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Projecto de Resolução nº 214/IX
Sobre medidas de apoio às vítimas de prostituição e tráfico de mulheres

 

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Atendendo a que:

1 – No passado dia 2 de Dezembro, Dia Internacional para a Abolição da Escravatura, celebraram-se 54 anos sobre a aprovação da Convenção das Nações Unidas de 1949 para a Supressão de Tráfico de Pessoas e da Exploração da da Prostituição de Outrém, ratificada por Portugal em 1991, e que no seu preâmbulo afirma que “...a prostituição e o mal que a acompanha, a saber, o tráfico de pessoas com vista à prostituição, são incompatíveis com a dignidade e o valor da pessoas humana e põem em perigo o bem-estar do indivíduo, da família e da comunidade”.

2 – Mais de meio século passado, a prostituição e o tráfico de mulheres e crianças para efeitos de exploração sexual são realidades mundiais, tendo-se tornado questões sociais muito preocupantes que assumem dimensões e contornos dramáticos. As Nações Unidas estimam que quatro milhões de pessoas no Mundo são traficadas para efeitos de exploração sexual, sendo que a maioria são mulheres e crianças. Na União Europeia, cerca de 500 000 mulheres e crianças vítimas de tráfico são abusadas e exploradas sexualmente. O recrutamento para a prática da prostituição é efectuado em idades muito jovens, incluindo crianças entre os 13 e os 16 anos, e cerca de 70 a 80% das pessoas prostituídas foram vítimas de abuso sexual ou de violação. O tráfico de seres humanos, tem dimensões mundiais, é directamente controlado pelo crime organizado e rivaliza em importância com o tráfico de armas e drogas, estimando-se que representa lucros no valor de 12 mil milhões de dólares por ano (OIT, 2003). A maioria das vítimas vive em situações de autêntica escravatura e são vítimas das piores violências sexuais, físicas e psicológicas.

3 – Também em Portugal a prostituição é um fenómeno de dimensão nacional e transnacional que vitimiza, por forma dramática, muitas mulheres e crianças, havendo múltiplas redes de tráfico actuando no território nacional.

4 – É reconhecido quer pelas instituições que trabalham no terreno com as vítimas, quer por diversas organizações internacionais, que as principais causas da prostituição são a pobreza e a discriminação social das mulheres e das crianças, o que as coloca numa posição de maior vulnerabilidade.

5 – Para além da Convenção da ONU de 1949, diversos instrumentos de Direito Internacional, a maioria dos quais ratificado por Portugal, contêm normas e recomendações sobre prostituição e tráfico de pessoas, nomeadamente ao nível da Organização das Nações Unidas, da União Europeia e do Conselho da Europa, incluindo medidas efectivas de apoio às vítimas.

6 - A prostituição e o tráfico de mulheres e crianças constituem uma clara violação dos direitos humanos, da dignidade humana, e dos princípios fundamentais do direito e da democracia.

7 – A luta contra a prostituição e o tráfico de seres humanos deve assentar necessariamente em medidas preventivas, numa legislação eficaz e em medidas efectivas de apoio às vítimas.

8 – Em Portugal são claramente insuficientes as estruturas de apoio às mulheres vítimas de prostituição e tráfico, que permitam a sua recuperação psicológica e física e a sua efectiva integração social.


A Assembleia da República, nos termos da alínea b) do artigo 156º da Constituição da República Portuguesa, delibera:

1 – Afirmar a necessidade urgente de serem tomadas medidas efectivas de apoio às mulheres vítimas de prostituição e tráfico para efeitos de exploração sexual.

2 – Recomendar a criação de linhas SOS de atendimento permanente para vítimas de prostituição.

3 – Recomendar a criação de uma rede de centros de apoio e abrigo para mulheres vítimas de prostituição e tráfico, que prestem assistência psicológica, médica, social e jurídica.

4 – Recomendar a adopção urgente de estratégias específicas de integração social das mulheres vítimas de prostituição, nomeadamente através de programas de formação profissional de emprego que aumentem as suas oportunidades económicas e de autonomia social.

5 – Recomendar a realização de parcerias e o apoio a organizações não governamentais de reconhecida experiência que apoiem as mulheres vítimas de prostituição e tráfico.

6 – Recomendar que, relativamente às mulheres vítimas de tráfico para efeitos de exploração sexual, se tomem medidas urgentes, visando em particular:

a) criação de serviços de atendimento especializado que tomem as primeiras medidas visando assegurar a sua integridade física, tal como a lei prevê, garantindo que possam apresentar queixa às autoridades judiciárias sem recear a expulsão do país;

b) criação de serviços SOS de atendimento telefónico, susceptíveis de aconselhar as mulheres vítimas de tráfico na sua língua materna;

c) assegurar o acolhimento temporário, em lugar seguro, que garanta assistência psicológica, médica, social e jurídica;

d) garantir facilidades de tradução, nomeadamente na polícia e nos tribunais;

e) possibilidade de acesso a autorização de residência, e de autorização de exercício de actividade profissional, sempre que a repatriação possa pôr em perigo a segurança das vítimas ou exista a possibilidade de serem de novo vítimas de exploração.

f) Garantir a repatriação das vítimas quando fôr esse o seu desejo, adoptando as medidas necessárias para que a sua segurança e protecção sejam asseguradas.

7 – Salientar que uma política de prevenção contra a prostituição deve ter por base uma transformação das mentalidades dos homens, das mulheres, a todos os níveis da sociedade, tendo por finalidade a igualdade de direitos entre mulheres e homens, e a superação dos estereótipos da mulher como um ser inferior e mero objecto de prazer sexual.

8 – Salientar a responsabilidade e o papel que a comunicação social têm em toda a política destinada à prevenção da exploração das mulheres para efeitos de prostituição, em particular no que concerne à difusão de anúncios e outra publicidade sobre actividades relacionadas com a prostituição e o tráfico.

9 – Salientar a necessidade de combater eficazmente o proxenetismo organizado.

10 – Sublinhar a necessidade de travar a indústria e o comércio da pornografia, designadamente quando implicarem menores.

11 – Salientar a necessidade urgente de ratificação da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Transnacional, bem como o respectivo protocolo para prevenir, abolir e reprimir o tráfico de pessoas, em particular mulheres e crianças, já assinados por Portugal e entretanto já ratificado por 45 países.

12 – Recomendar a criação de um Observatório Nacional da Prostituição e Tráfico de Mulheres, com a participação nomedamente de organizações não governamentais que trabalhem nessa área, de associações de mulheres e de associações de imigrantes.


Assembleia da República, em 29 de Janeiro de 2003