Intervenção de Carlos Carvalhas,
Secretário-geral do PCP
no comício de encerramento da 26ª Festa do Avante!
Atalaia, 8 de Setembro de 2002

Com as nossas convicções, com os nossos valores, com o nosso património de luta aqui estamos na Atalaia, nesta bela Festa do Avante!, nestes três dias de festa que a juventude fez sua.

Alguns interrogam-se porque razão houve este ano maior participação de construtores e maior presença da juventude.

Para aqueles que tomam os seus desejos pela realidade, que tomam as suas caricaturas por verdade têm muita dificuldade em encontrar resposta cabal.

Mas para os que conhecem este Partido, para os que conhecem a força das convicções, a justeza da sua luta, a importância desta força de resistência, de proposta e de combate não têm grande dificuldade em compreender – num quadro de ofensiva anti-PCP – a resposta de milhares de camaradas marcando presença empenhada e determinada na sua construção e nas tarefas destes três dias.

Quem quiser compreender a emoção, a alegria, o empenhamento, o humanismo deste tocante acontecimento, quem se despir dos preconceitos, dos clichés, das verdades feitas e quiser entender a generosidade, os compromissos de vida e de luta, a entrega que une todos aqueles que fazem esta Festa magnífica terá, honestamente, de concluir que a Festa do Avante! é, simultaneamente, um impressivo desmentido de velhas e prolongadas falsificações e calúnias sobre o PCP e um símbolo incontornável do que verdadeiramente são, querem e defendem os comunistas portugueses e o seu Partido.

Queremos daqui, da Festa do Avante!, saudar os militantes e simpatizantes do PCP, o seu humanismo e dedicação ao seu Partido e dizer aos portugueses e às portuguesas, aos trabalhadores e às trabalhadoras que estão justamente preocupados, insatisfeitos e indignados com a política deste Governo, que este Partido tudo fará para derrotar esta ofensiva, que tudo fará para que o país venha a ter uma nova política, uma alternativa de esquerda, que respeite quem trabalha, responda aos problemas do povo e do país, que aprofunde a democracia nas suas diversas vertentes, que defenda a soberania e a independência nacional.

A agudização dos problemas

Para os que se iludiram ou quiseram iludir não foi preciso muito tempo para ficar claro ao serviço de quem está este Governo e quais os interesses que serve, no essencial.

Não foi preciso muito tempo para que o Governo mostrasse o que o PSD e o PP, andaram a esconder na campanha eleitoral. Com os votos no bolso e sentados no governo meteram na gaveta as promessas, carregaram nas tintas negras da crise para criar o ambiente psicológico ao “aperto do cinto”, aumentaram impostos e serviços públicos, esqueceram os aumentos das pensões e reformas (Portas nunca mais falou nos “velhinhos”), acabaram com o crédito bonificado à compra de casa própria, concederam novas benesses aos interesses privados em prejuízo do interesse público, ignoraram o encerramento e as deslocalizações de empresas e os salários em atraso, anunciaram novos passos no sentido da privatização de importantes empresas e desencadearam uma grande ofensiva de retrocesso na segurança social, na saúde, no ensino, na legislação do trabalho, na Administração Pública e na Televisão pública.

E tudo isto acompanhado de uma alta significativa dos preços em bens e serviços essenciais, que também foram inflacionados a pretexto da introdução do Euro e pelo clima político criado pelas declarações do Governo.

Uma tal política desencadeou uma grande desestabilização social, o protesto e uma grande indignação.

E é também uma evidência que, a continuação no essencial da política económica que vinha a ser prosseguida pelo anterior governo e a acentuação da política neoliberal designadamente na saúde, no ensino e na segurança social vai agravar os problemas do país e agravar a situação social.

A submissão e o cego cumprimento do Pacto de Estabilidade com o corte drástico de despesas reprodutivas e do investimento produtivo, em vez de contrariar alimenta os factores recessivos que se verificam na economia portuguesa, com o consequente aumento do desemprego.

Não se afirma que não se tem de ter em conta o défice orçamental. Mas ninguém demonstra ou sustenta em bases científicas que o défice deve ficar, independentemente da conjuntura económica e das necessidades do país, em 2%, 3% ou 4% do PIB. Do mesmo modo se pode afirmar que é tecnicamente indefensável e politicamente errado fazer do chamado défice zero o alfa e o omega da política orçamental e financeira. A Alemanha, a França, a Itália e outros países vão fazer a leitura que lhes interessa em relação ao cumprimento do Pacto de Estabilidade. Mas o governo português entende que deve ser campeão da ortodoxia monetária, que deve ter uma posição seguidista e de submissão até porque a dramatização do défice lhe serve para justificar a contra-reforma legislativa e a política de “aperto do cinto” aos mesmos de sempre designadamente, aos trabalhadores da Administração Pública e aos trabalhadores por conta de outrem, deixando praticamente intocáveis interesses, privilégios e lucros do capital financeiro.

Como é sabido e ao contrário de promessas eleitorais o Governo aumentou o IVA em dois pontos percentuais, que é um imposto socialmente injusto e que, aliás, não está a ter grandes resultados em termos de receita, mas ao mesmo tempo mantém os benefícios fiscais ao capital financeiro e os privilégios fiscais às seguradoras e aos bancos.

