotas como Amílcar Cabral, Agostinho Neto ou Samora Machel.

Acabámos de realizar o XXI Congresso do PCP. A situação que vivemos em Portugal é muito complexa e exigente e a situação mundial muito instável, incerta e perigosa. Mas estamos convictos e determinados em torno das decisões tomadas e confiantes em que as aspirações dos trabalhadores e do povo português, que são a razão de ser do nosso Partido, acabarão por triunfar. Nem mesmo a violentíssima campanha anti-comunista orquestrada com o pretexto do nosso Congresso frustrou a sua realização, prejudicou as suas decisões ou influenciou o nosso ânimo na luta. Não ignorando obstáculos e dificuldades, estamos confiantes no futuro democrático e socialista de Portugal.

Lutando por uma alternativa patriótica e de esquerda que abra caminho a uma democracia avançada com os valores de Abril no futuro de Portugal – de que é parte integrante a luta em defesa da soberania e independência de Portugal, contra as imposições externas da NATO, da União Europeia e do imperialismo em geral –, o PCP considera que, como aconteceu no passado, nos continuam a unir os valores da soberania, progresso social, paz e cooperação. Queremos por isso pedir aos nossos amigos do MPLA, do PAICV, do PAIGC e da FRELIMO aqui presentes que transmitam às direcções dos vossos Partidos a vontade do PCP de prosseguir com as suas tradicionais relações de amizade, e assegurar-lhes da solidariedade dos comunistas portugueses para com a acção e a luta que travam pela prosperidade dos seus povos e a soberania e independência dos seus países.

Viva a amizade entre os povos!
Viva a solidariedade internacionalista!