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Projecto de Lei nº 403/VII
Altera disposições do Código Penal relativas ao princípio da extraterritorialidade, ao abuso sexual de menores, outros crimes sexuais e à liberdade de imprensa, e adita disposições relativas a ilícitos penais laborais

Situação


O Governo viu rejeitada recentemente a sua proposta de alteração a diversas disposições do Código Penal.

Na sequência de tal rejeição, o Governo veio apresentar outra proposta de Lei, na sequência, aliás de declarações em que foi publicitado o propósito de entregar na mesa da Assembleia da República, ainda na corrente sessão legislativa, uma proposta limitada à criminalização de manifestações populares de protestos que têm como antecedente mais conhecido o bloqueio da ponte 25 de Abril.

O Governo cumpriu o que prometeu. Demonstrando que o núcleo que considera fundamental da sua rejeitada proposta de alterações ao Código Penal é o constituído pelas disposições que criminalizam os cortes de estradas, através dos quais se tem manifestado o direito à indignação.

Parece que o que movia o Governo não era uma maior eficácia no combate à criminalidade na área dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, na área dos crimes laborais, na área da exploração de menores.

A sua preocupação mais evidente era a de conseguir, através do Direito Penal, uma arma repressiva a brandir contra cidadãos em luta por direitos postergados. A sua preocupação foi a de conseguir um "Código Penal da Ponte", para usar uma expressão do próprio Partido Socialista nas acusações formuladas contra o anterior Governo.

A sua preocupação era a de introduzir num Código Penal moldado no princípio da culpa, um direito Penal de Segurança baseado na ideia de perigosidade do cidadão não reverente, não obediente e não servidor do Poder.

O Código Penal em vigor permite a execução de uma política criminal que garanta a segurança dos cidadãos.

No entanto, apesar disso, e apesar da estabilidade que se exige ao Direito Penal mais do que a qualquer outro ramo de direito, o Código Penal pode ser melhorado, acolhendo, nomeadamente os resultados do debate das últimas alterações nele introduzidas.

Assim, o Grupo Parlamentar do P. C. P, vem apresentar um Projecto de alterações a algumas disposições do Código.

Propõe-se a alteração do artigo 5º do Código por forma a alargar-se o princípio da extraterritorialidade, com o que se torna possível uma maior eficácia no combate a algumas formas de criminalidade grave como a pedofilia. Excluindo, no entanto, desse alargamento, comportamentos que o Governo nela englobava. Referimo-nos aos casos de interrupção voluntária da gravidez feitos por mulheres portuguesas em países onde tal conduta não é penalizada, que, pelo Código Penal não podem ser julgadas em Portugal, mas que passariam a estar sujeitas às penas da lei portuguesa, na proposta do Governo.

Propomos alterações na área dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, nomeadamente naqueles crimes em que as principais vítimas são as mulheres, as crianças e os jovens. Algumas das propostas surgem na sequência daquelas que apresentámos aquando das alterações ao Código Penal aprovadas na anterior legislatura.

Retomamos propostas também anteriormente apresentadas, garantindo a liberdade de imprensa.

Acolhemos propostas da Proposta Governamental, relativamente aos crimes de discriminação.

Na sequência de propostas anteriores do P. C. P. propomos a criminalização de condutas contra os direitos dos trabalhadores, e melhoramos a tipificação do crime de exploração do trabalho infantil.

Nestes termos, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projecto de Lei

Altera disposições do Código Penal relativas ao princípio da extraterritorialidade, ao abuso sexual de menores, outros crimes sexuais e à liberdade de imprensa, e adita disposições relativas a ilícitos penais laborais

Artigo 1º

Os artigos 5º, 170º, 172º, 177º, 178º, 179º, 180º, 181º e 240º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei nº 400/82 de 23 de Setembro e alterado pelo Decreto-Lei nº 48/95 de 15 de Março, passam a ter a seguinte redacção;

Artigo 5º

(Factos praticados fora do território português)

1 - ...............

a)

b)

c).................

d) quando constituírem crimes contra as pessoas, praticados por portugueses que viverem habitualmente em Portugal ao tempo da sua prática e aqui forem encontrados, se forem também puníveis pela legislação do lugar em que tiverem sido praticados

e) Por estrangeiros que forem encontrados em Portugal e cuja extradição haja sido requerida, quando constituírem crimes que admitam a extradição e esta não possa ser concedida .

2 - .................

Artigo170º

(Lenocínio)

1. Quem fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição ou a prática de actos sexuais de relevo, explorando situações de abandono ou de necessidade económica, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.

2. Se o agente usar de violência, ameaça grave, ardil ou manobra fraudulenta, actuar profissionalmente ou com intenção lucrativa, ou se aproveitar de incapacidade psíquica da vítima, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos

Artigo 172º

(Abuso sexual de crianças)

1 - ..........

2 - ...........