Uma banca que tem tido das mais altas taxas de rentabilidade da União Europeia e que, segundo uma revista do meio, tem vivido “anos de ouro”, “com uma fórmula muito eficaz” que inclui – diz a Revista – “as relações promíscuas com o governo e governantes”. Tem sido a política do compadrio com os grandes interesses expressa com toda a clareza.

E quando se fala em sacrifícios e se procede a despedimentos é também particularmente chocante que o governo tenha eliminado de vez a tributação dos ganhos bolsistas. Quem trabalha paga de IRS, conforme os casos, 15%, 20% ou 30%, mas quem ganhar milhares de contos na bolsa não paga nada.

É assim a justiça fiscal do governo PSD/PP. É a política do funil.

O PCP considera esta situação inaceitável e vai bater-se pela sua reversão. E isto passa-se num país em que, segundo dados recentemente divulgados, as dívidas fiscais acumuladas e a evasão fiscal ultrapassam os três mil milhões de contos!

O Primeiro-Ministro disse na Póvoa de Varzim que vai combater a grande evasão fiscal. Cavaco e Guterres em vários discursos da chamada reentré e praticamente em todos os debates orçamentais fizeram a mesma jura. É uma promessa recorrente.

Para combater a grande evasão fiscal é necessário enfrentar o capital financeiro, o off shore da Madeira e Alberto João Jardim, os grandes especuladores e os grandes interesses e estes, é sabido, estão bem representados no Executivo. Aliás, o que já se viu em matéria fiscal com os clubes de futebol bem como com os casos da Polícia Judiciária, cuja Directora-adjunta apontou como razões para a sua demissão a «perda progressiva de apoio no combate ao crime económico e à corrupção», não concede grande crédito ao Governo. Recorde-se que só depois do escândalo ter estalado com as demissões é que o Governo veio dizer que vai dar poderes excepcionais à Polícia Judiciária! O “mexilhão que se ponha a pau...” porque os grandes vão continuar a sorrir, tal como acontece com a política fiscal.

Em resposta ao crescente descontentamento e protesto, em relação à política seguida e às alterações da legislação do trabalho, primeiro Paulo Portas em Aveiro (talvez inspirado na biografia de Mussolini que levou para férias) e depois o Primeiro-Ministro na Póvoa de Varzim, afirmaram que o país precisa de trabalho e não de greves.

Nós, daqui, da Festa do Avante!, dizemos ao Primeiro-Ministro que de facto o País precisa de trabalho, mas de trabalho com direitos, justamente remunerado e não de mais desregulamentação, de novas praças de jorna ou de novo trabalho escravo!

De facto, o País precisa de trabalho e “trabalho geral”. Mas não de salários em atraso, ou do regabofe das deslocalizações e do encerramento de empresas numa esquina, para abrirem com outro nome na esquina seguinte deixando trabalhadores no desemprego, sem salários e sem direitos.

De facto, o País precisa de trabalho e de “trabalho geral” e de compensar o mérito, mas não com uns a ganharem num dia o que outros não ganham num ano. Lembram-se daquele ministro do PSD que dizia que o seu vencimento de ministro não dava para os pequenos almoços? Para o PCP a democracia, os direitos do homem e a justiça social não podem ficar à porta da empresa. Não há trabalho geral, com baixos salários, com desemprego nem com mais precariedade e liquidação de direitos. Nem há combate à pobreza com pensões de miséria, vergonhosas prestações a deficientes e com uma política de concentração da riqueza!

As dificuldades orçamentais devem combater-se cortando a sério nas despesas supérfluas, acabando com a política de substituição dos boys rosa pelos boys laranja, com a diminuição dos benefícios fiscais às actividades financeiras e especulativas. Combate-se aumentando também as receitas designadamente, através da tributação das grandes fortunas, da tributação efectiva do capital financeiro e de um sério combate à fuga e à evasão fiscais e não apertando violentamente o cinto a quem trabalha.

O PCP não se tem limitado a denunciar e a protestar em relação a esta injusta política. O PCP tem apresentado diversas medidas e projectos-lei na Assembleia da República, defendendo a reposição da tributação dos ganhos em bolsa; a aceleração da cobrança das dívidas à segurança social e das dívidas fiscais; a compensação dos trabalhadores da Administração Pública pela diminuição dos seus vencimentos reais e a protecção dos direitos dos trabalhadores ameaçados pela extinção dos organismos públicos; o combate à deslocalização das empresas e às engenharias e fraudes contabilísticas para efeitos bolsistas; o combate ao branqueamento de capitais e ao tráfico de droga, a defesa do aparelho produtivo nacional. O PCP não dará tréguas à política de direita do Governo, quer no campo das medidas alternativas, quer no campo da denúncia, da resistência e do combate.

Também consideramos inaceitável que o Governo tenha acabado com o crédito bonificado para a compra de casa própria pelos jovens e pessoas de menores rendimentos a pretexto das fraudes, penalizando muitos jovens que estavam a perspectivar o seu futuro.

A JCP, que vai realizar o 7º Congresso com o lema “Transformar é possível” e que daqui saudamos, lançou de imediato uma iniciativa de recolha de assinaturas, que em poucas semanas angariou largos milhares, dando uma importante contribuição para a mobilização da juventude. E tem continuado a levantar esta bandeira, que agora também é reivindicação de outras juventudes partidárias.

O PCP entende que é possível combater as fraudes e tornar a concessão de crédito rigorosa e justa.

A solução não pode ser a de criar ainda mais dificuldades a quem, não vislumbrando casas para arrendar a preços acessíveis, é empurrado para a compra de casa própria.

