Por que devem as mulheres rejeitar o Pacto de Agressão

Intervenção
Jerónimo de Sousa
Secretário-Geral do PCP
Lisboa

Jerónimo de Sousa num encontro realizado, hoje, em Lisboa para debater as consequências da concretização do Pacto de Agressão, afirmou num "mar de desigualdades e injustiças a que os trabalhadores e o povo estão sujeitos" está a impor os "velhos e recorrentes itinerários de discriminação das mulheres no trabalho, na família e na sociedade".

Estes meses de aplicação do Pacto de agressão subscrito pelo PS, PSD e CDS-PP com o FMI e a União Europeia e cuja aplicação é dirigida pelo governo em exercício, não deixam dúvidas acerca das nefastas consequências para a vida da grande maioria dos portugueses e para o país e quanto acertadas eram as posições de todos os que, como o PCP, se lhes opuseram.

Oito meses é tempo suficiente para confirmar a verdadeira natureza exploradora e predadora desse Pacto ilegítimo que PS, PSD e CDS com o apoio do Presidente da República negociaram nas costas do país e falsamente o justificaram em nome do interesse nacional.

Se a situação se vinha deteriorando de forma preocupante com as políticas de austeridade dos PEC do anterior governo do PS, com a aplicação do Pacto de Agressão, estamos a assistir a uma situação, nunca antes vista, de acelerada degradação económica e social, ampliando a crise e agravando ainda mais todos os problemas que o país vinha enfrentando.

A vastidão das medidas de austeridade que vêm sendo tomadas e que atingem de forma ainda mais severa as classes e camadas populares, estão a reflectir-se em todos os domínios da nossa vida colectiva.

Camaradas,

As intervenções neste debate, testemunham a natureza das dificuldades e dos problemas que o país e o nosso povo enfrentam, reflectindo como a crise do capitalismo e as medidas para a sua suposta superação – e que em Portugal se expressam nas políticas de austeridade e na concretização do Pacto de agressão – são o pretexto e uma oportunidade para o capital monopolista promover a mais brutal ofensiva contra as condições de vida e os direitos sociais dos povos.

A situação nacional, mas também internacional está marcada pela aceleração e agudização da crise do capitalismo, uma crise sem fim à vista porque as medidas a que o sistema tem recorrido são elas próprias factores do seu aprofundamento.

Uma crise do sistema capitalista que está a gerar retrocessos consideráveis na situação e nos direitos das mulheres, pondo em risco um importante património de valores e de conquistas que marcam a luta do movimento das mulheres no final do século XIX e século XX.

A natureza das orientações que são emanadas dos grandes centros do capitalismo, das instâncias europeias e mundiais e a acção dos governos que servem esses interesses vão desferindo duros golpes nos princípios e valores que foram sendo proclamados no plano internacional em favor da igualdade de direitos das mulheres, mostrando a sua verdadeira natureza exploradora do sistema e a sua impossibilidade de dar êxito à igualdade das mulheres e à sua emancipação.

A luta das mulheres continua a ser uma realidade e a constituir um factor de grande importância para a mobilização de milhões de mulheres na luta em defesa dos seus direitos. Nessa luta cabe um importante papel ao movimento das mulheres e às estruturas que se inserem na frente anti-imperialista, como seja a Federação Democrática e Internacional das Mulheres, que congrega organizações de mulheres de vários países e continentes, incluindo o MDM – Movimento Democrático de Mulheres que em Portugal continua a desempenhar um papel insubstituível nessa luta.

Em Portugal, aqueles que impuseram o Pacto de Agressão e o conjunto de medidas que estão em curso, nomeadamente as previstas no Orçamento de Estado de 2012 filho deste mesmo Pacto, estão a responsabilizar e penalizar o país e os portugueses por uma crise que não é da sua responsabilidade, mas sim da política de direita e do processo de recuperação capitalista iniciado em 1976 e conduzido por sucessivos governos do PS, do PSD e do CDS-PP.

Foi em resultado de décadas dessa política que se geraram e noutros casos aprofundaram défices que se manifestam no plano económico e social, e consolidaram e agravaram significativos atrasos relativamente à generalidade dos países da União Europeia: mais baixos salários e pensões, elevadas taxas de pobreza, o maior fosso entre ricos e pobres, crescente divergência em termos de desenvolvimento com a destruição do aparelho produtivo nacional, desemprego e precariedade. Uma política de direita que faz persistir os indicadores de desigualdade e discriminação das mulheres no mercado de trabalho e que entrou em rota de colisão com os seus direitos, na lei e na vida, não obstante o crescente peso das mulheres no mundo do trabalho e a sua visível e importante presença em diversos domínios da vida social, política, cultural e desportiva.

