Partido Comunista Português
Sete Medidas Urgentes para Responder à Crise
Quinta, 26 Junho 2008
Na abertura do debate, Agostinho Lopes referiu que sem abdicar "da necessidade absoluta de outras opções e políticas para o País, hoje é indispensável que, no imediato, se enfrente a gravíssima situação social que vivemos" É nesse sentido que o PCP apresenta um conjunto de 7 medidas que são absolutamente indispensáveis para responder à "situação de brutal agravamento das condições de vida dos trabalhadores e da generalidade da população".  

 

«Sete Medidas Urgentes para Responder à Crise»

Agendamento Potestativo do PCP

Intervenção de Agostinho Lopes na AR


 

Sr. Presidente,

Sr.as e Srs. Deputados:

O País vive hoje, acelerada pela escalada dos preços dos combustíveis e de bens alimentares, uma situação de brutal agravamento das condições de vida dos trabalhadores e da generalidade da população.

O aumento do custo de vida, associado ao continuado aumento das taxas de juro, está-se a traduzir numa crescente perda do poder de compra e numa acelerada desvalorização dos salários e pensões de reforma, na asfixia de milhares de pequenas e médias empresas, no aumento das desigualdades sociais e da pobreza no nosso país.

Ao mesmo tempo, os mais importantes grupos económicos e financeiros continuam a acumular volumosos lucros, em chocante contradição com as crescentes dificuldades que atingem a generalidade da população.

Denunciámos já, nesta Assembleia, a inércia, e também a inépcia, total do Governo PS/Sócrates face aos acontecimentos.

Depois do irresponsável discurso de um País imune à crise por virtude das suas políticas, veio a arrogância e a surdez do Governo perante reclamações e protestos. O Governo não teve nem capacidade nem competência para prever e intervir atempadamente no curso dos acontecimentos, como não tomou as medidas extraordinárias que a situação extraordinária reclamava e exigia.

Refira-se que não só não tomou as medidas que há muito se impunham como recuou relativamente a algumas que tinha mesmo anunciado. É o caso do gasóleo profissional para os transportes rodoviários colectivos e os táxis, que, apesar de anunciado pelo Ministério dos Transportes e inscrito nas GOP, esfumou-se ou, ainda pior, tudo indica ter sido trocado pela subida dos custos desses transportes para a generalidade dos cidadãos.

A grande medida do Governo parece ser impedir as manifestações de protesto, o que hoje (repetindo o que aconteceu em Setúbal) sucedeu em Braga, com a cidade em estado de sítio, decretado pelo Governo Civil para impedir uma simples marcha de tractores dos agricultores da região, o que, além de violador do direito de manifestação e desproporcionado, é totalmente inaceitável face à ausência de medidas imediatas para o sector agrícola.

As crises que se fazem sentir nos sectores da energia e da produção alimentar assumem um grau muito elevado em Portugal, extremadas pelas fragilidades estruturais do País, bem evidentes na muito elevada dependência energética da factura petrolífera e no significativo défice agro-alimentar de Portugal.

A alteração profunda desta situação exige uma rotura com as políticas de direita prosseguidas há décadas.

Sem abdicação da necessidade absoluta de outras opções e políticas para o País, hoje é indispensável que de imediato se enfrente a gravíssima situação social e económica que vivemos.

É nesse sentido que o PCP avança um conjunto de sete medidas.

Primeira, a proposta de um aumento intercalar dos vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública (projecto de resolução n.º 350/X) e a consideração, com os parceiros sociais, de uma revisão dos valores do salário mínimo, soluções que, dado o seu papel de referência, deverão traduzir-se num movimento paralelo nos salários dos outros trabalhadores.

Segunda, a actualização extraordinária das pensões e outras prestações sociais para 2008 (projecto de resolução n.º 252/X), com níveis de actualização inversamente proporcionais aos seus valores.

Terceira, a alteração dos critérios para a atribuição da protecção no desemprego (projecto de lei n.º 544/X). A actual situação de crise atinge dramaticamente muitos desempregados, uma parte significativa dos quais não recebe subsídio de desemprego.