Por isso, o PCP vai apresentar na Assembleia da República uma proposta para que se reponha o crédito bonificado à compra de casa própria para quem de facto necessita. E creio que vós estais de acordo com esta nossa decisão.

Regressão na democracia social

A grande ofensiva de direita não se limita ao clássico “aperto do cinto” aos trabalhadores perante dificuldades económicas conjunturais. O que está em marcha é a desregulamentação quase sem limites do mercado do trabalho; a concepção do desemprego como uma realidade estrutural e inelutável, o ataque e a fragilização dos sindicatos, a eliminação de direitos laborais essenciais em conjugação com uma redução dos sistemas públicos de saúde, do ensino e da segurança social e esta, com a sua descaracterização e privatização, indo ao encontro das reivindicações e interesses das seguradoras privadas.

Acenando com uma ou outra medida e sobretudo com um aumento de pensões cuja progressão para os níveis do salário mínimo já estava inscrita na Lei de Bases, o Governo pretende suster o protesto contra a eliminação do sistema público universal e solidário para facilitar a intervenção e o lucro dos privados.

E, por isso, a questão fundamental para estes é o plafonamento, os tectos contributivos e os milhões dos descontos dos trabalhadores para alimentarem os Fundos de Pensões a serem lançados na especulação bolsista. Os recentes casos de falências e escândalos que atingiram grandes empresas nos países que utilizaram tal esquema, levaram à ruína de milhares de reformados que ficaram de um dia para o outro sem qualquer protecção... Reformas certas só são garantidas pelo sistema público da segurança social.

A primeira ameaça é para as jovens gerações, mas o que está em causa é uma lei estruturante da nossa democracia social e económica no sentido do retrocesso.

O sistema público da segurança social é um direito fundamental conquistado no 25 de Abril, que necessita de ser defendido e consolidado e não destruído.

Também na esteira de velhas reivindicações e indo de imediato ao encontro da chantagem de algumas multinacionais, como se o País fosse uma república das bananas, o Governo quer avançar com uma retrógrada e brutal ofensiva contra o edifício jurídico laboral, juntando-lhe alguns rebuçados para disfarçar o essencial.

É preciso que os trabalhadores saibam que o Governo quer franquear a porta aos despedimentos sem justa causa, alargar e eternizar a precaridade e o período experimental, permitir a gestão e organização discricionária do tempo de trabalho, impor a «deslocalização» forçada de trabalhadores, tanto no plano funcional como geográfico, liquidar de forma efectiva o direito de negociação e dos contratos colectivos, restringir o direito à greve e à luta reivindicativa entre negociação das convenções colectivas.

Tudo isto embrulhado com a necessidade de aumentar a produtividade escondendo, como aliás revelam vários estudos da União Europeia, que esta aumenta sim com a estabilidade de emprego, com empregos de qualidade, com a observância de direitos fundamentais dos trabalhadores e não com a desregulação, não com o trabalho precário, não com o trabalho sem direitos e com os baixos salários. Estes são factores que não estimulam o aumento da produtividade e que aumentam também a sinistralidade no trabalho.

E nós devíamos ter razões acrescidas de preocupação nesta matéria.

Portugal é o país com a taxa de acidentes de trabalho mais elevadas da União Europeia e com as mais baixas indemnizações.

Reafirmamos:

O PCP não aceita que o nosso país se transforme paulatinamente numa região periférica na União Europeia, lugar de sol, de mão de obra barata, de imigração clandestina. Este é o modelo de fracasso e de retrocesso.

O PCP não aceita que este governo vá ao baú das velharias do consulado cavaquista e reapresente uma retocada proposta de lei dos disponíveis, titulada lei dos supranumerários, pondo em causa não só os trabalhadores com vínculo precário mas também milhares de professores e trabalhadores da Função Pública.

Mal vai o país quando mais de 36 mil professores não são colocados no ensino secundário, ficando no desemprego. Mal vai o país quando educadoras de infância são subalternizadas e se procura à sua custa resolver carências transformando o pré-escolar de fase inicial do sistema educativo numa forma de guarda de crianças.

Mal vai o país com novos cortes orçamentais no ensino superior, que põem em causa a cobertura das despesas correntes essenciais e dão consistência aos receios de maior precarização de funções docentes, de perda de qualidade do ensino e de investigação, da crescente desvalorização da escola pública.

Mal vai o país quando as insuficiências e os problemas do Serviço Nacional de Saúde, que na maior parte dos casos mais não são do que o resultado da política de saúde dos governos do PSD e do PS, designadamente nos últimos consulados, sejam agora invocados como justificação para a privatização da gestão dos hospitais e das áreas potencialmente mais lucrativas da prestação de cuidados de saúde, dando aos grupos económicos privados mais dinheiro por conta e risco do erário público.

A gestão do Hospital Amadora/Sintra e a situação de falência em que se encontram várias unidades de saúde privadas falam por si.

O PCP também não aceita o caminho do retrocesso não só no campo dos salários e das pensões e reformas, mas também na matriz política e ideológica expressa, por exemplo, na Lei de Bases da Família ou no campo de importantes valores e direitos conquistados pelas mulheres com o 25 de Abril e consagrados na Constituição da República.