Aqueles que são os responsáveis pela situação a que o País chegou – o PS, o PSD e o CDS-PP – impõem, com o apoio do Presidente da República, como única resposta para sair da actual “crise” em que o País se encontra o cumprimento do Pacto de Agressão, que sob a “batuta” da UE, BCE e FMI, está já a condenar os trabalhadores e o povo a enormes e escusados sacrifícios e dificuldades e o país a “um beco sem saída”.

São impostas medidas de austeridade dirigidas aos trabalhadores e as camadas populares: emagrecendo drasticamente o valor dos salários dos trabalhadores da Administração Pública e roubando-lhes o 13º e o 14º mês; reduzindo ainda mais, após uma vida de trabalho, o valor das reformas aos reformados e roubando-lhes, parcial ou totalmente, o 13º e o 14º mês; agravamento dos impostos sobre todos os rendimentos do trabalho e sobre o consumo, elevando o custo de vida com aumentos de preços – da alimentação, dos transportes, da habitação, da energia, da saúde, encerrando e encarecendo os serviços públicos; levando ao empobrecimento das famílias das classes trabalhadoras; empurrando para a emigração as novas gerações de trabalhadores qualificados.

Medidas que estão a levar o país para uma mais profunda recessão económica que cava cada vez mais fundo e a levar cada mais longe o processo de destruição de riqueza, de empregos e de vidas que há muito assistimos, ampliando dificuldades e provocando falências nas mais diversas actividades, nomeadamente de pequenas empresas nas cidades e nos campos.

Um Pacto de Agressão que é uma autêntica janela de “oportunidades” para o o capital financeiro e os grandes grupos económicos, para os quais o Governo PSD/CDS-PP, com o apoio do PS, está a transferir vultuosas receitas do Estado, a privatizar sectores estratégicos para a nossa economia e importantes funções sociais do Estado; a potenciar instrumentos poderosos para uma mais profunda exploração dos trabalhadores, espoliando-os de condições de vida e de trabalho e desferindo sobre eles e suas famílias um verdadeiro saque: cortando salários directa e indirectamente, negando-lhes o direito à protecção social, a uma vida com dignidade, e fazendo tábua rasa do Serviço Nacional de Saúde, do Sistema Público de Segurança Social, da Escola Pública e de outros importantes serviços públicos, degradando-os e tornando cada vez mais difícil o seu acesso.

Entretanto e, como expressão máxima da hipocrisia desta política e dos que a executam, vemos o Ministro da Solidariedade Social a dar como exemplo da preocupação deste Governo com os mais pobres - isto depois dos cortes nas verbas do rendimento social de inserção! - o aumento de uns míseros cêntimos diários em algumas das pensões mínimas, ao mesmo tempo que desvaloriza a opção de congelar, em 2012, as pensões dos 3 milhões de reformados, muitos dos quais vivem com valores abaixo do salário mínimo nacional.

O vigor que é colocado nas palavras e na propaganda na defesa da “solidariedade” para com os mais pobres e desfavorecidos, criando a ilusão de que é com este Pacto de Agressão e com este Governo que será garantido tão nobre princípio, é uma expressão muito concreta daquela hipocrisia política e da natureza de classe de quem o propagandeia: transferem para aqueles que são vitimas da sua política anti-social, para os trabalhadores, para os reformados, para o nosso povo, a obrigação de serem solidários com quem os rodeia (dando dinheiro, roupa, alimentos), ocultando deliberadamente que essa solidariedade sempre existiu como um importante património de inter-ajuda recíproca no relacionamento familiar e social entre as classes trabalhadores e populares! O que querem com tal operação e o que está em marcha é o retorno às políticas assistencialistas e caritativas, num inaceitável regresso ao passado e estigmatizando aqueles que são atirados para a pobreza. Na verdade o governo leva a cabo um verdadeiro roubo organizado contra os trabalhadores e os mais pobres para engordar os bolsos dos mais ricos, mas apresenta-se ao país com uma fingida face humanista!

Eles escondem que o Pacto de Agressão está a destruir os princípios de solidariedade plasmados na nossa Constituição da República. A solidariedade expressa-se numa mais justa distribuição da riqueza produzida, na valorização do emprego e da autonomia económica dos trabalhadores, através de salários e pensões dignas, numa adequada política fiscal que faça pagar a quem mais tem e mais ganha e não sobretudo aos rendimentos do trabalho; no respeito por funções sociais do Estado que garantam a igualdade de acesso de todos os portugueses à saúde, à segurança social, à educação e à cultura. A solidariedade expressa-se acima de tudo pela luta contra uma organização social erguida sobre a exploração, o lucro, as injustiças e desigualdades e por uma sociedade livre da exploração assente na resposta às necessidades e aspirações do ser humano.