Quarta, a aplicação de medidas com vista à diminuição dos preços dos combustíveis, designadamente com a criação de um imposto sobre os lucros por efeito de stock e um mecanismo de regulação dos seus preços (projecto de rewsolução n.º 339/X) .

Quinta, a garantia do congelamento dos preços dos títulos de transporte, para além dos passes sociais.

Sexta, o estabelecimento, pelo Governo, de um cabaz de bens essenciais, abrangendo produtos básicos de alimentação e higiene, com preços máximos fixados para 2008 (projecto de resolução n.º 349/X).

Sétima, a fixação de spread máximo (0,5%) no crédito à habitação própria permanente pela Caixa Geral de Depósitos (projecto de resolução n.º 351/X).

Srs. Deputados, as objecções que eventualmente poderão ser levantadas às medidas que o PCP agora propõe serão, no fundamental, de dois tipos: a da sua sustentabilidade, particularmente no caso dos combustíveis; a carência de meios financeiros da parte do Estado para lhe responder sem um novo agravamento do défice orçamental. Vejamos a sua razoabilidade.

Sobre a sustentabilidade das medidas, não temos dúvidas, como referimos atrás, da necessidade de alterações e reformas estruturais para responder de forma sustentável a alguns dos graves problemas existentes. Mas será uma profunda hipocrisia política que esse argumento sirva para travar ou impedir medidas que o dia-a-dia dos cidadãos e das empresas exige.

É inevitável, e o PCP tem toda a autoridade para o dizer, contrariamente a outros, outra abordagem das questões da energia em Portugal que reduza substancialmente o preço da factura em combustíveis fósseis, mas tal exigirá tempo e investimentos e não pode obstar a que se tomem desde hoje (já ontem era tarde) todas as medidas que permitam salvaguardar a sustentabilidade de milhares de pequenas empresas portuguesas dos sectores produtivos.

Sobre o suporte financeiro das medidas, este tem sido o grande argumento do Governo. «O que vocês querem», dizia o Sr. Primeiro-Ministro, «é que a generalidade dos contribuintes, dos cidadãos, suporte os sobrecustos de alguns sectores!»

A primeira questão a perguntar é se não é do interesse de todos os portugueses a sobrevivência das pescas e da agricultura ou os empregos que outros sectores suportam. Mas há um aspecto básico que devemos colocar na consideração de uma situação como a que o País vive, que é se os sacrifícios devem ou não ser repartidos ou se, como vem acontecendo, são penalizados os mesmos de sempre, enquanto os outros, uma pequena minoria, não só nada sofre com a crise como alguns até vêem aumentar substancialmente os seus resultados financeiros - são dados recentes de uma consultora referentes ao aumento do número de milionários no nosso país, nestes últimos anos de profunda crise económica.

Por outro lado, muitas das medidas propostas cabem perfeitamente dentro das disponibilidades orçamentais previstas e outras exigem suporte extraordinário, como as que o PCP propõe para os combustíveis, com a criação de um imposto extraordinário sobre os lucros especulativos.

Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro, depois de semanas em que não respondeu às interpelações do PCP sobre a matéria, parece que ganhou, em Bruxelas, alguma inspiração com os anúncios dos seus parceiros italianos. Digo «parece» porque, de concreto, ainda nada veio à luz do dia.

Mas há mais onde ir buscar dinheiro para responder aos custos das propostas do PCP. Basta que se considere que os lucros do sector financeiro português devem pagar a taxa normal do IRC que a generalidade das pequenas empresas portuguesas paga!

As medidas que o PCP apresenta são absolutamente indispensáveis para responder à situação, mas não só. São também urgentes e terão efeitos imediatos.

(...)

Desculpe, mas certamente não o insultei.

Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não é possível fazer nada, nada, nada! Aliás, quando falou das taxas de juro, estava à espera que o Sr. Deputados nos viesse comunicar que, desta vez, o Governo português está a intervir junto do Banco Central Europeu para que não haja novas subidas da taxa de juro, que vão penalizar fortemente, provavelmente a partir de Julho, mais uma vez, a economia, os investidores e a generalidade dos consumidores portugueses.