Na verdade, este Governo tem em curso uma das mais graves ofensivas, no plano político e ideológico, aos direitos das mulheres, aos direitos sexuais e reprodutivos, ao conceito de família e aos vários instrumentos existentes no domínio da igualdade de direitos e de oportunidades cujo prosseguimento criará um profundo retrocesso nos valores e nos direitos das mulheres e novos obstáculos ao efectivo exercício dos direitos e à concretização da participação em igualdade.

Refugiando-se na suposta defesa da família e da mãe trabalhadora, o que está de facto em causa é o prosseguimento de um caminho que visa tornar a mão de obra feminina ainda mais maleável e ajustável às necessidades do mercado e a total transferência para as mulheres e para as famílias dos custos sociais que ao Estado e às empresas deveria competir no que se refere à maternidade, ao apoio à infância, bem como aos idosos. É a defesa da família patriarcal com a mulher em casa (ou trabalhando a tempo parcial) a tomar conta dos filhos, dos idosos, dos doentes e assegurando o trabalho doméstico.

Este Governo retoma velhas e «rançosas» teses reaccionárias que, visam fomentar o regresso das trabalhadoras a casa a pretexto muitas vezes das enormes dificuldades que a grande maioria das mulheres sentem em compatibilizar a vida profissional com as exigências de apoio à família e aos filhos, alimentando a sua exclusiva responsabilidade pelo insucesso escolar dos filhos, por deixar sós e sem cuidados os idosos – para assim garantir uma maior desinvestimento do Estado na criação de uma rede pública de apoio à infância e aos idosos e reduzir as obrigações nas empresas quanto ao cumprimento de direitos, os direitos das trabalhadoras-mães.

Na ordem do dia está, pois, o reforço da luta organizada das mulheres em defesa dos seus direitos travando um caminho de retrocesso nos valores, nos direitos conquistados e nas garantias de uma participação em igualdade em todas as esferas da vida colectiva.

Certamente que estais de acordo que o PCP intervenha empenhadamente, visando não só a mobilização e luta das mulheres e das organizações de defesa dos seus direitos específicos contra os aspectos mais graves destas políticas nos seus vários domínios, como não abdique de promover as iniciativas legislativas que visem o reforço dos direitos da maternidade-paternidade e o combate ao aborto clandestino em Portugal.


Descaracterização do regime democrático


Este Governo tem, também, vindo a avançar paulatinamente na colocação do seu pessoal político e clientelar no aparelho de Estado e nas empresas com capitais públicos mas, aprendendo com os «erros de imagem» do PS, tem-o feito pela “surra” e à socapa, e sempre com pretextos ditos «de natureza técnica», de eficácia, competência, reestruturação, articulação, reforço de meios e redução de gastos.

Está hoje em marcha, procurando não dar nas vistas, um verdadeiro assalto ao aparelho de Estado pelos boys e girls do PSD e do CDS-PP e está em concretização um plano de concentração de poderes e de controlo autoritário dos diversos aparelhos e serviços pelo Governo, numa perspectiva estritamente partidarizada.

Ao mesmo tempo, com recurso a expedientes ditos «de gestão», são afastados não só os boys do PS mas também muitos profissionais competentes e sérios, cujo «crime» é não serem servis face ao poder e aos seus comportamentos autoritários.

Este assalto é particularmente grave em áreas sensíveis dos aparelhos de informações, de segurança e de polícia, onde os sectores mais conservadores estão empenhados em dominar os meios de contra informação e repressão, que não hesitarão em instrumentalizar partidariamente, como fizeram no «cavaquismo», contra a resistência legítima dos trabalhadores e do povo.

Neste quadro, as alterações no topo da Polícia Judiciária têm de ser seguidas com toda a atenção e com preocupação, porque mexem profundamente no instrumento operativo da Justiça na luta contra a criminalidade organizada, violenta e altamente sofisticada, contra o crime económico, a corrupção e os criminosos de «colarinho branco». Por isso exigimos que sejam cabalmente explicadas as razões das demissões e nomeações recém acontecidas.

É que não se pode esquecer que os programas eleitorais dos partidos de direita propunham a governamentalização da investigação criminal e a sua sujeição ao «princípio da oportunidade», controlada pela Ministério da Justiça. Nem se podem esquecer as dificuldades que o combate à corrupção atravessou no Governo de Cavaco.

É fundamental para a credibilidade do Estado democrático de direito, e para o PCP é uma exigência elementar, que não fiquem por concretizar, com celeridade e eficácia, todas as investigações das grandes fraudes fiscais, envolvendo os grandes interesses e os respectivos mandantes, e que sejam concluídas as investigações e acertadas as contas da Justiça com o incontornável caso da «Universidade Moderna», em que, como já foi observado, o Director de ontem do jornal “Independente” já tinha pedido, sem apelo nem agravo, a demissão do Ministro da Defesa de hoje aduzindo ainda que qualquer cidadão com uma réstia de respeito, mesmo formal, pela democracia tomaria a decisão de se demitir até que toda a verdade fosse apurada! Como dizia o “seu amigo” Marcelo Rebelo de Sousa «há fantasmas que têm razão de ser...» .

Mas os perigos de descaracterização e empobrecimento do regime democrático não se situam somente na segurança social, nas leis laborais, na governamentalização de áreas sensíveis dos aparelhos de informações, segurança e repressão, mas também em mais uma revisão constitucional que está na forja, bem assim como nas ambições de alterar as leis eleitorais, de organização e financiamento dos partidos...