3. - Quem praticar acto sexual de relevo perante menor de 14 anos, com este directamente relacionado, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos

4 - Quem utilizar menor de 14 anos em fotografia, filme ou gravação pornográfica, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos

5 - Quem praticar os actos descritos no número anterior com intenção lucrativa, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

6 - Quem exibir ou ceder a qualquer título fotografia, filme ou gravação pornográfica em que tenha sido utilizado menor de 14 anos, é punido com pena de prisão até 3 anos.

7. - Quem praticar os actos descritos no número anterior com intenção lucrativa é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.

  1. Quem:

a) Praticar acto de carácter exibicionista perante menor de 14 anos; ou

b ) Actuar sobre menor de 14 anos, por meio de conversa obscena ou de escrito, espectáculo ou objecto pornográfico

é punido com pena de prisão até 3 anos.

Artigo 177º

(Agravação)

1 - .................

2 - .................

3. - As penas previstas nos artigos 163º a 168º e 172º a 175º são agravadas de metade, nos seus limites mínimo e máximo, de dos comportamentos aí descritos resultar gravidez, ofensa à integridade física grave, transmissão do vírus de imunodeficiência adquirida ou de formas de hepatite que criem perigo para a vida, suicídio ou morte da vítima.

Artigo 178º

(Queixa)

1 - .......................

2. - O disposto no número anterior não se aplica quando a vítima for menor de 12 anos, quando o facto for consumado por meio de outro crime que não dependa de acusação ou queixa, quando o agente for qualquer das pessoas com legitimidade para requerer procedimento criminal ou ainda quando do crime resulte transmissão do vírus da síndroma de imunodeficiência adquirida, qualquer forma de hepatite que crie perigo para a vida, ofensa à integridade física grave, suicídio ou morte da vítima.

3 - Quando a vítima for menor de 12 anos, o Ministério Público pode não dar início ao processo se especiais razões de interesse do menor o impuserem.

Artigo 179º

(Inibição do Poder Paternal)

Quem for condenado por crime previsto nos artigos 163º a 176º pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício do Poder Paternal, da Tutela ou da Curatela, por um período de 2 a 10 anos

Artigo 180º

(Difamação)

1 - ....................

2 - ...................

3 -...................

4 - .....................

5 - Eliminado

Artigo 181º

(Injúria)

1 -....................

2. - Tratando-se da imputação de factos é correspondentemente aplicável o disposto nos nºs 2, 3 e 4 do artigo anterior.

Artigo 240º

(Discriminação racial ou religiosa)

1. Quem

a) Fundar ou constituir organização ou desenvolver actividades de propaganda organizada que incitem à discriminação, ao ódio ou à violência raciais ou religiosos, ou que a encorajem; ou

b) ................

  1. - Quem, em reunião pública, por escrito destinado a divulgação ou através de qualquer meio de comunicação social:

a) Provocar actos de violência contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional ou religião; ou

b ) Difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional ou religião, nomeadamente através da negação de crimes de guerra ou contra a paz e a humanidade;

com intenção de incitar à discriminação racial ou religiosa ou de a encorajar, é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos

Artigo 2º

(ilícitos penais laborais)

São aditados ao Código Penal os artigos 2Olº-A, 2O2º-B e 202º-C, os quais passam a fazer parte do Capítulo IX do Título I (Dos crimes contra as pessoas) do Livro lI do Código, com a seguinte redacção:

Artigo 201º-A

(Infracções de regras de segurança, higiene e saúde no trabalho)

1. - Quem, por incumprimento das normas de segurança, higiene e saúde no trabalho, criar por essa forma perigo para a vida ou para a integridade física ou psíquica dos trabalhadores protegidos por aquelas normas, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

2 - Se o perigo referido no número anterior for criado por negligência, o agente é punido com pena de prisão até 5 anos.

3 - Se a conduta referida no nº 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de muita.

Artigo 201º-B

(Exploração do trabalho infantil)

Quem por qualquer forma de relação contratual, e em seu proveito, utilizar o trabalho de menor em infracção às normas que proíbem o trabalho infantil, é punido com pena de prisão até 3 anos, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal.

Artigo 201º-C

(Burla relativa a trabalho ou emprego)

1 - Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, causar a outra pessoa prejuízo patrimonial, através de aliciamento ou promessa de trabalho ou emprego no estrangeiro, é punido com pena de prisão até 5 anos.

2.- Com a mesma pena é punido quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, causar a pessoa residente no estrangeiro prejuízo patrimonial, através de aliciamento ou promessa de trabalho ou emprego em Portugal.

3. - A pena é a de prisão de 2 a 8 anos se:

a) O prejuízo patrimonial for de valor consideravelmente;

b) O agente fizer da burla modo de vida; ou

c) A pessoa prejudicada ficar em difícil situação económica

4 - A pena é especialmente atenuada quando, até ao início da audiência de julgamento em 1ª instância, tiver lugar a reparação integral do prejuízo causado, podendo ser especialmente atenuada quando a reparação for parcial.

Assembleia da República, 30 de Julho de 1997

Os Deputados