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Projecto de Lei nº 3/IX
Reduz para 35 horas por semana o tempo de trabalho

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Exposição de motivos

A progressiva redução do horário de trabalho, sem redução dos salários e de outros direitos legais e contratuais adquiridos, tem constituído, neste século, um objectivo da acção e da luta dos trabalhadores e das suas organizações representativas, que tem encontrado eco em várias decisões de instâncias internacionais, designadamente da própria Organização Internacional de Trabalho.

De facto, os avanços civilizacionais traduzidos no desenvolvimento da base material, técnica e científica da Humanidade devem implicar mais tempos de descanso e melhor qualidade de vida para aqueles que são os principais artífices da produção de riqueza - os trabalhadores. A redução progressiva do tempo de trabalho é, assim, uma inevitabilidade que traduz, no plano das condições laborais, os avanços conseguidos no plano tecnológico. Desde o trabalho de sol a sol até à recente diminuição, em Portugal, da duração semanal do horário de trabalho para as 40 horas é toda a história social que é percorrida. O aumento da produtividade permite libertar quem trabalha do peso excessivo da carga laboral, mas também arrasta a tendência para a diminuição do volume de criação de emprego. Por isso, a redução efectiva do horário de trabalho é uma das vias susceptível de criar mais emprego, contrariando, por este lado, as consequências resultantes da criação de empresas e do incremento de sectores de actividade económica - como os ligados às novas tecnologias de informação - de elevada composição técnica e orgânica do capital.

É neste contexto que, dando corpo aos compromissos assumidos no seu programa eleitoral para a Assembleia da República, o PCP apresenta um projecto de lei que prevê a redução progressiva do tempo de trabalho para as 35 horas, sem redução de direitos, designadamente de salários.

No qual se retoma, no fundamental, uma iniciativa que não chegou a ser apreciada no anterior mandato da Assembleia da República.

O PCP não ignora que só recentemente o País, através da Lei n.º 21/96 de 23 de Julho, reduziu o horário de trabalho das 44 horas para as 40 horas de duração semanal, processo que contou igualmente com o empenho determinante do PCP e do seu projecto de lei n.º 2/VII. E não ignora também que nalguns sectores e regiões do País a aplicação da lei das 40 horas foi alvo de bloqueios impostos por alguns sectores de um patronato retrógrado e conservador que, a todo o custo, quer impedir a consagração de novos direitos dos trabalhadores e que só consegue perspectivar a sua actividade empresarial num quadro de baixos salários e elevados níveis de exploração. Aliás, só a luta dos trabalhadores conseguiu impor, no terreno das empresas e da contratação colectiva, a aplicação efectiva da lei das 40 horas, com expressão até no plano judicial através das primeiras sentenças dos tribunais favoráveis aos trabalhadores na interpretação e aplicação da lei.

Nada impede, pelo contrário tudo aconselha, que se vá caminhando para uma nova redução semanal do tempo de trabalho, acompanhando a evolução que, neste terreno, se tem vindo a verificar noutros países, de que o exemplo recentemente mais debatido é o de França, bem como até nalguns sectores e empresas portuguesas. Os primeiros estudos prospectivos existentes em França, a propósito da diminuição semanal da duração do trabalho para as 35 horas, apontam a importância que o novo regime de duração do trabalho está a ter como instrumento de política económica, de aumento da procura e do consumo e de criação de emprego, apontando-se, a médio prazo, valores da ordem dos 400 000 empregos a criar.

O PCP, ao colocar como seu primeiro objectivo de preocupações no plano da sua intervenção política os trabalhadores e os seus direitos, não ignora também o impacto das medidas que propõe no plano da economia nacional e da economia das empresas, designadamente tendo em conta um tecido e uma estrutura empresarial muito diversificada e ainda pouco adaptada às novas exigências colocadas cada vez mais pela internacionalização dos processos produtivos e pelos novos patamares de competitividade que são colocados. Mas é precisamente por isso que uma nova redução progressiva da duração semanal do tempo de trabalho constitui, em si mesmo, um instrumento de política económica e uma alavanca de estímulo à modernização das próprias empresas no quadro do respeito pelos direitos de quem, em primeiro lugar, faz as empresas - os trabalhadores.

Neste contexto, e tendo em conta toda a complexidade de situações que se colocam, o projecto de lei que agora o Grupo Parlamentar do PCP apresenta propõe que a redução para 35 horas por semana do tempo de trabalho, sem redução de direitos e de salários, se realize progressivamente até ao final de 2004, sendo criado um sistema de apoios às empresas e sectores que, por sua iniciativa, antecipem, pelo menos em um ano, a aplicação do novo horário de trabalho. Propomos ainda que, no respeito pelo prazo máximo de 2004, a implementação progressiva da redução do tempo de trabalho seja organizada no âmbito da negociação colectiva. Igualmente se prevê a possibilidade de serem abertos, ao nível da contratação colectiva, processos negociais visando, em certos sectores de actividade e empresas (por exemplo, no trabalho por turnos), criar um regime de adaptabilidade específico. Propomos, finalmente, o envolvimento e participação dos trabalhadores e seus representantes nos processos de alteração da organização dos tempos de trabalho decorrentes da aplicação da lei.

P contribui, assim, para a abertura de um novo capítulo nas políticas de progresso social e nas políticas, visando uma melhor distribuição dos ganhos de produtividade e dos avanços civilizacionais só conseguidos com o esforço, a mobilização e o empenhamento de quem trabalha.

Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Limite máximo da duração diária e semanal de trabalho

1 - Sem prejuízo de regimes mais favoráveis, o tempo de trabalho não pode ser superior a sete horas por dia e a 35 horas por semana.

2 - O limite máximo referido no número anterior é fixado em seis horas por dia e 30 horas por semana para o trabalho nocturno, por turnos, insalubre, penoso ou perigoso do ponto de vista físico e psíquico.

3 - Os limites referidos nos números anteriores podem ser reduzidos pelos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.

Artigo 2.º
Período transitório

A redução do tempo de trabalho, determinada pelo presente diploma, efectuar-se-á progressivamente até ao final do ano 2004.

Artigo 3.º
Negociação colectiva

1 - No respeito pelo prazo definido no artigo anterior, a implementação progressiva da redução do tempo de trabalho será organizada no âmbito da negociação colectiva.

2 - Para determinados sectores ou empresas, atenta a complexidade ou especificidade da respectiva actividade, poderão as associações patronais e as associações sindicais tomar a iniciativa de abertura de um processo negocial próprio.

Artigo 4.º
Garantia de direitos

Da redução do tempo de trabalho prevista neste diploma não pode resultar para os trabalhadores a redução do nível salarial ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.

Artigo 5.º
Sistema de apoio às empresas

O Governo criará um programa nacional de apoio aos sectores e empresas que implementem, por sua iniciativa, a redução do tempo de trabalho até ao final do ano 2003.

Artigo 6.º
Comunicação

Todas as alterações da organização dos tempos de trabalho implicam informação e consulta prévia aos representantes dos trabalhadores e devem ser programadas com, pelo menos, duas semanas de antecedência.

Artigo 7.º
Norma revogatória

Ficam revogadas as disposições do Decreto-Lei n.º 409/71, de 27de Setembro, e da Lei n.º 21/96, de 23 de Julho, que contrariem o disposto no presente diploma.

Artigo 8.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no trigésimo dia após a publicação.


Assembleia da República, em 10 de Abril de 2000.