A ofensiva do Governo nestas diversas áreas é de grande envergadura e não pode ser subestimada. Vai ao encontro de interesses poderosos, conta com uma maioria na Assembleia da República e será apresentada com grande demagogia e com todo o marketing político...

Mas também não podemos subestimar as possibilidades de lhe fazer frente, com a luta deste Partido insubmisso, com a luta dos trabalhadores, dos sindicatos e da CGTP-IN, a grande central sindical que daqui saudamos.

A convergência e a unidade

A par da afirmação da sua própria iniciativa e propostas, o PCP dará passos e está disponível para, em conjunto com todas as forças democráticas, encontrar formas comuns ou convergentes de acção no plano político e institucional que derrotem esta ofensiva e designadamente o sério retrocesso histórico nos direitos do trabalho, alicerçando as condições para uma política de esquerda ao serviço do povo e do país.

Mas é necessário que se diga algo mais pois no último mês, nem sempre com alguma memória e quase sempre com alguma amnésia, nem sempre para esclarecer e algumas vezes para confundir, muitos têm falado nas relações entre partidos de oposição, das questões relativas ao seu entendimento ou convergência, seja com efeitos imediatos seja na perspectiva de uma futura alternativa.

Porque, pelos vistos, a memória de alguns é especialmente curta, daqui queremos relembrar algumas coisas essenciais a este respeito.

A primeira é, desde logo, que o PCP não precisou de esperar pelo estival mês de Agosto para descobrir a importância destas questões.

Na verdade, logo na noite das eleições de 17 Março, enquanto outros partidos se ocupavam sobretudo ou a valorizar o seu resultado ou a maquilhá-lo, o PCP foi o único partido oponente da direita que sublinhou perante o país as suas graves preocupações com a vitória da direita e com as suas consequências e logo deu um claro sinal de que viriam aí tempos difíceis que exigiriam uma forte cooperação dos partidos da oposição.

Depois, na reunião do Comité Central em 20 de Março, o PCP afirmou com toda a clareza que a situação criada pelos resultados eleitorais impunha a necessidade de se vir a construir uma forte convergência das forças democráticas que, sem prejuízo da sua autonomia e diferenciação, permitisse fazer frente aos perigos que se perfilavam. E a Conferência Nacional do PCP, realizada em 22 de Junho, consagrou que, para fazer face aos sérios desafios e graves ameaças criados pelo regresso da direita ao Governo, é necessário e indispensável que se desenvolvam nos mais diversos planos os processos de diálogo, cooperação, acção comum ou convergência entre forças e sectores democráticos, seja para resistir à ofensiva da política governamental seja para afirmar, sempre que possível, políticas alternativas comuns.

Ao longo destes meses, pela nossa parte, temos agido de acordo com esta orientação e daqui para a frente assim continuaremos a agir, fortemente empenhados em que se juntem forças, energias, influências sociais e políticas para barrar o caminho aos desastrosos retrocessos que o Governo de direita quer impor ao país.

Mas seria animar um caminho de ilusões, enganos e graves abdicações se, como alguns fazem, ignorássemos os problemas e dificuldades que pesam sobre este processo e que derivam em grande medida de reais e por vezes substanciais divergências de orientação política entre as forças democráticas, a maior parte das quais esteve particularmente patente nos últimos seis anos de governação do PS.

Nós não propomos nem queremos que, agora, com a direita no governo a ameaçar tantas conquistas e direitos, o PCP e o PS passem o tempo a “lamber as feridas” deixadas pelas negativas opções e orientações que, em questões fundamentais, o PS assumiu quando tinha o governo do país e a metade dos deputados e a que o PCP justamente se opôs.

Mas também não propomos nem acreditamos que tenha alguma utilidade ou vantagem o voluntarismo de pôr simplesmente uma pedra sobre o passado recente e de imaginar que todas as dificuldades se resolvem com umas palavras doces, uns acenos de simpatia ou uns interlocutores mais “jeitosos”.

Exactamente porque boa parte dos problemas e dificuldades que podem pesar e condicionar a amplitude da convergência de hoje e de amanhã entre as forças da oposição resultariam da conservação, designadamente pelo PS, de orientações em algumas matérias que nem com a melhor das boas vontades podem ser consideradas de oposição ao governo do PSD e do CDS-PP.

E é por isso que, ao mesmo tempo que aqui na nossa Festa do Avante! confirmamos perante todos os democratas e perante o país o nosso sólido compromisso de, na máxima medida possível, favorecer a cooperação e a convergência em todos os planos com as outras forças à esquerda, aqui queremos deixar-lhes alguns apelos.

O apelo às outras forças de oposição, e designadamente ao PS, para que, independentemente do que tenha defendido recentemente no governo, compreenda que a introdução dos “tectos contributivos” na Segurança Social é um deliberado caminho de descapitalização do sistema público e um autêntico “cavalo de Tróia” destinado a criar aqueles “factos consumados” na base dos quais a direita e o grande capital exigiria depois outros “factos consumados”.

O apelo às outras forças e designadamente ao PS, para que, independentemente de ideias e projectos que tenha tido recentemente no governo, compreenda que contemporizações com agravamentos da precaridade dos vínculos laborais e do reforço dos arbítrios patronais são o contrário do que é mais necessário e urgente em relação ao mundo do trabalho.

O apelo às outras forças e designadamente ao PS, para que, independentemente do que tenha posto em marcha no seu governo, compreenda que, entre outras linhas de privatização, a entrega da construção e gestão de hospitais públicos a grupos privados será um passo gravíssimo de ataque ao Serviço Nacional de Saúde carregado de consequências negativas para os cidadãos.