Camaradas,

Esta semana, no quadro do Pacto de Agressão, e unindo o Governo PSD/CDS-PP, o grande capital e a UGT, com o patrocínio do Presidente da República e a conivência do PS, conclui-se a farsa de acordo dito de concertação social. Um acordo que representa uma inaceitável agressão aos direitos dos trabalhadores portugueses. Um acordo que promove o trabalho forçado e não pago, a tentativa de eliminação de quatro feriados e de três dias de férias e a marcação arbitrária e impositiva de dias de férias pelo patronato.

Que dá mais poder ao capital para controlar e decidir da vida dos trabalhadores. Estabelece e agrava os bancos de horas, o que significa trabalhar 12 horas por dia e 60 horas por semana. Que visa uma brutal baixa de salários e de remunerações, em particular com a redução para metade do pagamento de horas extras e do trabalho em dia de descanso, querendo sobrepor tal opção ao que está inscrito na contratação colectiva. Que facilita o despedimento individual sem justa causa e ao mesmo tempo o embaratece.

Esta farsa de acordo de concertação social pretende conter o rápido desgaste do governo e dar fôlego ao grande capital que não deixará de procurar ir mais longe na violação dos direitos das trabalhadoras, no aprofundamento e diversificação das formas de pressão e chantagem para que estas se resignem e aceitem os baixos salários e as discriminações salariais (directas e indirectas), e para que abdiquem, designadamente, de exercer os direitos de maternidade e de acompanhamento aos filhos.

O alargamento do horário de trabalho, para além de um inaceitável instrumento de exploração dos trabalhadores, tornará a sua vida num inferno, criando problemas acrescidos com os filhos (ir buscar e levar à escola e o seu acompanhamento).

A não ser derrotado pela luta dos trabalhadores, estamos perante um agravamento dos instrumentos de exploração das mulheres na sua condição de trabalhadoras, com reflexos na esfera familiar (porque é sobre elas que recaem muitos aspectos da organização da vida doméstica e do acompanhamento aos filhos), e de um maior condicionamento à sua participação, em condições de igualdade, na vida social, política e cultural.

E para as jovens trabalhadoras, não obstante as suas qualificações, o grande capital vai procurar ir mais longe ao utilizá-las como mão-de-obra barata e sem direitos, sujeitando-as a uma desgastante instabilidade profissional, familiar e social.

Nas famílias, as crescentes dificuldades resultantes da quebra de rendimentos e de agravamento das condições de vida, geram novos factores de preocupação, de desgaste e de instabilidade sobre todos os seus membros. Menos tempo para acompanhar os filhos, mensalidades elevadas nas creches e infantários, ou nos lares para idosos, alimentação mais cara, a necessidade de um duplo emprego, de ser imaginativa na cozinha para esticar o orçamento familiar, torna a tradicional dupla tarefa da mulher, a quem social e culturalmente é atribuída a função de renovação da sua força de trabalho e dos restantes membros activos da família, uma tarefa desgastante e penosa, levada a cabo à custa da sua abdicação dos tempos de descanso e de lazer, de convívio em família, e da abdicação em se dedicar a qualquer outra actividade que a realize no plano pessoal e social. Esta realidade não é igual para todas as mulheres, mas é talvez o exemplo mais claro de como as razões de classe e de sexo estão na causa da desigualdade das mulheres na família com as mulheres de rendimentos elevados a poderem e recorrerem a diversos recursos para aliviar a carga com a vida familiar e doméstica que não são acessíveis à generalidade das mulheres.

Aliás, analisando o aumento da pobreza nas famílias verifica-se que são as mulheres que dão a cara pela subsistência das mesmas, vencem a vergonha e o medo da estigmatização social da pobreza e pedem ajuda, não só pela especial vulnerabilidade de segmentos que têm baixos salários, reformas baixas, desemprego prolongado, ou situações de divórcio, mas porque é sobre as mulheres que recai, social e culturalmente, a responsabilidade de garantir o apoio às crianças e mais idosos. Estas razões explicam o porquê das mulheres serem a maioria dos beneficiários do rendimento social e daqueles que pedem ajuda social.

Camaradas,

Com o Pacto de Agressão está de facto em curso, como já foi afirmado, uma marcha silenciada e silenciosa no mar de desigualdades e injustiças a que os trabalhadores e o povo estão sujeitos que está a institucionalizar e a impor na realidade, os velhos e recorrentes itinerários de discriminação das mulheres no trabalho, na família e na sociedade.

Todos os indicadores de desigualdade e discriminação específica das mulheres estão em desenvolvimento, indicando que estão a ser retomadas velhas formas de dominação e opressão sobre as mulheres, por razões de classe e de sexo, visando desmoronar um importante património de conquistas e de direitos que resultam da luta emancipadora das mulheres em Portugal. Aprofunda-se o terreno propício para aumentar as diversas formas de violência sobre as mulheres, incluindo o aumento da prostituição.