Sr. Deputado Afonso Candal, relativamente à questão que coloca, deixe funcionar o mercado; o Governo que faça a Caixa Geral de Depósitos fixar esta margem e veremos, depois, se o resto do mercado não se adapta e se a própria Caixa Geral de Depósitos não vai continuar a ter as comissões e os prémios suficientes pelos empréstimos que vai conceder.

Quanto à segunda questão, relativa aos bens essenciais, embora o Sr. Deputado pertença à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, não ouviu, ontem, o Sr. Ministro da Agricultura, porque se o tivesse feito não me teria colocado esta questão relativa ao preço dos produtos agrícolas.

O Sr. Ministro da Agricultura disse, na Comissão, que os produtos estão todos a subir, que os Srs. Agricultores estão todos a receber muito mais, tanto que a agricultura não precisa de ter quaisquer medidas. É um facto espantoso! Mas o Sr. Deputado veio hoje falar de uma realidade, ou melhor de meia realidade. É que, de facto, os preços aos consumidores em geral estão a subir fortemente e os pagos aos produtores estão a descer.

Ainda ontem tive oportunidade de distribuir e de mostrar ao Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas - e ele não precisava - uma carta (não a tenho comigo agora) de uma empresa que embala leite a comunicar aos seus produtores que ia baixar o preço do leite em 5 cêntimos por litro, Sr. Deputado Afonso Candal. Portanto, esse ainda não é o caminho.

Ainda lhe vou dizer mais: um organismo oficial, chamado Observatório dos Mercados Agrícolas e das Importações Agro-Alimentares, fez um estudo bastante alargado das produções agrícolas, hortofrutícolas e pecuária, inclusive do leite, e chegou à conclusão que 50% a 60% do valor criado na comercialização é absorvido pelas grandes cadeias de distribuição, o que significa que as redes de distribuição podem ficar com 30% e deixar 30% para a baixa de preços e para pagar melhor aos agricultores, Sr. Deputado Afonso Candal.

(...)

Sr. Presidente,  

Srs. Deputados:

Gostaria de dizer ainda alguma coisa relativamente ao nosso projecto de resolução sobre a escalada do preço dos combustíveis.

Propomos a criação de um imposto extraordinário, aliás à semelhança do que sucede noutros países europeus, sobre os lucros com origem no efeito de stock. O Sr. Deputado Afonso Candal, há pouco, informounos de que o Sr. Primeiro-Ministro está a reflectir sobre esta questão, pelo que esperamos que reflicta depressa, e bem, para que esta medida não se atrase, uma vez que já ontem era tarde.

Mas propomos ainda, coisa que o Sr. Deputado Afonso Candal e o Grupo Parlamentar do PS esqueceram, o estabelecimento de um período de seis meses no sistema de preços regulado, através da introdução de um mecanismo de preços máximos da generalidade dos combustíveis líquidos, incluindo a nafta, o gás natural e o GPL.

Não sei se o Grupo Parlamentar do PS tem a noção da diferença que representa ter preços regulados, por exemplo, ao nível do GPL.

O preço do gás butano, por exemplo, vulgo «gás de garrafa», isto é, o combustível de milhares de famílias pobres neste País, em Espanha, com preços regulados - o que, pelos vistos, é possível! -, custa 13,46 €.

Sabe o Grupo Parlamentar do PS quanto se paga por uma garrafa de gás butano em Portugal? Paga-se 20,54 €, Srs. Deputados! É uma pequena diferença!...

Propomos o reforço dos apoios ao gasóleo verde para a agricultura e para as pescas, assim como propomos a criação do gasóleo profissional, e não apenas para os taxistas. O Sr. Deputado Afonso Candal parece ter ficado muito indignado com o problema do gasóleo profissional para os taxistas, mas hoje já há gasóleo subsidiado pelo Orçamento do Estado para outros sectores económicos. E não é escândalo nenhum para o Sr. Deputado Afonso Candal, para o Grupo Parlamentar do PS e para o Governo que a generalidade dos contribuintes continue a subsidiar, através do inventado «défice tarifário», milhares e milhares de euros à EDP e à generalidade das empresas do sector eléctrico.

Propomos ainda, para terminar, Sr. Presidente, que o Governo português actue junto da União Europeia, o que parece ter sido esquecido, no sentido da criação de um fundo de estabilização do preço dos combustíveis.