O apelo às outras forças e designadamente ao Bloco de Esquerda, para que reflicta no alcance dos seus entusiasmos e o seu anunciado empenho na abertura de novo processo de revisão da Constituição e que compreenda que as revisões constitucionais até podem iniciar-se com magnificas intenções de alguns, mas que sempre tem acabado com péssimos resultados.

O apelo às outras forças e designadamente ao PS, para que compreenda que se continuasse a chamar a si o papel de grande campeão das alterações ao sistema eleitoral para a Assembleia da República isso criaria um enorme e sério conflito entre as diversas forças da oposição e traduziria uma tão grave aproximação entre o PS e o PSD em matéria gravemente lesiva da democracia que, só por si, reduziriam a pó todas as boas palavras de abertura à sua esquerda que o PS entretanto tivesse proclamado.

Como muitas vezes dissemos, mas é necessário repetir a pensar nos que nunca ouvem o que não lhes convém, o PCP não intervém na vida e na luta política e no debate de ideias com o culto das fórmulas, das etiquetas e dos rótulos. Antes coloca no centro do seu posicionamento, da sua acção e da sua intervenção as causas em que acredita e porque se bate e as convicções profundas que o animam, que configuram a sua distinta identidade política e que sustentam a generosa acção dos seus militantes e simpatizantes.

E até podemos acrescentar que o debate político em Portugal só teria a ganhar em seriedade e em eficácia se muitos, em vez de se ocuparem a esgrimir contra os fantasmas que agitam sobre o PCP, a atacar uma suposta política e supostas propostas do PCP que só são filhas das suas deturpações, se ocupassem a argumentar e a discordar fundamentadamente da política realmente defendida pelo PCP e das propostas e orientações realmente por si sustentadas..

É contra esta torrente de desfigurações, caricaturas e deturpações que, aqui na nossa Festa, queremos dizer para reflexão de todos os portugueses que não desistem de pensar pela sua própria cabeça que sim, é verdade que o PCP se bate pela revalorização do trabalho e dos trabalhadores, que vê os seus direitos não apenas como uma exigência de justiça social mas como uma condição e alavanca para o progresso do país e que o PCP tem muita honra em pensar assim e que não tenciona render-se aos interesses do grande capital, que sim, é verdade que o PCP se bate para que o interesse público e o interesse nacional prevaleçam na organização económica e que, a par da existência de sectores e empresas privadas, é essencial um forte e modernizado sector público e serviços públicos e que o PCP tem muita honra em pensar assim e que não tenciona render-se a uma prolongada política de privatizações que continuamos a considerar um escandaloso assalto e roubo dos dinheiros e ao património público.

Sim, é verdade que o PCP se bate pelo reforço, ampliação e aprofundamento dos direitos sociais do povo português (na saúde, na educação, na segurança social, no trabalho, no acesso à justiça), que os vê como componentes inalienáveis de uma democracia à altura das necessidades e exigências do nosso tempo e que tem muita honra em pensar assim e que não tenciona ajoelhar perante uma prolongada ofensiva para amputar, limitar ou liquidar esses direitos.

Sim, é verdade que o PCP se bate por políticas de justiça, humanismo e progresso social que permitam enfrentar as raízes de dilacerantes problemas de desintegração social, de violência e insegurança na vida colectiva, de desprotecção dos imigrantes, de grave dimensão da toxicodependência e das suas sequelas e que tem muita honra em pensar assim e que, defendendo as medidas necessárias ao combate ao crime e à protecção dos cidadãos, não tenciona ceder à demagogia populista e à exploração fácil das emoções.

Sim, é verdade que lutamos por um novo rumo para a integração europeia tanto em nome dos interesses do progresso e do desenvolvimento nacionais como em nome de uma Europa mais solidária e menos desigual assente na cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos e que temos muita honra em pensar assim e não tencionamos rendermo-nos nem à deriva federalista que, além do mais, só promete agravar o fosso entre os cidadãos e as instituições, nem aos ditames dos países mais poderosos.

Sim, é verdade que nos batemos por uma ordem internacional mais justa, pela mobilização de recursos para enfrentar os problemas ambientais e os problemas da fome, da doença e da miséria que atingem dramaticamente grande parte da humanidade, por um mundo de paz e de cooperação e que temos muita honra em pensar assim e que não tencionamos contemporizar com a agressividade e arrogância do imperialismo norte-americano que aí está de novo ateando os ventos da agressão e da guerra com as devastadoras consequências sociais, económicas e políticas da globalização capitalista.

Estas são algumas das causas e convicções com que enfrentamos a realidade para a mudar e transformar, tendo no horizonte o nosso valioso projecto de uma democracia avançada e tendo também no horizonte a perspectiva que mantemos de que o capitalismo não é o fim da história e que, pela luta dos povos, será possível abrir a estrada para o socialismo.

Estas são algumas das causas e convicções que integram a política de esquerda que defendemos e que consideramos indispensáveis para dar consistência e a uma futura alternativa de esquerda à política e ao governo do PSD e do CDS.

Estas são algumas das causas e convicções para as quais trabalhamos para encontrar mais eco e mais apoio na opinião e na iniciativa dos cidadãos porque é esse apoio, essa mais lúcida consciência e essa mais intensa iniciativa, convergindo com o indispensável reforço da influência do PCP, que mais podem determinar um rumo de esperança em direcção à alternativa de esquerda de que Portugal precisa.