E como pano de fundo desta profunda ofensiva política e social, desenvolve-se uma ofensiva ideológica que, dirigida à generalidade dos portugueses e portuguesas, promove as “inevitabilidades”, a “resignação”, e a “responsabilização” indiscriminada dos políticos, metendo no mesmo saco tudo e todos.

É uma ofensiva ideológica que pretende influenciar a atitude das mulheres – das trabalhadoras, das reformadas, das jovens – visando neutralizar a sua crítica às políticas em curso, ocultar os responsáveis pela situação com que se confrontam e reduzir a sua capacidade reivindicativa e a sua luta pela rejeição do Pacto de Agressão. É uma ofensiva ideológica que subalterniza as acções e o papel desempenhado na luta em curso pelas expressões mais coerentes, organizadas e combativas do movimento das mulheres, que desvaloriza e subalterniza a importância do reforço da participação das mulheres traduzida numa militância social na defesa dos seus direitos, com expressão em diversas forças de associativismo de classe e social – na organização sindical, a partir das empresas, em organizações de mulheres, entre muitas outras – que são expressão de uma militância social transformadora da realidade social e política.

O forte ascenso da luta de massas em Portugal, com tradução em múltiplas lutas que têm sido desenvolvidas e que estão em desenvolvimento, mostra que há forças no país para dar resposta a esta ofensiva brutal e que a luta de massas será o motor do movimento de rejeição do Pacto de Agressão que se amplia, tal como da afirmação de que há alternativa ao rumo de desastre nacional que o país segue.

É uma luta comum, de homens e mulheres: dos trabalhadores e reformados, do sector público e privado; da juventude; dos pequenos e médios agricultores e empresários; dos cidadãos deficientes.

Mas as mulheres destes diversos sectores, e sobretudo as que estão de forma consciente e combativa nesta luta, são chamadas a dar um contributo adicional .

É necessário apoiar e dar confiança às mulheres no valor da sua luta por problemas e reivindicações específicas e de alargamento da convergência com as lutas dos trabalhadores e das populações.

É preciso ampliar e reforçar a luta organizada das mulheres pela rejeição do Pacto de Agressão, em defesa dos seus direitos e pela sua luta emancipadora.

Uma luta que tem de convergir para uma forte e combativa acção de massas no próximo dia 11 de Fevereiro convocada pela CGTP-IN, uma grande manifestação nacional que culminará no Terreiro do Paço em Lisboa. E, desde já lançamos um apelo às mulheres trabalhadoras do sectores têxteis, vestuário e calçado, das indústrias eléctricas, às bancárias, às trabalhadoras das grandes superfícies, às trabalhadoras da Administração Pública, às trabalhadoras das áreas culturais e científicas para que marquem presença nesta acção de massas e afirmem a luta pelos seus direitos.

Um apelo às mulheres reformadas, do sector público e privado, às mulheres deficientes, às jovens, um apelo a todas as trabalhadoras e às mulheres dos mais diversos sectores sociais: no dia 11 de Fevereiro manifestem o vosso descontentamento e façam valer as vossas justas aspirações.

Queremos dizer neste debate às mulheres portuguesas, que contam com o PCP para mudar o curso da história em Portugal. Ontem como hoje estamos com as mulheres na sua luta pela resolução de problemas concretos e imediatos, na luta pela ruptura com o rumo de desastre desta política e pela construção de uma política alternativa que faça cumprir os direitos das mulheres.

Mas os objectivos mais profundos que alimentam esta intervenção por parte de sucessivas gerações de comunistas, no passado, no presente e para o futuro, é a afirmação do socialismo como projecto com futuro para Portugal. Um projecto que incorpora a transformação da condição social das mulheres e a sua emancipação.

E, porque estamos muito próximos do dia 8 de Março de 2012 recordamos uma afirmação de Clara Zetkin, um comunista alemã, que se traduziu num objectivo de luta em toda a sua vida: “A emancipação da mulher, como de todo o género humano, só se tornará realidade no dia em que o trabalho se emancipar do capital. Só na sociedade socialista as mulheres, como os trabalhadores, tomarão parte plena dos seus direitos. “

Nas próximas comemorações do Dia Internacional das Mulheres devem constituir um momento particular para “ir ao encontro” das mulheres e dar-lhe confiança no valor da sua participação e luta pela rejeição do Pacto de Agressão. Por um Portugal com futuro. Em defesa dos direitos das Mulheres. Pelo avanço da sua luta emancipadora.

Viva a luta das mulheres
Viva o PCP