Sim, é possível um PCP mais forte

Hoje, mais do que em momento anteriores, a situação criada com esta nova ofensiva da direita, reclama a acção e a intervenção do PCP e confirmam o seu papel determinante para a defesa consequente dos interesses dos trabalhadores e das massa populares. Um papel que assumirá com a determinação, coerência e decisão de sempre, na primeira linha do combate à política de direita, com os trabalhadores e as suas lutas. Um papel e uma presença que hoje como ontem, a exemplo de sempre, os trabalhadores e o povo sabem poder contar.

Inserido na resposta do Partido à ofensiva neoliberal e de retrocesso arranca dia 26 uma grande jornada nacional de esclarecimento e mobilização em torno da revisão das leis laborais, com um número especial do Avante! também no quadro da sua difusão – onde se identifica o que está em causa e o que o Governo pretende – jornada que, pela sua grande importância, desde já chamamos atenção a todo o colectivo partidário.

E no sentido de tratarmos das nossas raízes e de reforçarmos a influência deste Partido insubstituível, no seio dos trabalhadores, vamos realizar em Outubro um importante Encontro Nacional.

Estamos empenhados e convictos que é possível e necessário termos um PCP mais forte.

Sim é possível! Com o estímulo e a valorização da militância, com a iniciativa própria de cada organização, com a ideia clara de que o Partido não é uma entidade abstracta, com o alargamento do núcleo activo, a renovação e o rejuvenescimento de organismos e com o aprofundamento e exercício da democracia interna como característica essencial do funcionamento do Partido.

Mas também, como a Conferência Nacional do PCP sublinhou, impõe-se dar continuidade e reforçar a iniciativa própria do Partido, demonstrando o valor do seu projecto, divulgando e afirmando as propostas, reforçando a ligação às realidades concretas, aos trabalhadores e à população em geral.

Uma intervenção política própria que é condição para o reforço e alargamento da sua influência e da afirmação do PCP como força indispensável à concretização de uma política alternativa.

Ganha, por isso, um importante significado e importância o lançamento e concretização até ao final do próximo ano da acção “Em movimento, por um Portugal com futuro” integrando diversificadas iniciativas de esclarecimento, debate e mobilização sobre diferentes problemas e questões da realidade nacional. Uma acção que, pelo seu desenvolvimento, permita pela intervenção do PCP sobre importantes questões da vida política nacional não só constituir-se como um elemento de resistência à política de direita, mas também de demonstração de que os problemas que o país enfrenta podem ter solução, que é possível um país mais desenvolvido e mais justo. Uma iniciativa que contribua para uma ainda maior proximidade e intervenção das organizações do Partido aos problemas e que possibilite o aprofundamento da reflexão e conhecimento, e cujo êxito e resultados são inseparáveis do envolvimento e mobilização de cada organização e militante.

“Em movimento, por um Portugal com futuro” é em si um importante sinal de confiança no futuro: confiança em que o país não está condenado ás mesmas e requentadas políticas que avolumam e agravam os problemas e as condições de vida do povo; confiança em que não só uma outra política é possível como se afirmará mais cedo ou mais tarde como indispensável; confiança em si próprio e nos trabalhadores, nas suas lutas e na acção da participação popular para a construção de uma política alternativa.

O casino planetário e a
tragédia de milhões de seres humanos

A nossa festa é também uma grande manifestação de solidariedade internacionalista num mundo em que se continuam a acentuar as desigualdades com a economia mundial transformada num casino planetário em que a globalização neoliberal continua a condenar milhões de seres humanos à indignidade humana mesmo no seio dos países mais ricos e desenvolvidos.

O relatório da ONU tornado público na Conferência internacional sobre a Sida realizada em Julho, em Barcelona, a Conferência de Joanesburgo rebatizada de Cimeira da Terra e o recente “Relatório Sobre o Desenvolvimento da Humanidade” dão-nos uma nova fotografia das terríveis desigualdades e um quadro da iníqua, cruel e bárbara ordem mundial que atinge milhões de seres humanos. E são só por si um libelo acusatório às políticas dominantes e a um sistema fundado na exploração e na apropriação privada de mais valia. E são particularmente chocantes quando confrontados com os avanços da ciência e da técnica, com a fantástica capacidade de produção de bens e serviços, com os fabulosos gastos em armamentos e com a infinita concentração da riqueza, em que como se sabe os activos de três multimilionários é superior ao PIB somado dos 48 países mais pobres do planeta!

Quando a busca do máximo lucro se sobrepõe ao Homem e é a medida de todas as coisas o que é que há que esperar?

Não é verdade, por exemplo, que a desigualdade perante a epidemia da Sida ultrapassa os limites do suportável? E não é verdade que trinta e nove das maiores companhias farmacêuticas se uniram contra o governo da África da Sul por este querer produzir medicamentos genéricos para fazer face à situação dramática da Sida e que também os Estados Unidos apresentaram na OMC uma acusação contra o Brasil por não respeitar as patentes? Foi a denúncia, a luta desses povos e a mobilização da opinião pública internacional que os fez recuar! Mas as pressões das multinacionais mantêm-se.

Noutro plano é também chocante e intolerável que para fazerem subir as suas cotações na bolsa grandes empresas anunciem, com grandes parangonas, o despedimento de milhares de trabalhadores, para darem a entender aos accionistas que assim irão ter taxas de lucro superiores.

A vida de milhões de seres humanos está hoje cada vez mais dependente dos resultados da especulação a nível planetário.

As quedas bolsistas deitando por terra as ilusões semeadas pelos propagandistas da “nova economia” e as falsificações das contas em grandes empresas que estavam falidas ou com grandes prejuízos, arruinaram milhares de pequenos accionistas e de reformados cujos fundos de pensões foram jogados na roleta das bolsas e acentuaram os factores de depressão económica.

E isto quando ainda muito recentemente doutas teorias previam para os Estados Unidos um forte e continuado crescimento económico graças ao seu “modelo” e ao modo de financiamento da sua economia. É o que se vê. As dificuldades em relançar a actividade económica e os receios de uma mais profunda queda bolsista com os seus efeitos de bola de neve são fundados. É por isso que se afirma que, no projecto imperial da invasão do Iraque e por detrás da retórica anti-terrorista e da defesa dos direitos do homem, estão dois objectivos muito concretos: dinamizar o complexo militar industrial e controlar o petróleo iraquiano dando um novo balão de oxigénio à especulação bolsista. E esta é uma questão em que exigimos uma posição clara do Governo português, como fizeram Jacques Chirac e Shröder, quer quanto ao apoio político, quer quanto ao uso da Base das Lages.

A dominação, a troca desigual, a pilhagem de recursos, a intensificação da exploração e a liquidação de direitos aos trabalhadores, a “financeirização” da economia, bem como a corrida aos armamentos que continua neste século XXI, mesmo depois do fim da chamada guerra fria não são uma fatalidade.

Nós comunistas continuamos a pensar que há alternativa à globalização capitalista, que um outro mundo é possível, que um mundo melhor é necessário e urgente para bem da humanidade.

Partido

Este é um Partido que, também nesta Festa do Avante!, exprime uma firme confiança no valor e no futuro dos nossos ideais e convicções comunistas, a inquebrantável vontade de lutar e de transformar a vida, a coerência, a seriedade e a verticalidade, as propostas e o projecto revolucionário de uma grande força da liberdade, da democracia, do socialismo, o Partido Comunista Português.

Um Partido que, como nenhum outro em Portugal, assume os seus problemas, insucessos, dificuldades e insuficiências e mobiliza energias e capacidades para os atenuar ou vencer mas que não está disposto em deixar de ter orgulho no seu incomparável passado e presente de luta e em deixar de ter confiança no seu futuro.

Um Partido que respeita e não teme nem a diferença de opiniões entre os seus membros, nem o debate político e ideológico feito com verdade, seriedade e rigor, e antes os vê como naturais e susceptíveis de promover avanços de reflexão, mas em que, naturalmente, não se aceita a sobreposição da vontade e opinião individuais à vontade e opinião colectivamente formadas. Em que, naturalmente, não se aceita um sistema em que cada um só respeitaria o que correspondesse à sua opinião, às suas exigências e daria combate público a tudo o que correspondesse à vontade maioritária do colectivo partidário e às decisões legítimas dos diversos órgãos do Partido.

Um Partido que sabe que há muita reflexão e debate para fazer no seu seio, muitas interrogações, inquietações e insatisfações de militantes que reclamam resposta, mas que valoriza o debate democrático e a reflexão feita na preparação da sua recente Conferência Nacional – processo em que nenhum membro do Partido foi impedido de defender o que entendesse, em que nenhum membro do Partido foi impedido de se candidatar a delegado e em que nenhum delegado eleito foi impedido de votar na Conferência como quisesse – e que valoriza as conclusões dessa importante instância democrática de decisão nacional do Partido, como contendo orientações e linhas de trabalho úteis e necessárias para o reforço da organização e intervenção do PCP.

Um Partido que não é, nem quer ser, nem uma igreja nem um exército, mas que é e quer continuar a ser uma associação livre e voluntária de mulheres e homens unidos por um generoso compromisso forjado em torno de ideais e de um projecto político, assente em regras de relacionamento fraternal e funcionamento solidário que todos se comprometeram a aceitar. Em que todos sabiam e sabem que essas regras significam que, em benefício da eficácia da sua acção e da sua comunidade de ideais, cada um prescinde de se comportar publicamente com se fosse independente ou como se fosse membro de outro partido. Em que todos sabiam e sabem que se essas regras eram boas quando exerciam responsabilidades de direcção não podem ter passado a ser péssimas quando deixam de ter essas responsabilidades.

Um Partido que não cede e não quer ceder às pressões para que escolha entre as certezas inabaláveis e as dúvidas infinitas e sistemáticas, porque há muito escolheu um outro caminho: o caminho inspirado pelas causas, convicções e ideais que fazem a sua razão de ser.

Um partido que enfrenta as sentenças de divisão, crise e morte iminente que sobre ele todos os dias outros despejam e os falsos dilemas em que o pretendem aprisionar com uma profunda confiança de que, pelo trabalho, pela reflexão, pela luta, por uma mais forte ligação ao povo, pela unidade, coesão e solidariedade do seu colectivo partidário é e será uma força com futuro, porque têm futuro os ideais porque se bate, porque têm futuro os valores de que se reclama, porque tem futuro o generoso empreendimento humano que representa. Porque a dignidade e a felicidade humana e o seu projecto humanista de transformação social tem futuro.